O sucesso da União Europeia em níveis de integração mencionado pelo autor

PREFÁCIO

A ordem jurídica subjacente à União Europeia (UE) faz parte integrante da nossa realidade política e social. Todos os anos, os Tratados da União estão na origem de milhares de decisões que influenciam decisivamente os Estados-Membros da UE e a vida dos seus cidadãos. Há muito que os indivíduos deixaram de ser meros cidadãos do seu país, cidade ou distrito, são também cidadãos da União. Ora, é por isso de grande relevância que estejam também informados acerca de uma ordem jurídica que determina a sua vida quotidiana. A compreensão da UE no seu conjunto, e da sua ordem jurídica, não parece facilmente acessível ao cidadão comum. Parte da dificuldade reside, desde logo, nos próprios textos dos Tratados, que são, por vezes, pouco claros e cujo alcance é difícil de apreender. Para além disto, há a singularidade de muitos dos conceitos com que os Tratados procuram gerir situações novas e pouco habituais. Como tal, as páginas seguintes são uma tentativa de dar a conhecer aos cidadãos interessados a estrutura da União e os pilares da ordem jurídica europeia.

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

BCE Banco Central Europeu
CE Comunidade Europeia
CECA Comunidade Europeia do Carvão e do Aço
CEDH Convenção Europeia dos Direitos do Homem
CEE Comunidade Económica Europeia
CEEA Comunidade Europeia da Energia Atómica
EFTA Associação Europeia de Comércio Livre
EP Parlamento Europeu
MEE Mecanismo Europeu de Estabilidade
NATO Organização do Tratado do Atlântico Norte
OCDE Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económicos
TG Tribunal Geral
TUE ou Tratado UE Tratado da União Europeia
TFUE Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia
TJUE Tribunal de Justiça da União Europeia
UE União Europeia
UEO União da Europa Ocidental

DE PARIS A LISBOA VIA ROMA, MAASTRICHT, AMESTERDÃO E NICE

Até pouco depois do fim da Segunda Guerra Mundial, o funcionamento do Estado e a vida política dos nossos países assentavam ainda, quase exclusivamente, nas constituições e leis nacionais. Foi nesta base que se criaram regras de conduta vinculativas, não apenas para os cidadãos e para os partidos nos nossos estados democráticos, mas também para o Estado e para os seus órgãos. Foi preciso o colapso total da Europa e o declínio económico e político do Velho Continente para se lançar as bases da renovação e para que a ideia de uma nova ordem europeia ganhasse uma renovada dinâmica.

Na sua globalidade, os esforços de unificação europeia criaram uma mistura desconcertante de organizações complexas e difíceis de apreender. Assim, coexistem sem grandes ligações entre si organizações como a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económicos), a NATO (Organização do Tratado do Atlântico Norte), o Conselho da Europa e a União Europeia.

Esta panóplia de organizações só adquire uma estrutura lógica quando olhamos para os seus objetivos específicos. Estas organizações podem ser divididas em três grupos principais.

Primeiro grupo: as organizações euroatlânticas

As organizações euroatlânticas resultam da aliança concluída após a Segunda Guerra Mundial entre os Estados Unidos da América e a Europa. Não é, pois, um mero acaso que a primeira organização europeia do pós-guerra, a OECE (Organização Europeia de Cooperação Económica), fundada em 1948, tenha sido criada por iniciativa dos Estados Unidos. O então secretário de Estado norte-americano George Marshall fez um apelo aos países da Europa, em 1947, para que unissem forças na reconstrução das suas economias e prometeu apoio americano. Este apoio veio sob a forma do Plano Marshall, que serviu de base à rápida reconstrução da Europa Ocidental. A primeira missão da OECE consistiu essencialmente na liberalização das trocas comerciais entre os países. Em 1960, os países membros da OECE, aos quais entretanto se tinham juntado o Canadá e os Estados Unidos, decidiram alargar o campo de ação da organização à ajuda aos países do Terceiro Mundo. A OECE tornou-se então a OCDE (Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económicos), que conta atualmente com 35 membros.

7 de maio de 1948, Haia

Winston Churchill é calorosamente recebido no Congresso da Europa. O antigo primeiro-ministro britânico, na altura líder da oposição, presidiu à sessão inaugural do congresso. No dia 19 de setembro de 1946, aquando do seu discurso em Zurique, apelara à unidade europeia.

A criação da OECE foi seguida, em 1949, pela da NATO, sob forma de uma aliança militar com o Canadá e os Estados Unidos. O objetivo da NATO é a defesa coletiva e o apoio coletivo. Esta organização foi concebida como parte de uma cintura de segurança global para travar a influência soviética. Após a queda da «cortina de ferro», em 1989, e a subsequente dissolução da União Soviética, a organização tem vindo, cada vez mais, a chamar a si tarefas como a gestão de crises e a promoção da estabilidade. A NATO conta com 28 países membros, sendo eles 22 Estados-Membros da UE (não incluídos a Áustria, Chipre, a Finlândia, a Irlanda, Malta e a Suécia), a Albânia, o Canadá, os Estados Unidos, a Islândia, a Noruega e a Turquia. A UEO (União da Europa Ocidental) foi instituída em 1954, com o intuito de reforçar a colaboração em matéria de política de segurança entre os países europeus. A UEO marcou o início do desenvolvimento de uma política de segurança e defesa na Europa. No entanto, o seu papel não foi ampliado porque a maioria das suas competências foi transferida para outras instituições internacionais, sobretudo a NATO, o Conselho da Europa e a UE. Consequentemente, a UEO foi dissolvida em 30 de junho de 2011.

Segundo grupo: o Conselho da Europa e a OSCE

As organizações europeias que integram o segundo grupo caracterizam-se por uma estrutura que possibilita a cooperação do maior número possível de países, tendo sido deliberadamente acordado que estas organizações não iriam mais além da cooperação tradicional entre Estados.

