Por que a redução da atividade da água auxilia no processo de conservação do alimento?

A água é um dos principais constituintes estruturais de uma célula, ou seja, é fundamental para o funcionamento de quaisquer metabolismos, dessa forma e consequentemente é primordial para a manutenção de qualquer meio de vida, seja vida macroscópica e ou microscópica. Uma das principais funções da água é estabilizar a temperatura e dar condições para o crescimento ou a proliferação de qualquer organismo, uma vez que é fundamental para proporcionar o transporte de alimentos e nutrientes, além de ser fundamental também para a excreção do que não foi absorvido pelo organismo.

A presença de água nos alimentos é fundamental, pois água dá o alimento sabor, textura, aroma, entre outras características dependendo de cada alimento, contudo apesar de notável contribuição principalmente das características sensoriais do produto, a água pode ser considerada também de certa forma um vilão, uma vez que é percebido não só aos profissionais que atuam diretamente na área de alimentos, mas também aos consumidores de uma forma geral, que os alimentos com maior atividade de água (Aw) tendem a se deteriorar mais rápido que os alimentos com baixa Aw.

A água presente no alimento é representada pela umidade contida no mesmo, e é sabido que essa umidade presente influenciará as condições do alimento de acordo com o que o tempo de produção do alimento passe. Contudo não podemos dizer que a Aw tem a responsabilidade exclusiva da deterioração do alimento, outros fatores como potencial hidrogeniônico (pH), a presença de oxigênio, a capacidade de movimentação da água, além de outros solutos podem influenciar na conservação dos alimentos.

Alguns alimentos, como o leite, possuem naturalmente em sua composição microrganismos que afetam a sua condição de consumo com o passar do tempo, deteriorando o mesmo, além de oferecer outros danos ao alimento:

  1. Desenvolvimento e proliferação de microrganismos deteriorantes;
  2.  Desenvolvimento e proliferação de microrganismos patógenos;
  3. Alterações das características sensoriais dos alimentos;
  4. Menor tempo de prateleira dos alimentos e consequente menor disponibilidade de alimentos em determinadas regiões e épocas do ano.

Com isso ao longo dos anos a humanidade busca uma série de alternativas e métodos para estabilizar a atividade de água nos alimentos e estender o tempo de prateleira dos mesmos. Sendo as mais conhecidas e tradicionais:

  1.  Conservação por calor;
  2.  Remoção do calor ou conservação por frio;
  3.  Outras: salga, adição de açúcar, fermentação, liofilização, irradiação, concentração, evaporação, defumação, embalagem e armazenamento em atmosfera controlada e modificada, adição de conservantes, dentre outros. Com isso as industrias tendem a explorar opções tecnológicas para a produção de alimentos estáveis.

Buscando atingir e superar de forma sustentável um dos maiores desafios da indústria de alimentos, que é a conservação mais adequada para cada tipo de alimento, de forma que preserva o mais próximo possível as características físico-químicas, microbiológicas e sensoriais de um alimento fresco, buscando assim encantar os consumidores, não só pela qualidade do produto, mas também pela segurança do produto, preço competitivo e produtos inovadores.

Tendo em vista esse desafio, surgiu o processo de liofilização de alimentos cujo principal objetivo é a diminuição da Aw nos alimentos visando a estabilização e o retardamento de sua deterioração natural através de um fluxograma de processos minuciosos, que garantem a manutenção da forma original do alimento.

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Quando falamos em segurança e qualidade de alimentos, existem duas medidas críticas que todos os fabricantes devem conhecer:

  • Teor de Umidade;
  • Atividade de Água.

Ambas as medições podem parecer a mesma coisa, mas não são! Elas são medidas para dois propósitos diferentes, e cada uma mostra conceitos próprios sobre rendimento, qualidade e segurança dos alimentos.

