É possível ao Comodante exigir a restituição da coisa antes de findo o prazo do comodato?

Decis�o Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justi�a

I – Relat�rio

1. AA e marido BB instauraram a presente a��o declarativa sob a forma de processo comum contra CC e mulher DD, pedindo que os RR. sejam condenados a:

- Reconhecer que os pr�dios identificados na peti��o inicial fazem parte do acervo heredit�rio dos falecidos EE e FF, da qual os autores s�o os �nicos herdeiros;

- Entregar os ditos pr�dios � A. para que esta os administre na qualidade de cabe�a-de-casal;

- Pagar a quantia de € 400,00 mensais por cada m�s em que se mantenham na posse e utiliza��o do pr�dio urbano identificado no art. 7�, da p.i., desde a cita��o at� entrega efetiva.

Para tanto, alegaram, em s�ntese, que os r�us recusam entregar � autora, na qualidade de cabe�a de casal da heran�a aberta por �bito dos seus pais, os pr�dios que identificam na peti��o inicial, apesar de n�o disporem de t�tulo que legitime a sua atua��o.

2. Na contesta��o, os r�us, defendendo-se por exce��o, invocaram a ilegitimidade da autora; por impugna��o, alegaram que o pr�dio urbano onde o r�u habita lhe foi doado pelos seus pais, os falecidos EE e mulher onde, h� mais de 25 anos, habita com o seu agregado familiar, fruindo e usando o im�vel de forma p�blica, pac�fica e de boa-f�, pelo que decorreu o prazo de aquisi��o da propriedade por usucapi�o; assim n�o se entendendo, alegaram ter direito a receber dos r�us uma compensa��o correspondente ao valor das benfeitorias por si realizadas no pr�dio em causa.

A t�tulo subsidi�rio, deduziram reconven��o, pedindo a condena��o dos autores a reconhecer que os r�us adquiriram por usucapi�o o pr�dio urbano identificado no art. 7�, da p.i.;

Ainda a t�tulo subsidi�rio, pediram a condena��o dos autores a pagar aos r�us o valor das benfeitorias por estes realizadas no mencionado pr�dio, no montante de EUR 49.890,00, ou, pelo menos, o valor resultante da compensa��o com o cr�dito por aqueles reclamado, valor que computam em € 9.890,00.

3. Na 1� inst�ncia, foi proferida senten�a que:

I – Julgando a a��o parcialmente procedente, condenou os r�us a:

- Reconhecer que o pr�dio urbano e o pr�dio r�stico descritos em 5.5 dos factos provados fazem parte das heran�as abertas por �bito de FF e EE e que o pr�dio urbano descrito em 5.6 dos mesmos factos provados faz parte da heran�a aberta por �bito de EE;

- Restituir de imediato � heran�a aberta por �bito FF e de EE os pr�dios identificados em 5.5 dos factos provados;

- Quanto ao mais, absolveu os r�us do pedido.

II – Julgando a reconven��o parcialmente procedente, condenou os autores a reconhecer que os r�us realizaram as obras referidas em 5.37 dos factos provados, que importaram em montante a liquidar ulteriormente, absolvendo, quanto ao mais, os autores do pedido reconvencional.

4. Inconformados com a senten�a, dela apelaram os r�us, tendo os autores, por sua vez, interposto recurso subordinado. Foi, ent�o, proferido ac�rd�o pelo Tribunal da Rela��o de Coimbra que:

- Julgou improcedente a apela��o dos r�us;

- Julgou parcialmente procedente a apela��o dos autores e, em fun��o disso, revogou a senten�a na parte em que absolveu os r�us do pedido de restitui��o � autora, como cabe�a de casal da heran�a de EE, do pr�dio identificado em 5.6 dos factos provados, condenando os r�us a restitui-lo de imediato � autora para que ela o administre nessa qualidade;

- Confirmou, quanto ao mais, a senten�a recorrida.

5. De novo irresignados, os r�us vieram interpor recurso de revista, formulando as seguintes conclus�es:

I-O presente recurso de revista assenta na convic��o dos r�us/ recorrentes de que existiu um erro de interpreta��o e, consequentemente, de determina��o e aplica��o de norma, com viola��o de lei substantiva, por parte dos Venerandos Desembargadores na prola��o do ac�rd�o de que se recorre, em concreto, uma errada interpreta��o e aplica��o ao caso sub judice do artigo 1137� do C�digo Civil, pese embora reconhe�am no seu ac�rd�o que, "n�o se ignora que alguma jurisprud�ncia tem interpretado aquela express�o legal com o sentido apontado na senten�a." (de primeira inst�ncia).

II-Quer em primeira inst�ncia quer no douto ac�rd�o que ora se ��recorre, � pac�fico e indiscut�vel que o falecido pai (e sogro) dos r�us recorrentes lhes haja cedido o im�vel identificado em 5.6 dos factos provados para sua habita��o pr�pria e permanente, do mesmo modo que � consent�neo que a figura jur�dica em apre�o � o contrato de comodato, previsto nos artigos 1129� e ss do CC.

III-� igualmente pac�fico que o contrato de comodato � composto por tr�s grandes elementos caracterizadores: a gratuitidade, a temporalidade e a obriga��o de restituir, sendo que prazo certo e uso determinado n�o s�o elementos definitivos do conceito de comodato, mas sim fatores definidores da obriga��o de restituir.