Deste grupo faz parte o Conselho da Europa, organização política fundada em 5 de maio de 1949, que conta atualmente com 47 membros, incluindo todos os atuais Estados-Membros da UE. Os estatutos do Conselho da Europa não fazem qualquer referência à criação de uma federação ou de uma união, nem preveem qualquer transferência ou exercício em comum de partes da soberania nacional. Todas as decisões sobre questões importantes são tomadas por unanimidade, o que significa que qualquer país tem poder de veto. O Conselho da Europa foi, pois, concebido como um organismo de cooperação internacional.

Declaração Schuman de 9 de maio de 1950 na sala do relógio do Ministério francês dos Negócios Estrangeiros, em Quai d’Orsay, Paris. O ministro francês dos Negócios Estrangeiros, Robert Schuman, propôs que a indústria europeia do carvão e do aço se unisse para criar a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço. Acreditava-se que, após a criação desta comunidade, uma guerra entre os países participantes seria impensável, até mesmo materialmente impossível.

A ele se deve a conclusão de inúmeras convenções em domínios como a economia, a cultura, a política social e o direito. O exemplo mais importante e mais conhecido é o da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (CEDH), assinada em 4 de novembro de 1950, sendo que os 47 membros do Conselho são atualmente partes da Convenção. Na prática, a Convenção permitiu instaurar nos países signatários não apenas um nível mínimo mais significativo de proteção dos direitos humanos, mas também um sistema de garantias jurídicas que habilitam os órgãos instituídos em Estrasburgo pela Convenção, a saber, a Comissão Europeia dos Direitos do Homem e o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, a condenar quaisquer violações da Convenção dos Direitos do Homem nos países signatários.

Deste grupo faz ainda parte a Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa (OSCE), instituída em 1994 e saída da Conferência para a Segurança e a Cooperação na Europa (CSCE). A OSCE, que conta atualmente com 57 estados participantes, está vinculada aos princípios e objetivos consagrados na Ata Final de Helsínquia (1975) e na Carta de Paris (1990), dos quais fazem parte, designadamente, a promoção de medidas geradoras de confiança entre os países europeus e a criação de uma «rede de segurança» para a resolução pacífica dos conflitos.

Terceiro grupo: a União Europeia

O terceiro grupo de organizações europeias é constituído pela União Europeia (UE). A UE distingue-se das tradicionais associações entre estados por um aspeto fundamental: reúne países que renunciaram a uma parte da respetiva soberania em favor da UE, tendo conferido a esta última poderes próprios e independentes dos Estados-Membros. O exercício destes poderes confere à UE competências para adotar legislação europeia de efeito equivalente aos atos nacionais.

A primeira pedra da construção da União Europeia foi lançada pelo então ministro francês dos Negócios Estrangeiros, Robert Schumann, com a sua Declaração de 9 de maio de 1950, em que apresentou um projeto elaborado conjuntamente com Jean Monnet para a unificação da indústria europeia do carvão e do aço numa Comunidade Europeia do Carvão e do Aço. Tratou-se de uma iniciativa histórica a favor de uma «Europa organizada e viva», que é «indispensável à civilização» e sem a qual a «paz no mundo não seria salvaguardada».

O «plano Schuman» tornou-se uma realidade com a conclusão do Tratado que institui a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA), que foi assinado a 18 de abril de 1951 pelos seis estados fundadores (Bélgica, França, Itália, Luxemburgo, Países Baixos e República Federal da Alemanha) em Paris (Tratado de Paris), e entrou em vigor no dia 23 de julho de 1952. Esta Comunidade foi instituída por um período de 50 anos e, quando esse prazo previsto no Tratado fundador chegou ao seu fim, em 23 de julho de 2002, foi «integrada» na Comunidade Europeia. No seu seguimento, foram alguns anos mais tarde instituídas pelos Tratados de Roma de 25 de março de 1957 a Comunidade Económica Europeia (CEE) e a Comunidade Europeia da Energia Atómica (CEEA ou Euratom), que iniciaram as respetivas atividades com a entrada em vigor dos Tratados, em 1 de janeiro de 1958.

A criação da União Europeia pelo Tratado de Maastricht constituiu um novo marco no processo da união política europeia. Este Tratado, assinado em 7 de fevereiro de 1992 em Maastricht, mas que teve de vencer alguns obstáculos na fase de ratificação (foram precisos dois referendos na Dinamarca para a sua aprovação e na Alemanha foi interposto um recurso no Tribunal Constitucional contra a aprovação parlamentar do Tratado) até à sua entrada em vigor em 1 de novembro de 1993, definiu-se a si próprio como «uma nova etapa no processo de criação de uma união cada vez mais estreita entre os povos da Europa». O Tratado, embora incluísse o ato constitutivo da União Europeia, não concluía o processo. A União Europeia não substituiu as Comunidades Europeias, em vez disso, colocou-as ao lado das novas políticas e formas de cooperação. Daí os «três pilares» nos quais assenta a União Europeia. O primeiro pilar englobava as Comunidades Europeias: a CEE (rebatizada CE), a CECA (até 2002) e a Euratom. O segundo pilar englobava a cooperação entre os Estados-Membros ao abrigo da política externa e de segurança comum. O terceiro pilar abrangia a cooperação entre os Estados-Membros nos domínios da justiça e dos assuntos internos.

Foi dado um novo passo em frente com os Tratados de Amesterdão e Nice, entrados em vigor, respetivamente, em 1 de maio de 1999 e em 1 de fevereiro de 2003. O objetivo destas reformas dos Tratados era manter a capacidade de atuação da UE, mesmo numa União alargada a um número considerável de novos Estados-Membros. Por conseguinte, os dois Tratados centraram-se em reformas institucionais. Em comparação com reformas anteriores, a vontade política de aprofundamento da integração europeia era relativamente mais fraca.