Meu objetivo aqui não é dar uma aula ou fazer uma revisão bibliográfica sobre o assunto, mas elucidar do ponto de vista prático. Este post irá abordar as diferenças e a importância de cada medição:

TEOR DE UMIDADE

Após um processo padronizado de secagem do alimento, podemos definir:

Umidade (%) = [(Pi – Pf) / Pi] × 100

Onde:

  • Pi = Peso inicial da amostra;
  • Pf = Peso final da amostra.

O teor de umidade é a medida da quantidade total de água contida num alimento (água total), e é geralmente expresso como uma porcentagem (%) do peso total. É uma das medidas analíticas mais importantes, sendo utilizada no processamento e testes de produtos alimentícios, tendo importância direta para:

  1. Processador e consumidor;
  2. Qualidade do alimento;
  3. Estabilidade do alimento;
  4. Uniformidades de resultados;
  5. Valor nutritivo e
  6. Especificações de padrões de identidade e qualidade do produto.

Como o custo da matéria prima é baseado no peso, algumas vezes os fabricantes tentam usar água adicional para obter lucros ilícitos. Em alimentos líquidos, quanto maior for o teor de umidade padrão do alimento, maior a chance de o produto ser fraudado, isto é, temos fraude com adição de água no leite, mas não na farinha de trigo por exemplo.

ATIVIDADE DE ÁGUA (Aw)

Enquanto o teor de umidade simplesmente define a quantidade de água nos alimentos e ingredientes, a atividade de água, em termos práticos, é uma medida que permite avaliar a disponibilidade de água no alimento que estaria susceptível a diversas reações (químicas, enzimáticas) ou para uso dos microrganismos presentes. Quanto mais elevada for a atividade da água, mais rapidamente os microrganismos (como bactérias, leveduras e bolores) poderão se multiplicar. A importância da Aw está na sua relação com a conservação dos alimentos.

Primeiramente, preciso citar as três formas de apresentação da água nos alimentos propostas por Labuza (1970):

  • Água livre (disponível ou não ligada);
  • Água adsorvida (hidratada);
  • Água ligada.

Água livre – está presente nos espaços intergranulares e entre os poros do material. É eliminada com facilidade. Atua como meio de dispersão e nutriente para o crescimento de microrganismos ou reações químico-enzimáticas.

Água adsorvida – uma parte da água que está adsorvida como uma camada muito fina nas superfícies internas e externas dos coloides macromoleculares (amidos, pectinas, celuloses e proteínas) por meio de Força de Van der Waals e formação de ligação hidrogênio.

Água ligada – está combinada quimicamente com outras substâncias. Este tipo de água não é utilizada como solvente, não permite o desenvolvimento de microrganismos e é difícil de ser eliminada.

Figura: Desenho esquemático dos tipos de água nos alimentos

Por que a redução da atividade da água auxilia no processo de conservação do alimento?

Fonte: Google imagens

Para melhorar a estabilidade dos alimentos, a água livre pode ser reduzida através do congelamento, concentração, desidratação parcial ou adição de açúcar ou sal.

O crescimento e a atividade metabólica dos microrganismos precisam de água em forma disponível. A medida mais comumente empregada para expressar a estabilidade de um produto é a determinação do nível de água em sua forma livre, que em alimentos, denomina-se Índice de Atividade de Água, Aw, que é determinada pela fórmula: Aw = P/P0. Define-se a Aw, portanto, como a relação existente entre a pressão de vapor de água de uma solução (ou de um alimento) (P) e a pressão de vapor da água pura (P0) à mesma temperatura.

Nossa mente está condicionada a achar que um produto com elevada atividade de água terá elevado teor de umidade ou o contrário (baixo/baixo). Isto muitas vezes ocorre, todavia é possível, por exemplo, um produto apresentar baixo teor de umidade e alto ou médio valor de atividade de água, como é o caso do pão.

Observe a tabela abaixo:

Por que a redução da atividade da água auxilia no processo de conservação do alimento?

Observação: Aw varia numericamente de 0 a 1

O teor de umidade (água total) do pão é baixo (40%), enquanto sua Aw (água livre) é alta (0,96). Quando comparamos as atividades de água do pão com a da geleia, 0,96 e 0,86, respectivamente, nota-se que a disponibilidade de água para crescimento microbiano no pão é maior.

