Com este editorial objetiva-se estabelecer diferenças, pontos e contrapontos entre inclusão social, educação inclusiva e educação especial. O conceito de inclusão vem sendo amplamente e demasiadamente mal compreendido segundo a interpretação do senso comum. Esta crítica diz respeito ao fato de o mesmo ser "aplicado" apenas aos estudantes, público-alvo da educação especial, e ao contexto educacional. É frequente a manifestação pública de expressões equivocadas como: "aluno de inclusão" e "sala de inclusão". Show A inclusão é um paradigma que se aplica aos mais variados espaços físicos e simbólicos. Os grupos de pessoas, nos contextos inclusivos, têm suas características idiossincráticas reconhecidas e valorizadas. Por isto, participam efetivamente. Segundo o referido paradigma, identidade, diferença e diversidade representam vantagens sociais que favorecem o surgimento e o estabelecimento de relações de solidariedade e de colaboração. Nos contextos sociais inclusivos, tais grupos não são passivos, respondendo à sua mudança e agindo sobre ela. Assim, em relação dialética com o objeto sócio-cultural, transformam-no e são transformados por ele. Desconstruindo a ideia de homem padrão (MACE, 1990MACE, R. et al. Accessible environments: toward universal design. In: PRIESER, W. E.; VISCHER, J. C.; WHITE, E. T. (Ed.). Innovation by design. New York: Van Nostrand Reinhold, 1990. p. 187-219.), o conceito de Desenho Universal emerge na perpectiva inclusiva, de maneira a permitir a construção do design e da arquitetura acessíveis, sem necessidade de adaptações pontuais. O desenho universal, que fundamenta a aplicação da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (BRASIL, 2015______. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a lei brasileira de inclusão da pessoa com deficiência (estatuto da pessoa com deficiência). Brasília, 2015.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/Lei/L13146.htm>. Acesso em: 16 jan. 2017. Não faz sentido, por exemplo, estudantes com deficiências participarem efetivamente apenas da educação básica. Quando concluírem o ensino médio, encontrarão espaços sociais para além dos muros escolares, prontos para a exclusão. Inclusão, portanto, é uma prática social que se aplica no trabalho, na arquitetura, no lazer, na educação, na cultura, mas, principalmente, na atitude e no perceber das coisas, de si e do outrem. Na área educacional, o trabalho com identidade, diferença e diversidade é central para a construção de metodologias, materiais e processo de comunicação que dêem conta de atender o que é comum e o que é específico entre os estudantes. Como afirma Mantoan (2004, p. 7-8)______. O direito de ser, sendo diferente, na escola.
Revista CEJ, Brasília, n. 26, p. 36-44, 2004. Disponível em: <http://www.cjf.jus.br/ojs2/index.php/revcej/article/view/622>. Acesso em: 13 jan. 2017. Há aqui outro ponto controverso, a diferença entre a educação inclusiva e a educação especial, quase sempre tomadas como sinônimas. Uma questão de pano de fundo nos é imposta: quais são os estudantes foco da educação inclusiva? A resposta é: todos. Quer dizer, ela se estende aos alunos, público-alvo da educação especial (BRASIL, 2013a______. Lei n. 12.976, de 4 de abril de 2013. Altera a
lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para dispor sobre a formação dos profissionais da educação e dar outras providências. Brasília, 2013a. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12796.htm>. Acesso em: 1 mar. 2014.
O trabalho didático-pedagógico em sala de aula, com o comum e o específico entre a diversidade que caracteriza o ser humano, constitui o objetivo da inclusão escolar que
Em práticas educacionais formais, a aplicação do Desenho
Universal leva em conta a diversidade de gênero, etnia, idade, estatura, deficiência, ritmos e estilo de aprendizagem nos projetos de ensino (BURGSTAHLER, 2009BURGSTAHLER, S. Universal design in education: principles and applications. Seattle: University of Washington, 2009. Disponível em: <http://www.washington.edu/doit/sites/default/files/atoms/files/Universal-Design-Education-Principles-Applications.pdf>. Acesso em: 13 jan.
2017. Aplicando o conceito de educação inclusiva ao educando, público-alvo da educação especial, temos uma relação bilateral de transformação do ambiente educacional e do referido educando, em que o primeiro gera, mobiliza e direciona as condições para a participação efetiva do segundo. Esse, por sua vez, age ativamente sobre tal transformação, modificando e sendo modificado por ela. Por outro lado,
A lei nº 12.796, de 4 de abril de 2013, que altera a Lei nº 9.394,
de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para dispor sobre a formação dos profissionais da educação e dar outras providências (BRASIL, 2013a______. Lei n. 12.976, de 4 de abril de 2013. Altera a lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para dispor sobre a formação dos profissionais da educação e dar outras providências. Brasília, 2013a. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12796.htm>.
Acesso em: 1 mar. 2014.
Participam
dessa modalidade de ensino os estudantes público-alvo da educação especial, ou seja, com deficiência (visual, auditiva, física e intelectual) (BRASIL, 2015______. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a lei brasileira de inclusão da pessoa com deficiência (estatuto da pessoa com deficiência). Brasília, 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/Lei/L13146.htm>. Acesso em: 16 jan.