IV-O douto ac�rd�o de que se recorre coloca em causa a exist�ncia do requisito da temporalidade, conferindo ao comodante o direito de exigir o pr�dio mencionado em 5.6 ao(s) comodat�rio(s) - e � com esta errada interpreta��o do preceituado do n� 2 do artigo 1137� do CC que n�o se pode concordar, por incorreta aplica��o do dispositivo legal face aos concretos factos em lit�gio e dados como provados.

V-Est� provado que o referido pr�dio foi cedido aos r�us recorrentes, h� mais de 20 anos, para ali fixarem a sua habita��o pr�pria e permanente, ali tendo sido efetuadas obras de melhoria, com vista a lhe ser conferido o car�cter de habitabilidade necess�rio, pelo que, de facto, a habita��o dos r�us � o fim do contrato de comodato, em respeito ao previsto no artigo 1131� do CC.

VI-Coisa diversa � o entendimento sobre a durabilidade conferida a essa finalidade, pois tal facto � o determinante a apurar que existe ou n�o legitimidade para se exigir a restitui��o do aludido pr�dio aos r�us, nos termos previstos no artigo 1137� do CC, pois que, enquanto a primeira inst�ncia decidiu que a restitui��o s� dever� operar nos termos do n� 1 do referido artigo 1137� do CC, o douto ac�rd�o de que se recorre, por seu turno, entende dever aplicar-se a restitui��o, nos termos do n� 2 do referido normativo legal, estando assim em lit�gio a interpreta��o do conceito de temporalidade do contrato em apre�o.

VII-Quanto � durabilidade ou temporalidade do presente contrato de comodato, quando um pai cede uma casa a um filho (nora e netos) para ali fixarem a sua resid�ncia e ali efetuando as obras e investimentos necess�rios a se conferir essa habitabilidade, � l�cito pressupor e subsumir que tal ced�ncia vigorar� at� ao fim da vida do mesmo, resultando at� do estimado senso comum, n�o fosse a demais factualidade provada nos autos.

VIII-Ora, apesar do comodante EE n�o ter convencionado formalmente com o filho, o tempo de dura��o do comodato, resulta da natureza e circunst�ncias da sua realiza��o que, pelo menos, a morte do comodat�rio ter� que ser entendida como o prazo limite da dura��o do referido contrato.

IX�������� - A entender-se assim, defendem ainda os r�us tratar-se de um verdadeiro contrato com termo e, portanto, s� poss�vel de restitui��o quando verificado o seu termo, ainda que o mesmo seja determin�vel e n�o (ainda) determinado.

X-A quest�o divergente a apreciar e decidir � apurar se este contrato de comodato (vital�cio) celebrado com os r�us � ou n�o temporalmente determinado, o que defendemos em sentido positivo, tal como vem sendo entendimento jurisprudencial e doutrin�rio.

XI-Entendem os r�us recorrentes que o termo do contrato de comodato � a morte do comodat�rio, a qual � indubitavelmente certa, pese embora o dia da sua ocorr�ncia seja ���� incerto. Assim, o facto da temporalidade do contrato de comodato em apre�o ser determin�vel, com base num termo certo na sua concretiza��o, mas incerto no seu momento temporal, conduz a que a restitui��o fique sujeita � verifica��o de um termo final incerto, ou seja, uma circunst�ncia certa (morte) cuja ocorr�ncia n�o pode ser previamente determinada.

XII-E s�o v�rias as decis�es nos tribunais, todas j� transitadas em julgado, que apoiam, defendem e aplicam este entendimento, tais como o douto Ac�rd�o do Supremo Tribunal de Justi�a, em 16/ll/2010,no processo 7232/04-0TCLRS.L1.C1, "o uso s� tem fim determinado se for tamb�m temporalmente determinado, ou pelo menos, um tempo determin�vel" (sublinhado nosso).

XIII-Encontramos ainda apoio jurisprudencial da tese dos aqui r�us nos seguintes ac�rd�os: Ac�rd�o do Tribunal da Rela��o do Porto, de 07/04/2005, proc. 0531494; Ac�rd�o do Tribunal da Rela��o de Coimbra, de 27/06/2006, proc. 964/06, relator Isa�as P�dua; Ac�rd�o do Tribunal da Rela��o do Porto, de 15/01/2007, relator Cura Mariano; Ac�rd�o do Tribunal da Rela��o do Porto, de 07/07/2004, relator Henrique Ara�jo ("Exemplo t�pico do termo incerto � a morte - certa na sua fatalidade, incerta quanto � sua data - v. Galv�o Telles, "Manual dos Contratos em Geral", 4a edi��o, p�gs. 276/277. Nesse caso, o termo, embora incerto o momento da sua verifica��o, � determin�vel na medida em que o evento futuro � certo."); Ac�rd�o do Tribunal da Rela��o de Lisboa, de 14/10/2008, relator Jos� Augusto Ramos, proc. 2875/2008.1; Ac�rd�o do Tribunal da Rela��o de Coimbra, de 21/05/2013, relator Moreira do Carmo, proc. 5O5/12.0TBMLD.C1 ("o uso da coisa por toda a vida do comodat�rio, � um comodato v�lido, porque o seu termo, embora incertus quando, � determin�vel, pois a morte � certa, o dia da sua ocorr�ncia � que � incerto (vide neste sentido, M. Leit�o, ob. cit. p�g. 380. nota 731, Ac. da Rel. Lisboa, de 25.5.2000, CJ, T. III, p�g. 99 e Ac. desta Rela��o de Coimbra de 27-6.2006, CJ, T l, p�g. 20)."; Ac�rd�o do Tribunal da Rela��o de Lisboa, de 11/06/2016, relator Ant�nio Valente, proc. 1117'13.7/TVLSB,Ll-8, todos dispon�veis em www.dgsi.pt.