Outra comparação interessante é entre a carne fresca e o pão. Embora o teor de umidade da carne fresca (70) seja maior do que o teor no pão (40), ambas possuem um valor de Aw muito próximo (carne fresca = 0,985 vs pão = 0,96).

Valores de atividade de água entre 0 e 0,20 indicam que a água está fortemente ligada, enquanto valores de atividade de água na faixa de 0,70 a 1,00 indicam que a maioria da água encontra-se livre, sendo esta passível de ser utilizada em reações químicas, enzimáticas e para o desenvolvimento de microrganismos.

Medir a atividade de água nos alimentos é importante para:

  1. Prever o desenvolvimento microbiano;
  2. Avaliar as reações químicas e vida de prateleira;
  3. Avaliar a estabilidade física;
  4. Projetar a embalagem – proteção contra umidade ambiente;
  5. Analisar a transferência de umidade entre ingredientes;
  6. Considerar o intercâmbio de umidade com o meio ambiente;
  7. Predizer a curva de isoterma – Umidade vs Aw.

Tratando-se de Segurança de Alimentos, é pertinente apresentar os valores mínimos de Aw para o crescimento e produção de toxina de patógenos de importância alimentar, conforme tabela abaixo:

Por que a redução da atividade da água auxilia no processo de conservação do alimento?

O comportamento microbiano frente à Aw quanto à disponibilidade de água livre é extremamente variável, sendo as bactérias mais exigentes, em relação aos fungos e as leveduras. Os alimentos de baixa atividade de água (< 0,60) são microbiologicamente estáveis.

Conclusão

A atividade de água pode ser utilizada como parâmetro de controle de qualidade, mostrando valores efetivos da disponibilidade da água no alimento para participar de reações de deterioração,  enzimáticas e microbiológicas, sendo que estes fatores podem afetar diretamente a qualidade sensorial ou sanitária do alimento. Já o teor de umidade está mais associado ao rendimento e qualidade sensorial (ex: crocância de um alimento).

Referências Bibliográficas:

CECCHI, H. M. Fundamentos teóricos e práticos em análise de alimentos. 2. ed. Campinas: editora da Unicamp, p. 2003. 207.

DAMODARAN, S.; PARKIN, K.L.; FENNEMA, O.R. Química de Alimentos de Fennema. 4ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2010.

INSTITUTO ADOLFO LUTZ. Normas Analíticas do instituto Adolfo Lutz. v. 1: Métodos químicos e físicos para análise de alimentos, IV. ed. São Paulo: IMESP, p.98-99, 2005.

LABUZA, T. P.; TANNEMBAUM, S. R.; KAREL, M. Water content and stability of lowmoisture and intermediate-moisture foods. Food Technology. p .543-550, 1970.

Visualização da postagem 51.253

O que reduz a atividade de água de um alimento?

Para reduzir a atividade de água em alimentos, podemos aumentar a concentração de solutos na fase aquosa do alimento, tanto pela remoção de água quanto pela adição de solutos.

Por que e importante medir a atividade de água nos alimentos?

A água representa um dos nutrientes mais importantes na produção animal, pois é ela quem vai realizar o transporte de substâncias entre as células, retirar moléculas tóxicas, estabilizar a temperatura corporal e participar de reações químicas e enzimáticas no alimento produzido.

Como a redução da temperatura auxilia na conservação de alimentos?

Além de preservar, para não estragar, o frio atua em outro ponto: preserva características sensoriais do alimento, tais como: gosto, odor, textura e aparência. Isso porque alimentos podem ser congelados pré-cozidos ou até mesmo prontos, bastando para isso que algumas regras sejam observadas.

Quais os efeitos da variação da atividade de água nos alimentos?

Alimentos com índices altos de atividade de água, fornecem substrato para multiplicação de microrganismos patogênicos, gerando perdas significativas na qualidade e comprometendo a segurança dos alimentos (BTA ADD INOVATION; 2020).