As muitas críticas daí resultantes levaram a que se encetasse um debate sobre o futuro da UE e a sua configuração institucional. Daqui resultou a aprovação de uma Declaração sobre o futuro da União Europeia pelos chefes de Estado e de Governo, a 5 de dezembro de 2001, em Laeken (Bélgica). Nela, a UE comprometeu-se a tornar-se mais democrática, transparente e eficiente, assim como a abrir caminho a uma constituição. Como primeiro passo para a realização destes objetivos, confiou-se a elaboração de uma constituição europeia a uma convenção europeia, presidida pelo antigo presidente francês Valéry Giscard d’Estaing. O projeto do «Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa» elaborado pela convenção foi oficialmente apresentado ao presidente do Conselho Europeu em 18 de julho de 2003 e adotado, com várias alterações, pelos chefes de Estado e de Governo em 17 e 18 de julho de 2004, em Bruxelas.

Com esta constituição, a União Europeia e a Comunidade Europeia, até então existentes, deveriam dar lugar a uma nova e única União Europeia que teria como base um único Tratado Constitucional. Paralelamente, apenas a Comunidade Europeia da Energia Atómica deveria continuar a ter existência autónoma, devendo, no entanto — e tal como anteriormente — continuar a manter a estreita articulação com a nova União Europeia. Contudo, esta abordagem constitucional fracassou no processo de ratificação levado a cabo pelos Estados-Membros. Depois de ter obtido votações inicialmente positivas em 13 dos 25 Estados-Membros, o Tratado foi rejeitado nos referendos realizados em França (54,68% de votos contra, com uma participação de 69,34%) e nos Países Baixos (61,7% de votos contra, com uma participação de 63%).

Decorrido um período de reflexão de quase dois anos, foi possível, no primeiro semestre de 2007, apresentar um novo pacote de reformas. Este pacote de reformas abandonou formalmente o conceito de constituição europeia, segundo o qual todos os Tratados existentes seriam revogados e substituídos por um texto único designado por «Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa». Delineou-se, em vez disso, um Tratado Reformador que retomou toda a tradição das modificações de fundo introduzidas pelos Tratados de Maastricht, Amesterdão e Nice nos Tratados da UE existentes, no sentido de aumentar tanto a capacidade de atuação interna como externa da União, reforçar a legitimidade democrática e, de um modo geral, melhorar a eficiência da ação da UE. Mantendo a tradição, o nome deste Tratado Reformador adveio do local onde foi assinado: o Tratado de Lisboa. A elaboração do Tratado de Lisboa avançou de uma forma invulgarmente rápida, o que ficou sobretudo a dever-se ao facto de os próprios chefes de Estado e de Governo, nas conclusões do Conselho Europeu realizado em Bruxelas em 21 e 22 de junho de 2007, terem determinado em pormenor de que modo e com que alcance as alterações negociadas relativamente ao Tratado Reformador deviam ser incorporadas nos Tratados já existentes. Neste processo agiram de forma bastante atípica, não se limitando, como habitual, a tarefas genéricas, a aplicar subsequentemente, na prática, por uma Conferência Intergovernamental, tendo antes projetado eles próprios a estrutura e o conteúdo das modificações a introduzir, tendo inclusive redigido muitas vezes o texto exato de algumas disposições.

Neste contexto, foram particularmente controversos os limites das competências entre a UE e os Estados-Membros, a progressão da Política Externa e de Segurança Comum, o novo papel dos parlamentos nacionais no processo de integração, a inclusão da Carta dos Direitos Fundamentais no direito da União e os possíveis avanços no domínio da cooperação policial e judicial em matéria penal. A Conferência Intergovernamental convocada em 2007 viu, por isso, a sua própria margem de manobra muito reduzida e foi-lhe unicamente atribuída competência para aplicar tecnicamente as modificações pretendidas. Os trabalhos da Conferência Intergovernamental puderam assim ser concluídos a 18/19 de outubro de 2007, tendo recebido a aprovação política no Conselho Europeu informal que decorria simultaneamente em Lisboa.

O Tratado teve finalmente a sua assinatura solene no dia 13 de dezembro de 2007 pelos chefes de Estado e de Governo dos então 27 Estados-Membros da UE, reunidos em Lisboa (a adesão da Croácia à UE só aconteceu em 2013). No entanto, o processo de ratificação deste Tratado também viria a revelar-se particularmente difícil. Embora o Tratado de Lisboa tenha, ao contrário do Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa, ultrapassado os obstáculos à ratificação na França e nos Países Baixos, a ratificação veio a fracassar seguidamente na Irlanda, num primeiro referendo realizado em 12 de junho de 2008 (com 53,4% de votos contra e uma participação de 53,1%). Só depois de terem sido dadas algumas garantias jurídicas quanto ao alcance (limitado) do novo Tratado é que os cidadãos da Irlanda foram, em outubro de 2009, chamados a pronunciar-se num segundo referendo sobre o Tratado de Lisboa. Desta vez o Tratado recolheu uma ampla concordância por parte da população irlandesa (67,1%, com uma participação de 59%). O sucesso do referendo irlandês abriu também o caminho à ratificação do Tratado de Lisboa na Polónia e na República Checa. Na Polónia, o presidente Kacziński tinha feito depender a sua assinatura deste documento dos bons resultados do referendo irlandês. Também o presidente checo, Václav Klaus, quis primeiro aguardar o referendo irlandês e, além disso, ainda acabou por fazer depender a aceitação do instrumento de ratificação da garantia de que os chamados Decretos Beneš, de 1945, que excluíam quaisquer exigências territoriais relativas a antigos territórios alemães incorporados na República Checa, pudessem de algum modo ser afetados pelo Tratado de Lisboa, e sobretudo pela Carta dos Direitos Fundamentais introduzida no Tratado UE. Depois de também se ter encontrado uma solução para esta exigência, o presidente checo assinou, em 3 de novembro de 2009, o instrumento de ratificação, o que permitiu que se pudesse concluir com êxito o processo de ratificação, de modo a que o Tratado de Lisboa entrasse em vigor a 1 de dezembro de 2009.

Com o Tratado de Lisboa, a União Europeia e a Comunidade Europeia fundiram-se numa única União Europeia. A expressão «Comunidade» irá ser sistematicamente substituída pela expressão «União». A União substitui-se e sucede à Comunidade Europeia. Contudo, o direito da União continua a ser marcado pelos três Tratados que se seguem.