XIV-A acolher este entendimento vide tamb�m os ensinamentos de J�lio Gomes, em "Do Contrato de Comodato, Cadernos de Direito Privado, n� 17 de Janeiro de 2007", assim como Louren�o C�rte-Real em "Do Contrato de Comodato na Ordem Jur�dica Portuguesa - Alguns tra�os gerais do regime - Verbo Jur�dico, 2016, p. 12 e ss"; do mesmo modo Marques, de Matos em "O Contrato de Comodato, 2005, p. 7, 51 e 52"; na mesma senda veja-se ainda o Professor Menezes de Leit�o em "Direito das Obriga��es, Contratos em Especial, Vol. III, 3� edi��o, p. 369/384, nota 717 e ainda Professores Pires de Lima e Antunes Varela em "C�digo Civil Anotado, Vol. III, p. 595 e 596, nota 4".

XV-Aplicando-se a interpreta��o adotada pelos r�us e pelos Venerandos Desembargadores e Acad�micos atr�s elencados ao caso em concreto, apuramos que a sua finalidade foi uma ced�ncia para habita��o do filho e familiares, cuja finalidade est� intrinsecamente conexionada com o tempo de vida do comodat�rio, tempo esse certo e determin�vel, facto que levar� a que s� haja lugar � restitui��o quando essa finalidade atingir o seu termo.

XVI-Encontra-se igualmente dado como assente que se encontra em curso processo de invent�rio por �bito do comodante EE em que o pr�dio em apre�o encontra-se relacionado por constituir parte do acervo heredit�rio. Assim, n�o fosse o prazo certo da morte do comodat�rio, sempre tal prazo poder� ser reduzido por for�a da natureza do pr�prio processo de invent�rio em curso.

XVII-Da� concordarem tamb�m com a douta senten�a de primeira inst�ncia quando ali se refere que "quest�o diversa ser� a da Hip�tese de atribui��o da autora, em sede de partilha, do pr�dio em causa, caso em que, perante efic�cia meramente obrigacional do contrato de comodato, e a circunst�ncia de este apenas vincular os que nele intervieram, a autora poder� alegar que o � comodato n�o lhe � opon�vel e exigir que o bem lixe seja restitu�do."

XVIII-Em suma, o contrato de comodato em apre�o re�ne as suas caracter�sticas essenciais da gratuitidade e temporalidade, pois que est� condicionado � verifica��o de um termo que � certo, a morte do comodat�rio, n�o obstante seja incerto o momento da sua verifica��o. Tal temporalidade determin�vel basta para se entender com o consenso necess�rio na doutrina e jurisprud�ncia, que nestes casos de ced�ncia de habita��o vital�cia, a restitui��o s� poder� operar verificado que seja esse termo.

XIX-Concluindo assim os r�us que, estando aos autores vedada a possibilidade de exigir a restitui��o, nos termos do artigo 1137�, n� 1 do CC, nos termos invocados, s� lhes ���������� restar� aguardar pelo termo do mesmo ou, ao inv�s, pelo t�rmino do processo de invent�rio j� em curso, onde certamente em prazo mais curto ser� decidido o destino deste pr�dio em lit�gio.

XX-Face ao exposto, ao decidir como decidiu, com errada interpreta��o do disposto nos n�s 1 e 2 do artigo 1137� do CC e consequente errada aplica��o da obrigatoriedade de restitui��o face �s caracter�sticas do contrato de comodato em apre�o, mormente quanto ao seu fim e uso determin�vel do mesmo, viola o douto ac�rd�o os aludidos preceitos legais, estando errado ao decidir, sem mais, que "n�o s� ao R�u n�o foi fixado prazo para a restitui��o do pr�dio, como para o mesmo n�o foi previsto qualquer uso determinado".

XXI-Face � supra citada viola��o do douto ac�rd�o, dever� proferir-se decis�o no sentido da n�o obrigatoriedade de restitui��o do referido pr�dio, sendo reconhecido que o contrato de comodato em apre�o re�ne igualmente a caracter�stica da temporalidade, ainda que determin�vel (e n�o determinada), s� tornando exig�vel a sua restitui��o quando verificado esse termo (ainda que incerto quanto � sua produ��o) ou qualquer outro evento jur�dico que resolva naturalmente o contrato (como � o caso das partilhas por invent�rio por �bito do comodante), o que se invoca aos Colendos Conselheiros deste Supremo Tribunal de Justi�a.

6. Nas contra-alega��es, pugnou-se pela confirma��o do ac�rd�o recorrido.

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7. Como se sabe, o �mbito objetivo do recurso � definido pelas conclus�es apresentadas(arts. 608.�, n.�2, 635.�, n�4 e 639�, do CPC), pelo que s� abrange as quest�es a� contidas.

Por sua vez – como vem sendo repetidamente afirmado – os recursos s�o meios para obter o reexame de quest�es j� submetidas � aprecia��o do tribunal que proferiu a decis�o impugnada, e n�o para criar decis�es sobre mat�ria nova, n�o submetida ao exame do tribunal a quo.

Sendo assim, a �nica quest�o de que cumpre conhecer consiste em saber se os r�us devem restituir aos autores o im�vel identificado no ponto 5.6., dos factos provados que lhes foi entregue, por via de comodato.