2017. Sobre o atendimento educacional especializado presente no inciso III
supracitado, em perfeito acordo com o artigo 208 da Constituição Federal do Brasil (BRASIL, 1988BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 25 jun. 2015. Como
exemplo, temos o ensino do Braille e do Soroban para os educandos cegos e da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) para os surdos, quer dizer, aquilo que é específico desses alunos, a fim de que os mesmos possam ter acesso ao currículo comum. O ensino de tais conteúdos é objeto da educação especial e deve ser ofertado, preferencialmente na rede regular de ensino, no atendimento educacional especializado, no contraturno do ensino regular do educando com deficiência, transtorno global de
desenvolvimento e com altas habilidades ou superdotação. Ainda, os conteúdos do atendimento educacional especializados não devem substituir os da educação regular. Devem ser complementares, para os alunos com deficiências e transtorno global de desenvolvimento ou suplementares para os educandos com altas habilidades ou superdotação. (BRASIL, 2013b______. Nota técnica nº 055 / 2013 / MEC / SECADI / DPEE. Orientação à atuação dos centros de AEE, na perspectiva da
educação inclusiva. Brasília, 2013b. Disponível em: <http://www.ppd.mppr.mp.br/arquivos/File/NOTATECNICAN055CentrosdeAEE.pdf>. Acesso em: 30 jun. 2015. A estrutura proposta pelo desenho universal pressupõe a diversidade e o trabalho com identidade e diferença em sua constituição. Metodologia, processo de comunicação e material instrucional pensado sobre a estrutura referida precisam ser aplicados para toda a sala de aula, devendo ser contemplado na metodologia, processo de comunicação e material instrucional, elementos próprios dos princípios da diversidade, identidade e diferença, e não da homogeneidade e dos espaços homogeneizantes, esses últimos produtos de construção social. São exemplos de materiais instrucionais pensados sob a estrutura do desenho universal, as maquetes e experimentos multissensoriais para o ensino de física de estudantes com e sem deficiência visual contidas em Camargo (2016)CAMARGO, E. P. Inclusão e necessidade especial: compreendendo identidade e diferença por meio do ensino de física e da deficiência visual. São Paulo: Livraria da Física, 2016., uma vez que esses recursos didático-pedagógicos valorizam a diversidade sensorial e discursiva nos processos de ensino, favorecendo a participação efetiva de todos em sala de aula. Hoje, mais que a construção de políticas públicas, como o estatuto da Pessoa com Deficiência (BRASIL, 2015______. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a lei brasileira de inclusão da pessoa com deficiência (estatuto da pessoa com deficiência). Brasília, 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/Lei/L13146.htm>. Acesso em: 16 jan.
2017. Como afirmara Vigotski (1997, p. 77, tradução nossa)______. El niño ciego. In: ______. Fundamentos de defectología. Havana: Editorial Pueblo y Educación, 1997. p. 74-87. (Obras escogidas, tomo V)., "um ponto do sistema Braille fez mais pelo cego que mil obras de caridade" E por quê? Na opinião de Vigotski, é pelo fato de Braille ter incluído tais pessoas no mundo da leitura e da escrita. A partir de 1825, quando o jovem francês Louis Braille (1809-1852) terminou o seu sistema de célula com seis pontos, os cegos puderam efetivamente ter acesso aos estudos, para que fosse possível, atualmente, consolidar esse acesso e ainda possibilitar o ingresso e a permanência no trabalho. Isso mostra a importância da educação, em particular, da educação em física, química e biologia, para todas as pessoas, como fundamento das conquistas sociais para a promoção de cidadania de um povo, elemento este indissociável da heterogeneidade que o
caracteriza. A atual crise política que assola o Brasil traz um discurso contraditório e, às vezes, confuso sobre "qualidade de ensino", que na opinião do autor do presente editorial, objetiva retirar dos educandos brasileiros, público ou não público da educação especial, os instrumentos psicológicos de mediação (VIGOTSKI, 2001VIGOTSKI, L. S. A construção do pensamento e da linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2001.) que lhes possibilitam
interpretar o mundo não natural e que define conceitos como normalidade e deficiência. É preciso, a todo custo, desconstruir a "qualidade de ensino" imposta no Brasil (2016)______. Medida provisória nº 746, de 22 de setembro de 2016. Institui a política de fomento à implementação de escolas de ensino médio em tempo integral, altera a lei n° 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, e a lei n° 11.494 de 20 de
junho 2007, que regulamenta o fundo de manutenção e desenvolvimento da educação básica e de valorização dos profissionais da educação, e dá outras providências. Brasília, 2016. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Mpv/mpv746.htm>. Acesso em: 13 jan. 2017. Referências
O que diz a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da educação inclusiva?Na perspectiva da educação inclusiva, a educação especial passa a integrar a proposta pedagógica da escola regular, promovendo o atendimento às necessidades educacionais especiais de alunos com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação.
O que muda com a nova lei da educação especial?A nova PNEE estabelece que a Educação Especial seja oferecida preferencialmente na rede regular de ensino. Isso significa que sempre haverá preferência pela escola regular, conforme a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).
Quais são os princípios da Política Nacional de Educação Especial?Em resposta a esse clamor, nasce a Política Nacional de Educação Especial: Equitativa, Inclusiva e com Aprendizado ao Longo da Vida, voltada para os educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação.
Quais são os cinco princípios da educação inclusiva?Toda pessoa tem o direito de acesso à educação. Toda pessoa aprende. O processo de aprendizagem de cada pessoa é singular. O convívio no ambiente escolar comum beneficia todos.
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