Tratados da UE atualmente em vigor

TRATADO DA UNIÃO EUROPEIA

O Tratado da União Europeia (Tratado UE ou «TUE») está dividido em seis títulos: «Disposições comuns» (I), «Disposições relativas aos princípios democráticos» (II), «Disposições relativas às instituições» (III), «Disposições relativas às cooperações reforçadas» (IV), «Disposições gerais relativas à ação externa da União e disposições específicas relativas à política externa e de segurança comum» (V) e «Disposições finais» (VI).

TRATADO SOBRE O FUNCIONAMENTO DA UNIÃO EUROPEIA

O Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (Tratado FUE ou TFUE) resulta do Tratado que institui a Comunidade Europeia. Segue essencialmente a estrutura do Tratado CE. As mudanças fulcrais são a ação externa da UE e a introdução de novos capítulos, sobretudo relativos à política energética, cooperação entre autoridades policiais e judiciárias em matéria penal, viagens aeroespaciais ou desporto e turismo.

O TUE e o TFUE têm o mesmo valor jurídico, pelo que nenhum é superior ao outro nem nenhum está subordinado ao outro. Esta clarificação jurídica é necessária porque o tipo de densidade regulamentar nos dois Tratados e o novo título do antigo Tratado CE (Tratado sobre o Funcionamento da UE) dão a sensação de que o TUE seria uma espécie de lei fundamental ou tratado fundador, ao passo que o TFUE parece ter antes sido concebido como tratado de execução. O TUE e o TFUE também não são formalmente constitucionais por natureza. A terminologia utilizada no conjunto dos Tratados reflete esta alteração face ao anterior projeto constitucional: o termo «Constituição» deixa de ser utilizado, a expressão «ministro dos Negócios Estrangeiros da União» dá lugar a «alto-representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança» e as designações «lei» e «lei-quadro» são abandonadas. De igual modo, os Tratados modificados não contêm qualquer artigo em que seja feita referência a símbolos da UE como a bandeira ou o hino. O primado do direito da UE não é consagrado de forma expressa numa disposição do Tratado mas resulta, tal como no passado, de uma declaração que faz referência à jurisprudência do Tribunal de Justiça que é pertinente para a questão do primado.

O Tratado de Lisboa abandona, além disso, o «modelo de três pilares» da UE. Permanecem, no entanto, em vigor os procedimentos especiais no domínio da política externa e de segurança comum, incluindo a defesa europeia, salientando as declarações da Conferência Intergovernamental, anexadas ao Tratado, o caráter específico desta política e as responsabilidades especiais dos Estados-Membros quanto a ela.

A UE tem neste momento vinte e oito Estados-Membros. Contam-se, em primeiro lugar, os seis países fundadores da CEE, a saber, a Alemanha (que, com a reunificação dos dois estados alemães, em 3 de outubro de 1990, passou a integrar o território da ex-RDA), a Bélgica, a França, a Itália, o Luxemburgo e os Países Baixos. Em 1 de janeiro de 1973, a Dinamarca (com exceção da Gronelândia, que em fevereiro de 1982 se pronunciou por escassa maioria contra a adesão da ilha à CE), a Irlanda e o Reino Unido ingressaram na Comunidade. A prevista adesão da Noruega acabou por não se concretizar devido aos resultados do referendo de outubro de 1972 (53,5% de votos contra).

O chamado «alargamento a sul» da UE realizou-se com a adesão da Grécia, em 1 de janeiro de 1981, e terminou com a adesão da Espanha e de Portugal, em 1 de janeiro de 1986. A este alargamento seguiu-se, em 1 de janeiro de 1995, a adesão da Áustria, da Finlândia e da Suécia à UE. Na Noruega mais uma vez falhou a adesão, à semelhança do que acontecera 22 anos antes, com a população a pronunciar-se contra, por uma escassa maioria de 52,4% de votos. Em 1 de maio de 2004, aderiram à UE os Estados bálticos Estónia, Letónia e Lituânia, os países da Europa Central e Oriental República Checa, Hungria, Polónia, Eslovénia e Eslováquia, bem como as duas ilhas mediterrânicas de Chipre e Malta. Apenas dois anos mais tarde, a adesão da Bulgária e da Roménia, em 1 de janeiro de 2007, viria encerrar provisoriamente o alargamento a leste.

Em 1 de julho de 2013, a Croácia tornou-se no mais recente membro da UE. O número de Estados-Membros da UE passou assim para 28, e o número de cidadãos da União aumentou para um total de 510 milhões de habitantes. Este alargamento histórico da UE constitui o cerne de um longo processo que veio permitir a reunião de povos europeus que haviam estado separados durante mais de cinquenta anos pela «cortina de ferro» e a «guerra fria». Estes alargamentos refletem acima de tudo o desejo de promover a paz, a estabilidade e o bem-estar económico num continente europeu unido.

A UE mostra-se igualmente aberta à adesão de outros países, desde que estes cumpram os critérios de adesão formulados pelo Conselho Europeu de Copenhaga em 1993:

  • critérios políticos: a estabilidade das instituições que garantem a democracia, o Estado de direito, os direitos humanos e o respeito pelas minorias e sua proteção;
  • critérios económicos: a existência de uma economia de mercado que funcione efetivamente e a capacidade de fazer face à pressão concorrencial e às forças de mercado da UE;
  • critérios jurídicos: a capacidade para assumir as obrigações decorrentes da adesão à UE, incluindo a aceitação dos objetivos de união política, económica e monetária.

O processo de adesão é composto por três fases, que devem ser aprovadas por todos os Estados-Membros que fazem atualmente parte da UE:

  1. é oferecida a um país a possibilidade de vir a ser membro;
  2. um país recebe o estatuto oficial de país candidato à adesão uma vez satisfeitas as condições de adesão, contudo, tal não significa necessariamente que estejam abertas as negociações formais;
  3. iniciam-se as negociações formais de adesão com o país candidato, nas quais se acordam as modalidades e os procedimentos de adoção da legislação aplicável da UE.