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II – Fundamenta��o de facto

8. Est� provado que:

“5.1 – Em 9 de Junho de 1980 faleceu FF, sem testamento ou qualquer disposi��o de �ltima vontade (artigo 1� da peti��o inicial);

5.2 – A falecida deixou como seus �nicos e universais herdeiros:

- EE, c�njuge;

- AA, filha, casada segundo o regime de comunh�o de adquiridos com BB;

- CC, filho, casado segundo o regime de bens de comunh�o de adquiridos com DD (artigo 2� da peti��o inicial);

5.3 – No dia 17 de Outubro de 2012 faleceu EE, tendo deixado testamento lavrado no Cart�rio Notarial de Penalva do Castelo em 28/3/2012, por interm�dio do qual declarou: “Que deixa a quota dispon�vel de todos os seus bens e direitos que � hora da sua morte tiver, a sua filha AA (…)” (artigo 3� da peti��o inicial e 77� da contesta��o);

5.4 - As heran�as deixadas por �bito de FF e EE foram aceites pelos identificados herdeiros, encontrando-se por partilhar, sendo a cabe�a de casal das mesmas AA, por ser a mais velha (artigo 4� da peti��o inicial);

5.5 – Do acervo de bens que integram as heran�as de FF e EE faz parte o seguinte pr�dio:

a) Terra de cultura e regadio com oliveiras, fruteiras e vinha, com a �rea de 6.600 m2, sita � ....., ....., inscrita na matriz predial r�stica da Uni�o das freguesias de ....., ..... e ....., concelho de ....., sob o artigo ..... (anterior 4631 da freguesia de .....), a confrontar do norte e poente com caminho, nascente com GG, sul com .......... e poente com caminho, com o valor patrimonial tribut�rio de € 186,51, descrita na Conservat�ria do Registo Predial de ..... sob o n� .....;

b) Casa destinada a habita��o, composta de ....., sita na Rua ..........n� ..., ....., com a �rea total de 394,50 m2 (superf�cie coberta de 78 m2, garagem de 48 m2 e logradouro com 268,45 m2), inscrita na matriz predial urbana da Uni�o das Freguesias de ....., ..... e ....., concelho de ....., sob o artigo 2535 (anterior artigo 2570 da freguesia de .....), com o valor patrimonial tribut�rio de € 49.610,00, n�o descrita na Conservat�ria do Registo Predial de ....., com a localiza��o e configura��o constante da planta anexa (artigo 6� da peti��o inicial);

5.6 – Integra ainda a heran�a de EE o seguinte pr�dio:

- Casa destinada a habita��o, composta de r�s- do-ch�o e primeiro andar com a �rea total de 300 m2 (superf�cie coberta de 130 m2 e logradouro co 170 m2), sita na Travessa ..........n�.. inscrita na matriz predial urbana da Uni�o das Freguesias de ....., ..... e ....., concelho de ....., sob o artigo 3920 (anterior artigo 4420 da freguesia de .....), com o valor patrimonial tribut�rio de € 57.710,00 (artigo 7� da peti��o inicial);

5.7 – A casa mencionada em 5.6 foi constru�da por EE, ap�s o �bito de FF, inscrita na matriz no ano de 1992, constando unicamente da rela��o de bens apresentada por �bito daquele (artigo 8� da peti��o inicial);

5.8 – Autores e r�us e, anteriormente, os falecidos FF e EE, quanto aos pr�dios r�stico e urbano identificados em 5.5, e, exceptuando a falecida FF quanto ao pr�dio urbano identificado em 5.6, h� mais de 30 anos que utilizam esses pr�dios em proveito pr�prio e dando-os a utilizar a terceiros, � vista de toda a gente, sem oposi��o de ningu�m, de forma exclusiva, ininterrupta, ignorando lesar o direito de outrem, fruindo dos seus proventos e rendimentos, agindo na convic��o de exercer um direito pr�prio (artigo 9� da peti��o inicial);

5.9 – O pr�dio urbano identificado em 5.6 foi cedido h� mais de 20 anos pelo falecido EE aos r�us, para a respectiva habita��o, sem obriga��o de pagamento de qualquer contrapartida, nem estipula��o de qualquer prazo de restitui��o, a� residindo os r�us desde ent�o e at� � presente data, a� pernoitando, depositando m�veis e objetos pessoais, parqueando ve�culos autom�veis, utilizando-o tamb�m como canil (artigos 10�, 11�, 12� e 13� da peti��o inicial, 33� e 34� da contesta��o);

5.10 – O pr�dio urbano identificado em 5.6 apresenta fracas condi��es de conforto, uso e habitabilidade (artigo 15� da peti��o inicial);

5.11 – Sem consentimento e contra a vontade do falecido EE e dos autores, em Novembro de 2011, os r�us passaram a utilizar o pr�dio r�stico e o r�s-do-ch�o do pr�dio identificados em 5.5 destinado a lagar e arrumos, para produ��o de vinho e para dep�sito e materiais, tendo procedido ao cultivo do r�stico, nomeadamente com batatas e produtos hort�colas, podando e tratando das �rvores de fruto e videiras, ficando com a respectiva produ��o, da qual n�o prestaram contas (artigo 21� da peti��o inicial);

5.12 – Em 2012, EE instaurou contra os r�us o procedimento cautelar n� 381/12.3TBMGL, no qual formulou o seguinte pedido quanto ao pr�dio identificado em 5.5:

“Nestes termos e nos melhores de direito, deve a presente provid�ncia ser recebida, julgada procedente e provada, decretando-se:

a) A restitui��o da posse ao requerente do pr�dio r�stico identificado na al�nea a) do anterior artigo 6�;

b) A proibi��o dos requeridos de ocuparem ou entrarem nas parcelas de terreno identificadas nos anteriores artigos 15� e 18� e no armaz�m/churrasqueira nestas edificado, permitindo a sua frui��o pelas arrendat�rias supra identificadas;

c) A proibi��o dos requeridos de explorarem, ocuparem ou entrarem no identificado pr�dio r�stico, dificultarem ou impedirem a sua administra��o e explora��o pelo requerente;” (artigo 22� da peti��o inicial);

5.13 – Em tal procedimento, os r�us alegaram:

“IV – O pr�dio urbano – art.� 4420�

42�

Contrariamente ao que se refere no art.� 13 este pr�dio pertence � heran�a e n�o ao requerente.

43�

Est� implantado no pr�dio r�stico inscrito na matriz sob o artigo 7455.

44�

Resultou da amplia��o de uma antiga casa de granito a� existente h� mais de 50 anos.

45�

Que os requeridos remodelaram e melhoraram, destinando-se � sua habita��o e dos filhos desde 1992.

46�

Ali habitando por direito pr�prio na qualidade de herdeiro da referida heran�a.

47�

E tendo nele realizado avultadas benfeitorias nessa condi��o” (artigo 38� da r�plica);

5.14 - No identificado procedimento cautelar foi celebrada transa��o, homologada por senten�a transitada em julgado em 17/9/2012, na qual, relativamente ao identificado pr�dio, foi acordado o seguinte:

“Os requeridos reconhecem que os pr�dios identificados no artigo 6� do requerimento inicial s�o propriedade da heran�a il�quida e indivisa aberta por �bito de FF, da qual � cabe�a de casal EE.

(…)

4�

Os requeridos obrigam-se a entregar ao requerente a restante parte do pr�dio r�stico identificado na al�nea a) do artigo 6� bem como o lagar situado no r�s-do-ch�o do pr�dio urbano identificado na al�nea b) do artigo 6� do requerimento inicial e respectivas chaves at� ao dia 30 de Outubro de 2012, livres e desembara�ados.

5�

A t�tulo de cl�usula penal os requeridos obrigam-se a pagar ao requerente a quantia de € 50,00 (cinquenta euros) por cada dia de atraso na entrega da parte do pr�dio e lagar referidos no artigo anterior.

6�

Os requeridos obrigam-se a n�o mais entrar a partir desta data nas parcelas de terreno e armaz�m/churrasqueira identificados no artigo 2� e a partir de 01 de Novembro de 2012 na restante parte do pr�dio r�stico e lagar identificado no artigo 4�” (artigo 23� da peti��o inicial)”;

5.15 – No cumprimento da transa��o celebrada em 2 de Novembro de 2012 os r�us entregaram a EE, na pessoa do seu mandat�rio, os referidos pr�dios r�stico, r�s- do- ch�o do urbano e respectivas chaves, tendo este emitido a declara��o junta a fls. 109 (artigo 24� da peti��o inicial);

5.16 – Os r�us instauraram em novembro de 2014 o procedimento cautelar de ratifica��o de obra nova n� 39/14.9TBMGL, no qual, al�m do mais alegaram:

“7�

A heran�a deixada por �bito de FF e EE permanece por partilhar.

8�

Do acervo heredit�rio a partilhar fazem parte, al�m do mais, os seguintes bens.

(…)

d) pr�dio urbano composto de casa destinada a habita��o composta de r�s-do-ch�o e 1� andar, tem cinco divis�es e cinco v�os no r�s-do-ch�o e seis divis�es e dez v�os 1� andar (…) inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... (…);

13�

No mais, e relativamente aos pr�dios identificados nas al�neas a) a d) do anterior artigo 8�, a heran�a il�quida e indivisa aberta por �bito de FF e EE, por si e pelos seus antecessores, andou na posse dos referenciados pr�dios, cultivando-os, procedido a obras (…);

14�

Pelo que se outro t�tulo n�o tivesse j� adquiriu os pr�dios referidos no artigo 8� desta peti��o por usucapi�o (…)” (artigo 39� da r�plica);

5.17 – Em 9/11/2012, a autora, em representa��o das identificadas heran�as il�quidas e indivisas, celebrou com II acordo denominado pelos outorgantes como “contrato de comodato” o qual teve como objeto o pr�dio r�stico identificado em 5.5 (artigo 25� da peti��o inicial);

5.18 – Nos termos de tal acordo, a a� identificada como primeira outorgante declarou ceder a utiliza��o gratuita ao segundo outorgante do pr�dio r�stico supra mencionado para que este procedesse ao seu cultivo agr�cola (artigo 26� da peti��o inicial);

5.19 – Tal acordo foi celebrado com in�cio em 9/11/2012 e termo em 20/9/2013, renovando-se por per�odos sucessivos de um ano caso n�o fosse denunciado (artigo 27� da peti��o inicial);

5.20 – Na sequ�ncia de tal acordo, II procedeu ao cultivo do pr�dio r�stico, aproveitando a sua produ��o, e utilizou o pr�dio urbano, para dep�sito de produtos e ferramentas agr�colas (artigos 29� e 32� da peti��o inicial);

