Quais são os critérios para fixação das regras de competência da Justiça do Trabalho no Brasil

18/02/21 - A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho decidiu que é da Vara do Trabalho de Brasília a competência para julgar ação ajuizada por um técnico de manutenção hospitalar de Águas Lindas (GO) contratado, por meio da internet, pela Engebio Nordeste. Os exames admissionais ocorreram em Brasília (DF), o contrato foi firmado em Recife (PE) e a prestação de serviços se deu em Natal (RN). Ao analisar o conflito de competência suscitado pela Vara de Currais Novos (RN), o relator, ministro Evandro Valadão, disse que é preciso considerar a “realidade fenomênica do mundo atual” na aplicação da regra de competência territorial.

Conflito negativo

De acordo com o artigo  651 da CLT, a competência territorial para julgar a ação é determinada pela localidade onde o empregado prestou serviços ao empregador. Todavia, se o local de prestação de serviço for diferente do local de contratação, ambos os foros serão competentes, cabendo ao empregado a escolha. No caso do técnico, tanto a Vara do Trabalho de Brasília quanto a de Currais Novos se declararam incompetentes, surgindo o chamado conflito negativo de competência. Como as varas estão vinculadas a Tribunais Regionais diferentes, a declaração de competência deve ser resolvida pelo TST.

Site de empregos

Na ação trabalhista, ajuizada em abril de 2019, o técnico, ao justificar a escolha do foro de Brasília, disse que, apesar de ter firmado o contrato de trabalho em Recife e ter prestado serviço em Santa Cruz (RN), sua pré-contratação ocorreu em Brasília, por meio do site de empregos Indeed. Para o empregado, a escolha, pela empresa, dessa modalidade de seleção e contratação não pode acarretar prejuízo ao acesso à justiça.

Extinção do processo

Por sua vez, a empregadora afirmou que a relação de emprego sempre ocorrera em Santa Cruz e que o contrato fora firmado em Recife, onde está sediada. Disse, ainda, que a busca da vaga pelo empregado se deu por intermédio do site especializado em contratações, ou seja, sem busca ativa da empresa. Por isso, pediu a extinção do processo por incompetência territorial.

Acesso à justiça

O juízo da 7ª Vara do Trabalho de Brasília remeteu o caso à Vara do Trabalho de Currais Novos, cuja jurisdição abrange o Município de Santa Cruz. Esse juízo, por sua vez, ponderou que o técnico residia em Águas Lindas quando foi contratado. Nesse cenário, aplicar, sem restrições, o artigo 651 tolheria o acesso do empregado ao Judiciário, pois a exigência de comparecer a Currais Novos demandaria grande despesa com deslocamento e hospedagem. Remeteu, então, o caso ao TST.

Conjuntura disruptiva

O relator do conflito de competência, ministro Evandro Valadão, lembrou que, em razão dos avanços tecnológicos, os conceitos de espaço e tempo, no processo de contratação, foram relativizados. “As normas do processo do trabalho constantes da CLT muitas vezes mostram-se insuficientes como instrumento de operacionalização do direito, por evidente descompasso ou não aderência à realidade fenomênica do mundo atual, do avanço tecnológico, das empresas virtuais, enfim, de uma conjuntura disruptiva”, afirmou.

Segundo o ministro, com a amplitude territorial do país, os novos meios de comunicação, a facilidade de trânsito e de acesso a pessoas e lugares e, também, a elevada taxa de desemprego, pessoas passaram a se deslocar entre cidades e estados à procura de emprego, e empresas passaram a contratar, operar e se estabelecer em lugares distintos. O Direito tem o dever de acompanhar a modernização do modo de vida, decorrente da tecnologia, onde relações de trabalho são forjadas de maneira virtual, sem que sequer o empregador reconheça a fisionomia do empregado”, afirmou.

Na avaliação do relator, não é razoável condicionar o exercício do direito de ação do empregado contratado pela internet, que fez exames em Brasília, firmou contrato em Recife e prestou serviços em Santa Cruz, ao deslocamento de centenas de quilômetros até a comarca de Currais Novos. "À luz do princípio da razoabilidade na ponderação entre os postulados do acesso à justiça e da ampla defesa, a declaração da competência territorial da 7ª Vara do Trabalho de Brasília é medida que se impõe”, concluiu.