Uma vez concluídas a contento das partes as negociações e as reformas que as acompanham, as conclusões e as condições de adesão são incorporadas num Tratado de Adesão. Primeiro, o Parlamento Europeu tem de aprovar este tratado de adesão por maioria absoluta dos seus membros. O Conselho tem então de o aprovar por unanimidade. Posteriormente, o Tratado de Adesão deve ser assinado pelos chefes de Estado e de Governo da UE e pelo país candidato à adesão. O Tratado de Adesão é então «ratificado» pelos Estados-Membros da UE e pelo país candidato à adesão em conformidade com as respetivas normas constitucionais. Com o depósito dos instrumentos de ratificação, o processo de adesão é concluído e o tratado de adesão entra em vigor. O país candidato à adesão torna-se assim um Estado-Membro.

Atualmente, estão a decorrer negociações de adesão com a Turquia (desde 2005), com a Sérvia (desde 2014) e com o Montenegro (desde 2014).

A Turquia apresentou o seu pedido de adesão em 14 de abril de 1987. As relações entre a UE e a Turquia têm, no entanto, um historial ainda mais longo. Em 1963 havia sido já assinado um acordo de associação entre a CEE e a Turquia em que era referida uma perspetiva de adesão. Em 1995, foi criada uma união aduaneira, e, em dezembro de 1999, foi atribuído oficialmente à Turquia, pelo Conselho Europeu de Helsínquia, o estatuto de país candidato à adesão. Era este o resultado da convicção de que o país possuía os pressupostos de base de um sistema democrático, ainda que com muito a fazer em matéria de respeito pelos direitos humanos e de proteção das minorias. Com base numa recomendação da Comissão, o Conselho Europeu deu finalmente luz verde, em dezembro de 2004, para se iniciarem as negociações de adesão com a Turquia. Estas negociações iniciaram-se em outubro de 2005, tendo como objetivo último a adesão. Não há, no entanto, qualquer garantia de que este objetivo venha a ser alcançado. A data prevista para a possível adesão em 2014, que foi definida em 1999, já passou e ainda não foi acordado um novo prazo. A adesão da Turquia deve ser preparada com todo o rigor, por forma a integrar o país sem pôr em perigo tudo o que foi alcançado ao longo de sessenta anos de integração europeia.

A Islândia apresentou o seu pedido de adesão em 17 de julho de 2009. As negociações de adesão iniciaram-se formalmente em 2010 e, inicialmente, progrediram de forma satisfatória, mas, após a mudança de governo, estagnaram e acabaram por ser totalmente abandonadas. A Islândia retirou o seu pedido de adesão em 12 de março de 2015.

A antiga República jugoslava da Macedónia e a Albânia têm o estatuto oficial de país candidato à adesão, que lhes foi atribuído em 2009 e 2014, respetivamente. A possibilidade de uma futura adesão à UE também foi oferecida à Bósnia-Herzegovina e ao Kosovo (1).

Mas também são tomadas previdências relativamente a uma saída da UE: no Tratado UE foi introduzida uma cláusula de saída que permite a um Estado-Membro abandonar a UE. A saída da UE não está associada a qualquer condição, requerendo apenas um acordo entre a UE e o Estado-Membro em questão sobre as modalidades de saída, ou, caso este acordo não se verifique, o cumprimento de um prazo de dois anos contados após a notificação da intenção de saída para que esta se concretize mesmo sem acordo. Esta opção foi exercida mais cedo do que seria expectável. Em 23 de junho de 2016, 52% dos britânicos (com uma participação de 71,8%) votaram contra a permanência do Reino Unido na União Europeia. Cabe agora ao Governo do Reino Unido iniciar o processo de saída (artigo 50.º do Tratado UE), notificando a sua intenção de abandonar a UE.

Não existe, contudo, qualquer disposição sobre a exclusão de um Estado-Membro da UE contra a sua vontade declarada, mesmo em caso de graves e repetidas violações do Tratado.

OS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DA UNIÃO EUROPEIA

Artigo 2.º do TUE (valores da União)

A União funda-se nos valores do respeito pela dignidade humana, da liberdade, da democracia, da igualdade, do Estado de direito e do respeito pelos direitos do Homem, incluindo os direitos das pessoas pertencentes a minorias. Estes valores são comuns aos Estados-Membros, numa sociedade caracterizada pelo pluralismo, a não discriminação, a tolerância, a justiça, a solidariedade e a igualdade entre homens e mulheres.

Artigo 3.º do TUE (objetivos da União)

  1. A União tem por objetivo promover a paz, os seus valores e o bem-estar dos seus povos.
  2. A União proporciona aos seus cidadãos um espaço de liberdade, segurança e justiça sem fronteiras internas, em que seja assegurada a livre circulação de pessoas, em conjugação com medidas adequadas em matéria de controlos na fronteira externa, de asilo e imigração, bem como de prevenção da criminalidade e combate a este fenómeno.
  3. A União estabelece um mercado interno. Empenha-se no desenvolvimento sustentável da Europa, assente num crescimento económico equilibrado e na estabilidade dos preços, numa economia social de mercado altamente competitiva que tenha como meta o pleno emprego e o progresso social, e num elevado nível de proteção e de melhoramento da qualidade do ambiente. A União fomenta o progresso científico e tecnológico.

    A União combate a exclusão social e as discriminações e promove a justiça e a proteção sociais, a igualdade entre homens e mulheres, a solidariedade entre as gerações e a proteção dos direitos da criança.

    A União promove a coesão económica, social e territorial, e a solidariedade entre os Estados-Membros.

    A União respeita a riqueza da sua diversidade cultural e linguística e vela pela salvaguarda e pelo desenvolvimento do património cultural europeu.

  4. A União estabelece uma união económica e monetária cuja moeda é o euro.
  5. Nas suas relações com o resto do mundo, a União afirma e promove os seus valores e interesses e contribui para a proteção dos seus cidadãos. Contribui para a paz, a segurança, o desenvolvimento sustentável do planeta, a solidariedade e o respeito mútuo entre os povos, o comércio livre e equitativo, a erradicação da pobreza e a proteção dos direitos do Homem, em especial os da criança, bem como para a rigorosa observância e o desenvolvimento do direito internacional, incluindo o respeito dos princípios da Carta das Nações Unidas.