5.21 – Em Junho de 2014, sem consentimento e contra a vontade dos autores e de II, os r�us come�aram a utilizar os referidos pr�dios r�stico e urbano, utilizando este para efetuar produ��o de vinho e dep�sito de produtos e ferramentas agr�colas, tendo procedido ao cultivo do r�stico, com cultura de batatas e de produtos hort�colas, � poda e ao tratamento das �rvores de fruta e das videiras, ficando com a respectiva produ��o, da qual n�o prestaram contas, situa��o que se mantinha na data da interposi��o da presente a��o (artigo 30� da peti��o inicial);

5.22 – Em tal pr�dio r�stico existem �rvores de fruta, oliveiras e vinha, sendo o mesmo utilizado para produ��o de produtos hort�colas, designadamente de batatas (artigo 31� da peti��o inicial);

5.23 – Os r�us impediram II e os autores de entrarem, utilizarem e explorarem os identificados pr�dios, amea�ando-os com o uso de viol�ncia f�sica caso persistissem no prop�sito de aceder a tais pr�dios e de os cultivarem, tendo sido instaurado o processo de inqu�rito n� 386/14.0GAMGL por for�a de desentendimentos suscitados com a utiliza��o de tais pr�dios (artigo 33� da peti��o inicial);

5.24 – Os autores s�o casados entre si no regime da comunh�o de adquiridos (artigos 5� da contesta��o e 1� da r�plica);

5.25 – Corre termos no Cart�rio Notarial de Penalva do Castelo sob o n� 3614/15, processo de invent�rio para partilha da heran�a deixada por �bito de FF e de EE, processo esse que foi instaurado pela autora no final do ano de 2015 (artigos 9� e 13� da contesta��o);

5.26 – As quantias que a autora reclama nos presentes autos instaurados em 6/1/2016 n�o foram relacionadas em tal invent�rio, sendo que a rela��o de bens a� foi apresentada em 5/1/2016 (artigos 10� e 14� da contesta��o, 8� e 9� da r�plica);

5.27 – A autora reside habitualmente nos Estados Unidos da Am�rica, tendo ali fixado a sua resid�ncia h� mais de 36 anos (artigo 22� da contesta��o);

5.28 – Quando est� em Portugal, a autora fica alojada na sua casa de habita��o que foi constru�da num lote de terreno desanexado de um terreno que outrora pertenceu aos pais de ambos (da autora e do r�u) (artigos 23�, 24� e 25� da contesta��o);

5.29 – Tal lote, por escritura de 22 de agosto de 1983, foi vendido a JJ, tendo a autora, o r�u e EE comparecido e outorgado a respectiva escritura, na qualidade de vendedores, por se tratar de bem que fazia parte do acervo heredit�rio deixado por �bito de FF (artigos 26� e 27� da contesta��o e 17� da r�plica);

5.30 – Pouco tempo depois, por escritura p�blica celebrada no dia 29 de agosto de 1983, tal comprador JJ e esposa KK declararam vender o dito terreno ao autor, no estado de casado no regime da comunh�o de adquiridos com AA, pelo pre�o de duzentos e cinquenta mil escudos, declarando ainda terem recebido tal pre�o (artigo 28� da contesta��o e 18� da r�plica);

5.31 – Quando os r�us se casaram em 1985 ficaram a residir na casa da habita��o da autora, a t�tulo de empr�stimo e gratuitamente, o que sucedeu durante cerca de 5 ou 6 anos (artigo 32� da contesta��o);

5.32 – Decorridos tais cinco ou seis anos, o falecido EE entregou ao r�u o pr�dio mencionado em 5.6 para que ali fixasse a sua resid�ncia (artigos 33�, 34�, 74� da contesta��o);

5.33 – Antes de o r�u e o seu agregado familiar fixarem resid�ncia em tal pr�dio, o mesmo era composto de um edif�cio de dois pisos (artigos 35� e 84� da contesta��o);

5.34 – Com vista � fixa��o do r�u e do seu agregado familiar no piso de cima do pr�dio, foi melhorado tal piso superior, tendo sido aproveitadas as paredes de uma casa de arrumos que ali existia, tendo sido requisitados contadores de �gua, luz, saneamento, instaladas caixas-de-ar, canaliza��es, instala��es el�tricas, executado reboco, pinturas, executadas divis�rias e wc s, tudo com vista a dotar tal fra��o de condi��es de habitabilidade (artigo 36� da contesta��o, 26� da r�plica);

5.35 – EE cedeu o ....de tal pr�dio a LL que ali habitou durante cerca de 10 anos (artigo 29� da r�plica);

5.36 - Desde cerca de 1990 ou 1991 que o r�u ali habita e guarda os seus pertences, utilizando tal fra��o na convic��o de n�o prejudicar direitos de outrem ao utilizar tal pr�dio na qualidade de herdeiro do propriet�rio, � vista de toda a gente e sem qualquer oposi��o designadamente por parte da autora at� � interposi��o da presente a��o (artigos 38�, 39�, 76�, 79�, 82�, 84� (parcialmente), 86� (parcialmente) da contesta��o);

5.37 – Em tal pr�dio, os r�us colocaram revestimento em granito na escadaria exterior de acesso ao 1� andar, no que despenderam montante que em concreto n�o foi poss�vel apurar (artigos 27�, 86� e 87� da r�plica);

5.38 - O pr�dio supramencionado em 5.5 b) que consiste num T3 com garagem e terrenos est� arrendado a DD pelo valor mensal de € 150,00 (artigo 46� da contesta��o);

5.39 – Mediante o pagamento de uma contrapartida mensal de € 175,00, a autora arrendou ainda o pr�dio composto por casa de habita��o, sita na Rua ..........n� ..., ....., composto de ........andar, inscrito na matriz predial urbana da Uni�o das freguesias de ....., ..... e ....., concelho de ..... sob o artigo 2729, n�o descrito na Conservat�ria do Registo Predial de ..... com o valor patrimonial de € 89.090,00 (artigos 47� e 48� da contesta��o);

5.40 – Tal pr�dio foi a casa de habita��o dos pais da autora e do r�u, sendo um im�vel de tipologia T4, com garagem, terreno e furo, possuindo mob�lias completas de sala e de cozinha (artigo 48� da contesta��o).