(RR/CF)

Processo:  CCCiv-232-81.2019.5.21.0019

A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais é formada por 10 ministros, com quorum mínimo de seis ministros. Entre as atribuições da SDI-2 está o julgamento de ações rescisórias, mandados de segurança, ações cautelares, habeas corpus, conflitos de competência, recursos ordinários e agravos de instrumento.

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1. Do conceito de competência

Diante da multiplicidade de confiitos existentes na sociedade, houve necessidade de se criarem critérios para que os confiitos fossem distribuídos de forma uniforme aos juízes a fim de que a jurisdição pudesse atuar com maior efetividade e também propiciar ao jurisdicionado um acesso mais célere e efetivo à jurisdição. Em razão disso, foi criado um critério de distribuição da jurisdição entre os diversos juízes, que é a competência1.

Como adverte Piero Calamandrei2: "A competência é acima de tudo uma determinação dos poderes judiciais de cada um dos juízes. [...] Perguntar qual é a competência de um juiz equivale, por conseguinte, a perguntar quais são os tipos de causas sobre as quais tal juiz é chamado a prover."

Ensina Carnelutti3: "O instituto da competência tem origem na distribuição do trabalho entre os diversos ofícios judiciais ou entre seus diversos componentes. Já que o efeito de tal distribuição se manifesta no sentido de que a massa das lides ou negócios se dividia em tantos grupos, cada um dos quais é designado a cada um dos ofícios, a potestade de cada um deles se limita praticamente às lides ou aos negócios compreendidos pelo mesmo grupo. Portanto, a competência significa a pertinência a um ofício, a um oficial ou a um encarregado de postestade a respeito de uma lide ou de um negócio determinado; naturalmente, tal pertinência é um requisito de validade do ato processual, em que a potestade encontra seu desenvolvimento."

Como destaca Athos Gusmão Carneiro4: "Todos os juízes exercem jurisdição, mas a exercem numa certa medida, dentro de certos limites. São, pois ‘competentes’ somente para processar e julgar determinadas causas. A ‘competência’, assim, ‘é a medida da jurisdição’, ou ainda, é a jurisdição na medida em que pode e deve ser exercida pelo juiz."

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Na feliz síntese de Mário Guimarães5: "A jurisdição é um todo. A competência uma fração. Pode um juiz ter jurisdição sem competência. Não poderá ter competência sem jurisdição."

Para melhor aparelhamento da atividade jurisdicional, a jurisdição foi separada em partes, ou seja: em matérias. Desse modo, cada ramo do Poder Judiciário julgará determinadas matérias, a fim de que a atividade jurisdicional de aplicação do direito possa ser efetivada com eficiência e qualidade. Em razão disso, todo juiz possui jurisdição, mas nem todo juiz possui competência.

Chiovenda6 enumerou três critérios para distribuição da competência, que infiuenciaram o ordenamento jurídico brasileiro. São eles:

  1. critério objetivo;

  2. critério funcional;

  3. critério territorial.

Segundo Chiovenda7, "o critério objetivo ou do valor da causa (competência pelo valor) ou da natureza da causa (competência por matéria). O critério extraído da natureza da causa refere-se, em geral, ao conteúdo especial da relação jurídica em lide [...] o critério funcional extrai-se da natureza especial e das exigências especiais das funções que se chama o magistrado a exercer num processo [...] o critério territorial relaciona-se com a circunscrição territorial designada à atividade de cada órgão jurisdicional."

Há um certo consenso na doutrina processual brasileira de que os critérios da competência são:

  1. competência em razão da natureza da relação jurídica (competência em razão da matéria ou objetiva): nesta espécie, é determinante a natureza da relação jurídica controvertida para aferição da competência. Na Justiça do Trabalho, a competência material vem disciplinada no art. 114 da CF e também no art. 652 da CLT;

  2. em razão da qualidade das partes envolvidas na relação jurídica controvertida (competência em razão da pessoa):

    Como destaca Cândido Rangel Dinamarco8: "Certas qualidades das pessoas litigantes são levadas em conta pela Constituição e pela lei, muitas vezes na fixação das regras da chamada competência em razão da pessoa (ratione personae)." Como

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    veremos no item "Competência Material da Justiça do Trabalho brasileira após a EC n. 45/04 e competência em razão da pessoa", a Constituição Federal manteve algumas hipóteses de competência em razão da pessoa na Justiça do Trabalho;