[…]

A construção de uma Europa unida assenta em princípios fundamentais a que os Estados-Membros reconhecem estar obrigados no artigo 2.º do TUE e cuja concretização cabe aos órgãos executivos da UE. Estes valores fundamentais incluem o respeito pela dignidade humana, a igualdade, a liberdade e a solidariedade. A UE assume o compromisso expresso de garantir todos os princípios, comuns a todos os Estados-Membros, da democracia e do Estado de direito, bem como a proteção dos direitos humanos.

Estes valores não se limitam a servir de diretrizes para países que pretendam futuramente aderir à União Europeia. Violações graves e persistentes destes valores e princípios por parte de um Estado-Membro podem dar origem a uma sanção nos termos do artigo 7.º do Tratado UE. Antes de mais, os chefes de Estado e de Governo no Conselho Europeu devem determinar unanimemente a existência de uma violação grave e persistente dos valores e dos princípios da União. Esta determinação é feita pelos chefes de Estado e de Governo numa proposta de um terço dos Estados-Membros ou da Comissão Europeia e após obter a aprovação do Parlamento Europeu. O Conselho pode então, deliberando por maioria qualificada, suspender alguns dos direitos decorrentes da aplicação do Tratado UE e do TFUE ao Estado-Membro em causa, incluindo os direitos de voto no Conselho. Os deveres decorrentes dos Tratados continuarão, pelo contrário, a vincular o Estado-Membro em questão. Também os efeitos sobre os direitos e respetivas obrigações dos cidadãos e das empresas serão especialmente tomados em consideração.

A União Europeia, um bastião de paz

Nenhum motivo foi mais poderoso para a unificação europeia do que a necessidade de paz (ver o artigo 3.º do Tratado UE). No séc. XX, duas guerras mundiais opuseram países europeus que hoje fazem parte da União Europeia. Assim sendo, uma política para a Europa traduz-se ao mesmo tempo numa política para a paz. A criação da UE constitui o ponto central de um quadro de paz na Europa, tornando impossível uma guerra entre os Estados-Membros. Setenta anos de paz na Europa são prova disso. Quantos mais países europeus aderirem à União, mais reforçado fica este quadro de paz. Os alargamentos mais recentes da UE deram um grande contributo neste aspeto. Em 2012, a UE recebeu o Prémio Nobel da Paz pelo papel desempenhado em defesa das causas da paz, da reconciliação, da democracia e dos direitos humanos na Europa.

A unidade e a igualdade como fios condutores

A unidade é o fio condutor da UE. Os grandes problemas da atualidade só podem ser ultrapassados se os países europeus falarem e agirem em uníssono, preservando simultaneamente a sua diversidade. E muitos são aqueles que pensam que a paz na Europa e no mundo, a democracia e o Estado de direito, a prosperidade económica e o bem-estar social não poderiam ser assegurados, no presente e no futuro, sem a integração europeia. O desemprego, o crescimento insuficiente, a segurança do aprovisionamento energético e a poluição ambiental deixaram há muito de ser problemas meramente nacionais e não podem também ser resolvidos com soluções a nível nacional. Só no quadro da UE se pode estabelecer uma ordem económica estável, só através de um esforço europeu comum se pode realizar uma política económica internacional que aumente a competitividade da economia europeia e ajude a fortalecer os fundamentos sociais do Estado de direito. Sem coesão interna, a Europa não pode afirmar a sua independência política e económica face ao resto do mundo, nem reencontrar a sua influência na cena internacional e ter um papel interveniente na política mundial.

Em 2012, a União Europeia recebeu o Prémio Nobel da Paz pelo papel desempenhado em defesa das causas da paz, da reconciliação, da democracia e dos direitos humanos na Europa. Herman van Rompuy, presidente do Conselho Europeu de 2009 a 2014, José Manual Barroso, presidente da Comissão Europeia de 2004 a 2014 e Martin Schulz, presidente do Parlamento Europeu de 2012 a 2017, aceitaram o prémio em Oslo no dia 10 de dezembro de 2012.

A unidade só pode existir se predominar a igualdade, e nenhum cidadão da União pode ser colocado em desvantagem pela sua nacionalidade, isto é, «discriminado». É necessário combater a discriminação baseada no género, raça, origem étnica, religião ou ideologia, deficiência, idade ou orientação sexual. A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia vai ainda mais longe. Também a discriminação em virtude da cor da pele, de características genéticas, da língua, das opiniões políticas ou de outro cariz, da pertença a uma minoria nacional, da fortuna ou do local de nascimento é doravante proibida. Além disso, todos os cidadãos da UE são iguais perante a lei. Em relação aos Estados-Membros, nenhum deve beneficiar de posições privilegiadas, e o princípio da igualdade exige que as diferenças que a natureza gera, como a superfície, o número de habitantes de um país e as disparidades estruturais, sejam consideradas à luz do princípio da igualdade.

As liberdades fundamentais

A liberdade é o corolário da paz, da igualdade e da unidade. A criação de um espaço mais vasto, composto agora por 28 Estados, implica simultaneamente uma série de liberdades que vão além das fronteiras nacionais: a liberdade de circulação de trabalhadores, a liberdade de estabelecimento, a liberdade de prestação de serviços, a liberdade de circulação de mercadorias e a liberdade de circulação de capitais. Estas liberdades fundamentais permitem aos empresários decidir livremente, aos trabalhadores escolher o seu local de trabalho e aos consumidores escolher livremente entre uma diversidade enorme de produtos. A livre concorrência permite às empresas orientarem a sua oferta para um círculo incomparavelmente maior de consumidores. O trabalhador escolhe ou muda de emprego em função das suas expectativas e interesses em todo o espaço da UE. O consumidor consegue, devido a uma concorrência mais forte, ter uma oferta consideravelmente maior dos melhores e mais baratos produtos.