***

III – Fundamenta��o de direito

9. Do comodato e da restitui��o da coisa

As inst�ncias qualificaram como comodato o contrato celebrado entre o r�u e o seu pai, sujeitando-o � disciplina dos arts. 1129� e ss. do C�digo Civil, qualifica��o jur�dica que merece, igualmente, a nossa concord�ncia e que nem sequer � posta em causa no presente recurso.

Efetivamente, resulta dos autos que o pai do r�u, entretanto falecido, cedeu a este, a t�tulo gratuito e tempor�rio, a utiliza��o do pr�dio urbano identificado no ponto 5.6., dos factos provados, para servir de habita��o ao r�u e � sua fam�lia e sem que tenha sido fixado prazo para a sua restitui��o.

Sucede que os r�us se recusam a entregar o referido pr�dio � autora, cabe�a de casal da heran�a aberta por �bito do seu pai, alegando que n�o findou o uso para que foi �emprestado� aquele im�vel, entendimento que foi acolhido pela 1� inst�ncia que, invocando o disposto no art. 1137�, n�1, do CC, absolveu os r�us do pedido, nesta parte.

Diversamente, o Tribunal da Rela��o de Coimbra considerou que, n�o tendo sido acordado prazo para a restitui��o do dito im�vel, nem determinado o respectivo uso, o r�u, enquanto comodat�rio, est� obrigado a restitui-lo logo que lhe seja exigido, de harmonia com o preceituado no n�2, do art. 1137�, do CC.

Com tal fundamenta��o, condenou os r�us na restitui��o � autora do pr�dio acima referido.

Contra o assim decidido se insurgem os r�us/recorrentes, pugnando pela repristina��o do sentenciado na 1� inst�ncia.

Ora bem.

Nos termos do art.� 1129� do C�d. Civil, "comodato � o contrato gratuito pelo qual uma das partes entrega � outra certa coisa, m�vel ou im�vel, para que se sirva dela, com a obriga��o de a restituir".

Trata-se de um contrato real (quoad constitutionem) que se aperfei�oa apenas com a entrega da coisa, a fim de que a pessoa a quem o seu gozo � cedido se possa servir dela, e n�o sinalagm�tico, pois que n�o h� correspectividade entre as obriga��es dele emergentes para as partes contratualizantes, ou seja, o uso da coisa n�o beneficia de contrapresta��o.

Como se colhe da sua pr�pria defini��o, � da natureza do contrato de comodato a obriga��o de restituir a coisa.

A precariedade do uso facultado ao comodat�rio transparece, ainda, claramente, quer das obriga��es espec�ficas do comodat�rio, quer do regime estabelecido para a restitui��o da coisa (cf. arts. 1135� e 1137�, do CC).[1]

Efetivamente, disp�e-se no art. 1135�, al. h), do CC que o comodat�rio deve restituir a coisa ao comodante findo o contrato.

Por sua vez, quanto � restitui��o da coisa, estabelece-se no art.� 1137�, n.� 1, do mesmo C�digo, que "se os contraentes n�o convencionaram prazo certo para a restitui��o da coisa, mas esta foi emprestada para uso determinado, o comodat�rio deve restitu�-la ao comodante logo que o uso finde, independentemente de interpela��o"; e acrescenta o n.� 2 que "se n�o foi convencionado prazo para a restitui��o nem determinado o uso da coisa, o comodat�rio � obrigado a restitu�-la logo que lhe seja exigida".

A prop�sito da dura��o do uso da coisa refere Rodrigues Bastos[2] que “o uso da coisa, no comodato, deve durar por todo o tempo estabelecido no contrato. Discute-se se ser� admiss�vel um comodato por mais de trinta anos, dado o que preceitua o art. 1025.� (para a loca��o). Embora a lei n�o marque, para esta hip�tese, um limite � dura��o do uso, a verdade � que tem de considerar-se a ced�ncia sempre limitada a certo per�odo de tempo, sob pena de desrespeitar a fun��o social preenchida por este contrato, cuja causa � sempre uma gentileza ou favor, n�o concili�vel com o uso muito prolongado do im�vel. Bastar� para isso pensar que um comodato muito prolongado de um im�vel converter-se-ia em doa��o (indirecta) do gozo da coisa, ou, se fosse para durar por toda a vida da outra parte, o comodato descaracterizar-se-ia em direito de uso e habita��o. “.