  3. competência em razão do lugar (competência territorial): conforme Patrícia Miranda Pizzol9, "a expressão competência territorial se deve à necessidade de fixar um juiz entre a pluralidade de outros da mesma espécie ou com o mesmo grau de jurisdição, atribuindo-se a ele uma porção territorial, dentro da qual está sua sede." No Processo do Trabalho, a competência territorial vem disciplinada no art. 651 da CLT, sendo a regra geral o local da prestação de serviços;

  4. em razão do valor da causa: a competência em razão do valor leva em consideração o montante pecuniário da pretensão, ou seja, o valor do pedido. É relativa à luz do Código de Processo Civil. No Processo do Trabalho, o valor dos pedidos serve para determinar o rito processual, isto é, se até dois salários mínimos, o rito será sumário (Lei n. 5.584/70); de 2 a 40 salários mínimos, o rito será o sumaríssimo (Lei n. 9.957/00) e rito ordinário (acima de 40 salários mínimos);

    Na Justiça do Trabalho, por não existirem órgãos especiais destinados a demandas de pequenas causas, como acontece nos juizados especiais cíveis e criminais (estaduais e federais), o valor da causa não determina a competência do órgão jurisdicional, pois tanto as causas sujeitas ao rito ordinário como ao sumaríssimo são processadas pelo mesmo órgão jurisdicional;

  5. em razão da hierarquia dos órgãos judiciários, também denominada de competência interna ou funcional. Segundo destaca Patrícia Miranda Pizzol, a competência funcional se dá em razão da "natureza e exigências especiais das funções exercidas pelo juiz no processo"10. No Processo do Trabalho, a competência funcional vem disciplinada na CLT e também nos Regimentos Internos dos TRTs e TST.

    As competências em razão da matéria, da pessoa e funcionais são absolutas. Portanto, o juiz delas poderá conhecer de ofício, não havendo preclusão para a parte ou para o juiz, podendo a parte invocá-la antes do trânsito em julgado da decisão.

    A competência em razão do território é relativa, devendo a parte invocá-la por meio de exceção de incompetência. Caso não invocada pela parte no momento processual oportuno, prorroga-se a competência.

    Quanto à competência em razão do valor, já está sedimentado em doutrina e também no art. 63 do CPC, que ela é relativa, entretanto, se ela determina o rito processual, como o sumaríssimo, tem dito a doutrina ser ela absoluta. No Processo do Trabalho, como já nos pronunciamos, não há competência em razão do valor da causa.

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    Nesse sentido, dispõe o art. 63 do CPC:

    As partes podem modificar a competência em razão do valor e do território, elegendo foro onde será proposta ação oriunda de direitos e obrigações.

2. Competência material da Justiça do Trabalho brasileira após a EC n 45/04 e competência em razão da pessoa

Depois de longa tramitação no Congresso Nacional, foi aprovada a Emenda de Reforma do Judiciário (EC n. 45, de 8 de dezembro de 2004)...

Quais os critérios de fixação de competência na Justiça do Trabalho?

Competência Territorial da Justiça do Trabalho A competência das Varas do Trabalho é determinada pela localidade que o empregado, reclamante ou reclamado, prestar serviços ao empregador, ainda que tenha sido contratado noutro local ou no estrangeiro.

Quais são os quatro critérios de competência para definição do órgão jurisdicional para julgamento de uma causa?

Existem alguns critérios básicos para a fixação da competência, os principais são: soberania nacional, o da hierarquia e atribuições dos órgãos jurisdicionais (critério funcional), o da natureza ou valor da causa e o das pessoas envolvidas no litígio (critério objetivo), e os dos limites territoriais que cada órgão ...

Quais os critérios para determinação da competência previstos no ordenamento jurídico brasileiro?

Para se fixar a competência interna devem ser empregados três critérios: objetivo, funcional e territorial. O critério objetivo fixa a competência em razão do valor da causa ou da sua natureza, sendo previstos nos arts. 91 e 92 do CPC.

Qual a regra para a determinação da competência em razão do lugar no processo trabalhista?

A regra para definição da competência em razão do lugar encontra-se no artigo 651 da CLT. De acordo com referido dispositivo a competência em razão do lugar, na Justiça do Trabalho, em regra, se dá no local da prestação dos serviços.

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