É frequente o tratado de adesão estabelecer disposições transitórias para a adesão de um país à UE, especialmente no que diz respeito à livre circulação de trabalhadores, à liberdade de prestação de serviços e à liberdade de estabelecimento. Estas regras permitem que os Estados-Membros «mais antigos» da UE utilizem o direito nacional ou acordos bilaterais existentes para controlar o exercício destas liberdades fundamentais pelos nacionais dos novos Estados-Membros durante um período que pode chegar a sete anos.

O princípio da solidariedade

A solidariedade é o elemento corretivo necessário da liberdade. A utilização desmedida desta faz-se sempre em detrimento de outrem. Por isso, uma ordem comunitária, para ser duradoura, tem de reconhecer também a solidariedade entre os seus membros como princípio fundamental e repartir uniforme e equitativamente as vantagens, isto é, a prosperidade, repartindo igualmente os custos.

Respeito pela identidade nacional

Deverá ser respeitada a identidade nacional dos Estados-Membros. Os Estados-Membros não devem fundir-se na UE, mas antes trazer para ela a sua identidade nacional. É à diversidade das características e das identidades nacionais que a União vai buscar a sua força espiritual e moral, colocando-a ao serviço de todos.

A necessidade de segurança

Todos estes valores fundamentais dependem em última instância da segurança. Em especial desde o ataque de 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos e atendendo ao crescente número de ataques terroristas cada vez mais cruéis na Europa, a luta contra o terrorismo e a criminalidade organizada na Europa volta a estar novamente no centro das atenções. A cooperação policial e judiciária está a ser permanentemente aprofundada, enquanto se reforça a proteção das fronteiras externas comuns da União Europeia.

Mas a segurança do continente europeu implica também uma segurança social para todos os cidadãos que vivem na União, a segurança dos postos de trabalho e também dos acordos comerciais que sejam concluídos no âmbito da confiança na estabilidade do enquadramento económico. Nessa medida, os órgãos da UE são chamados a criar condições necessárias para que os cidadãos e as empresas possam encarar com segurança o futuro.

Os direitos fundamentais

Entre os valores e princípios fundamentais em que a UE assenta figuram também os direitos fundamentais de cada cidadão da União. A História europeia caracteriza-se, há mais de dois séculos, por esforços constantes para reforçar a proteção dos direitos fundamentais. Desde a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, no séc. XVIII, que os direitos e as liberdades fundamentais estão consagrados na maior parte das constituições dos países civilizados. É o que acontece de especial modo nos Estados-Membros da UE, cujas ordens jurídicas assentam na salvaguarda dos direitos, assim como no respeito pela dignidade, liberdade e possibilidades de realização da pessoa humana. Existem numerosos acordos internacionais sobre esta matéria, entre os quais se destaca, pela importância excecional de que se reveste, a Convenção Europeiaµ para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (CEDH).

A proteção dos direitos fundamentais pela ordem jurídica comunitária foi assegurada por uma jurisprudência constante, ainda que algo tardia do Tribunal de Justiça da União Europeia, designadamente a partir de 1969. Antes dessa data, o Tribunal de Justiça começou por rejeitar todas as ações relativas a direitos fundamentais, alegando que as questões de direito constitucional nacional não eram da sua competência. Esta posição acabou por ter de ser revista, e designadamente por força de um princípio que o próprio Tribunal de Justiça estabelecera, a saber, o do primado do direito da União sobre o direito nacional, já que este primado só vale se o direito da União puder garantir uma salvaguarda dos direitos fundamentais equivalente à das constituições nacionais.

Ponto de partida para esta evolução jurisprudencial foi o acórdão Stauder, no qual o beneficiário de uma pensão de guerra considerou um atentado à sua dignidade pessoal e ao princípio da igualdade o facto de ter de se identificar para poder comprar manteiga a preços reduzidos por altura do Natal («Weihnachtsbutter»). Embora o Tribunal de Justiça tenha começado por considerar que, de acordo com as disposições da União, não era obrigatória a identificação, e que por isso se tornava desnecessário examinar o modo como o direito fora violado, acabou por reconhecer que o respeito pelos direitos fundamentais fazia parte dos princípios gerais da ordem jurídica comunitária e que lhe competia fazê-los respeitar. O Tribunal reconheceu assim, e pela primeira vez, a existência de um regime autónomo de direitos fundamentais na UE.

O Tribunal de Justiça começou por fixar salvaguardas pontuais dos direitos fundamentais com base num conjunto de disposições dos Tratados, tendo sobretudo procedido desta forma em relação às inúmeras proibições de discriminação, as quais constituem emanações dos diferentes aspetos do princípio geral da igualdade. Merecem referência a proibição de toda e qualquer discriminação em razão da nacionalidade (artigo 18.º do TFUE), o combate a qualquer discriminação em razão do sexo, raça ou origem étnica, religião ou crença, deficiência, idade ou orientação sexual (artigo 10.º do TFUE), a igualdade de mercadorias e pessoas no domínio das quatro liberdades fundamentais (circulação de mercadorias, artigo 34.º do TFUE; circulação de pessoas, artigo 45.º do TFUE; liberdade de estabelecimento, artigo 49.º do TFUE; livre prestação de serviços, artigo 57.º do TFUE), livre concorrência (artigo 101.º e seguintes do TFUE), bem como a igualdade de remuneração entre trabalhadores masculinos e femininos (artigo 157.º do TFUE). As quatro liberdades fundamentais da União, que garantem as liberdades essenciais da vida profissional, podem também ser consideradas como um direito fundamental da União à livre circulação e livre exercício de uma atividade profissional. São além disso ainda garantidas expressamente a liberdade de reunião (artigo 153.º do TFUE), o direito de petição (artigo 24.º do TFUE) e a proteção do segredo comercial e profissional (artigo 339.º do TFUE).