Em raz�o dessa nota de temporalidade, assumida como tra�o essencial do comodato, a jurisprud�ncia deste Supremo Tribunal tem entendido que o �uso determinado�, a que se alude no art. 1137�, do CC, pressup�e uma delimita��o da necessidade temporal que o comodato visa satisfazer, n�o podendo considerar-se como determinado o uso de certa coisa se n�o se souber, quando aquele uso n�o vise a pr�tica de atos concretos de execu��o isolada mas antes atos gen�ricos de execu��o continuada, por quanto tempo vai durar, caso em que se deve haver como concedido por tempo indeterminado. Assim, o uso s� � determinado se o for tamb�m por tempo determinado ou, pelo menos, determin�vel.[3]

Trata-se de orienta��o que tamb�m acolhemos, por se nos afigurar que, no quadro normativo vigente, n�o seria de aceitar um comodato que subsistisse indefinidamente, seja por falta de prazo, seja por ele ter sido associado a um uso gen�rico, de tal modo que o comodat�rio pudesse manter gratuitamente e sem limites o gozo da coisa.

Esta posi��o que sufragamos �, al�m disso, a nosso ver, a mais consent�nea com o princ�pio geral emanado do art. 237�, do CC, segundo o qual, em caso de d�vida, nos contratos gratuitos deve prevalecer o sentido da declara��o menos gravoso para o disponente.

Dir-se-�, finalmente, que, a vingar a tese dos recorrentes, o comodat�rio ficaria numa posi��o bem mais s�lida e favor�vel do que se tivesse, por exemplo, celebrado um contrato de arrendamento (cf., quanto � dura��o do contrato de loca��o o art. 1025�, do CC), solu��o que, salvo o devido respeito, a ordem jur�dica n�o poderia tolerar.

Dito isto, retornemos ao caso dos autos.

Decorre dos factos provados que a casa foi cedida ao r�u, gratuitamente, para sua habita��o (finalidade que, mesmo que n�o tivesse sido convencionada pelos outorgantes, sempre resultaria do art. 1131�, do CC), e sem indica��o de prazo certo para a restitui��o.

Sendo assim, a restitui��o do im�vel que � pedida nesta a��o mostra-se regulada pelo n�2, do art. 1137�, do CC, norma que visa precisamente impedir a perpetua��o das rela��es obrigacionais de comodato para as quais n�o tenha sido fixado prazo de dura��o, nem determinado o uso da coisa.

Consequentemente, � de concluir que, n�o se estipulando prazo, nem se delimitando a necessidade temporal que o comodato visa satisfazer, o comodante (ou os seus sucessores ou a cabe�a de casal da heran�a aberta por �bito daquele) tem direito a exigir, em qualquer momento, a restitui��o do im�vel, denunciando o contrato, ao abrigo do disposto no n.� 2 do citado art.� 1137�, do CC.

Improcede, pois, o recurso.

***

IV – Decis�o

10. Nestes termos, negando provimento ao recurso, acorda-se em confirmar o ac�rd�o recorrido.

Custas pelos recorrentes.

Lisboa, 21 de Mar�o de 2019

Maria do Ros�rio Morgado (Relatora)

Jos� Sousa Lameira

H�lder Almeida

______________


[1] Cf. Rodrigues Bastos, in Notas ao C�digo Civil, Vol. IV, Almedina, p�gs. 242-243; Antunes Varela, RLJ, ano 119�, n�s 3747 e 3748 e Menezes leit�o, Direito das Obriga��es, Vol. II, Contratos em Especial, 11� edi��o, p�gs. 361 e ss.
[2] Ob. cit., p�gs. 251-252.
[3] Cf., neste sentido, entre muitos outros, os ac�rd�os do STJ de 13.5.2003, revista n.� 1323/03, Relator: Silva Salazar; de 27.5.2008, revista n.� 1071/08, Relator: Alberto Sobrinho; 31-03-2009 ; de 31.3.2009, revista n.� 359/09, Relator: Pereira da Silva;� de 16.11.2010, revista n.� 7232/04.0TCLRS.L1.S1, Relator: Alves Velho, dispon�veis in www.dgsi.pt.

Como reaver imóvel dado em comodato?

- No contrato de comodato, ainda que verbal, por prazo indeterminado, o comodante somente estará habilitado a retomar o imóvel, mediante ação reivindicatória, se antes constituir em mora o comodatário, através de noti- ficação premonitória, em que se justificariam os motivos do pedido e a vontade de desocupação do ...

Pode o comandante pedir a restituição do bem concedendo prazo ao Comodatário para sua desocupação?

Diante dessa situação pergunta-se: a) Pode o comodante pedir a restituição do bem concedendo prazo ao comodatário para sua desocupação? Explique sua resposta. Sim, como explica o art. 581, primeira parte, do CC, que “se o comodato não tiver prazo convencional, presumir-se-lhe-á o necessário para o uso concedido”.

O que diz o artigo 579 do Código Civil?

579. O comodato é o empréstimo gratuito de coisas não fungíveis. Perfaz-se com a tradição do objeto. No comodato, temos a característica de ser um empréstimo de uso, uma vez que, por se tratar de coisa infungível e inconsumível, o bem emprestado deve ser restituído ao término do contrato.

Quais as benfeitorias que o comodatário poderá cobrar do comodante?

BENFEITORIAS ERIGIDAS POR COMODATÁRIO. É CERTO QUE O COMODATÁRIO NÃO PODE RECOBRAR DO COMODANTE AS DESPESAS NORMAIS, NECESSÁRIAS, INDISPENSÁVEIS, FEITAS COM O USO E GOZO DA COISA EMPRESTADA. OBSERVE-SE, É IMPORTANTE REITERAR: DESPESAS NORMAIS, NECESSÁRIAS E INDISPENSÁVEIS. NÃO, PORÉM, DESPESAS EXTRAORDINÁRIAS.