O Tribunal de Justiça prosseguiu paulatinamente o desenvolvimento de uma ordem jurídica na União de salvaguarda dos direitos fundamentais, à qual foi aditando novos direitos fundamentais. Para tal, reconheceu princípios jurídicos gerais e aplicou-os, inspirando-se nas tradições constitucionais comuns dos Estados-Membros e nas convenções internacionais sobre proteção dos direitos do Homem, de que estes são partes signatárias. Entre estes textos conta-se, em primeira linha, a CEDH, que determinou o conteúdo dos direitos fundamentais da União relativamente aos mecanismos de proteção. Partindo desta base, o Tribunal de Justiça reconheceu diversas liberdades como direitos básicos garantidos pelo direito da União: o direito de propriedade, a liberdade de exercício de uma atividade profissional, a inviolabilidade da habitação, a liberdade de opinião, o direito moral de cariz geral, a proteção da família (por exemplo no domínio do direito de reunião para familiares de trabalhadores imigrantes), a liberdade económica, a liberdade religiosa e de culto, bem como uma série de direitos processuais fundamentais como o princípio fundamental do direito de ação judicial, o princípio fundamental da «common law» de garantia da confidencialidade da correspondência trocada com o advogado (o chamado «legal privilege»), a proibição da dupla punição ou o dever de fundamentação dos atos jurídicos da União através dos direitos fundamentais previstos na ordem jurídica da União.

Um princípio de grande significado, que é frequentemente evocado em litígios de direito comunitário, é o da igualdade de tratamento. Em termos gerais, esse princípio dispõe que factos equiparáveis não podem ser objeto de tratamento diferenciado, a não ser que seja provada objetivamente a existência de uma diferenciação. No entanto, esse princípio não pode impedir, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça da UE, que sejam adotadas a nível nacional medidas para os cidadãos e os produtos nacionais que sejam mais restritivas do que as aplicáveis a cidadãos de outros Estados-Membros ou a produtos de importação (o que em linguagem jurídica é conhecido como «discriminação inversa»). Atribui-se este facto às competências limitadas da União que, em princípio, são apenas aplicáveis ao comércio transfronteiriço. Em contrapartida, as disposições relacionadas com a produção e comercialização de produtos nacionais, bem como o estatuto jurídico dos cidadãos de cada Estado-Membro, só são abrangidos pelo direito da União quando já existe alguma ação de harmonização a nível da União.

Mercê da jurisprudência do Tribunal de Justiça, o direito da União tem vindo a consagrar um número considerável de princípios do Estado de direito relacionados com os direitos fundamentais. Neste contexto o princípio da proporcionalidade adquire um eminente significado prático. Este princípio inclui o princípio do equilíbrio dos produtos e interesses, que por sua vez abarca os aspetos da adequação e necessidade da medida e da proibição de uma ação excessiva. Há também que incluir nos princípios fundamentais subjacentes ao direito da União os princípios gerais do direito administrativo e das garantias processuais dos administrados («due process»), como, por exemplo, a garantia da confidencialidade, a proibição da retroatividade das disposições mais gravosas e a proibição de anular ou declarar retroativamente nulos atos constitutivos de direitos ou benefícios, bem como o direito de ação judicial, que está consubstanciado tanto nos procedimentos administrativos da Comissão Europeia como na possibilidade de recorrer ao Tribunal de Justiça. Ganha particular relevo, neste contexto, a exigência de transparência acrescida, que implica que as decisões sejam tomadas de uma forma tão aberta e próxima do cidadão quanto possível. Um elemento essencial desta transparência é que qualquer cidadão da União ou qualquer pessoa coletiva estabelecida num Estado-Membro tem direito de aceder aos documentos do Conselho e da Comissão Europeia. Além disso, todos os pagamentos provenientes do orçamento da UE e que se destinem a pessoas singulares ou coletivas devem ser divulgados, existindo para isso bases de dados que qualquer cidadão da União pode consultar livremente.

O processo Eugen Schmidberger relacionado com uma manifestação na autoestrada de Brenner que resultou no corte total da autoestrada ao tráfego rodoviário durante 30 horas. A empresa transportadora Schmidberger pediu à República da Áustria — as autoridades que não tinham proibido a manifestação — uma indemnização pelas perdas incorridas em resultado do corte.
O Tribunal de Justiça decidiu que a não proibição da demonstração restringiu efetivamente a livre circulação de mercadorias, mas que podia ser objetivamente justificada. Afirmou que a decisão respeitou os direitos fundamentais dos manifestantes à liberdade de expressão e liberdade de reunião, que estão garantidos na constituição austríaca e na Convenção Europeia dos Direitos do Homem. O Tribunal considerou assim que não se podia imputar às autoridades austríacas uma violação do direito comunitário suscetível de desencadear a responsabilidade do Estado-Membro em causa.

Embora se reconheça o trabalho realizado pelo Tribunal de Justiça na definição dos direitos fundamentais não escritos, forçoso é constatar que este processo de determinação dos «direitos fundamentais europeus» apresenta uma grande lacuna: o Tribunal tem de se limitar a casos concretos. É por isso que não conseguiu deduzir direitos fundamentais de princípios gerais do direito em todos os domínios onde isso parece ser necessário ou desejável. Também não lhe é possível determinar a extensão e os limites da proteção destes direitos procedendo às generalizações e diferenciações necessárias. Este sistema não permite, por isso, aos órgãos da UE estarem suficientemente seguros de que correm ou não o risco de violar um direito fundamental. Da mesma forma, é impossível para qualquer cidadão da União determinar facilmente em cada caso se houve uma violação dos seus direitos fundamentais.

Uma solução encarada desde há muito como uma forma de sair desta situação seria a adesão da UE à CEDH. Contudo, no parecer 2/94, o Tribunal de Justiça considerou que, no estado em que se encontrava na altura o direito da União, a UE não tinha competência para aderir à referida convenção. A este propósito, o Tribunal salientou que, embora a salvaguarda dos direitos do Homem constituísse um requisito da legalidade dos atos da UE, a adesão à CEDH exigiria uma alteração substancial do regime da União nesse momento, na medida em que teria implicado a inserção da UE num sistema institucional distinto de direito internacional, que é o da convenção, e a transposição de todas as disposições da CEDH para a ordem jurídica da União. O Tribunal considerou ainda que uma tal modificação do regime de proteção dos direitos do Homem na UE, pelas suas implicações institucionais tanto para a União como para os Estados-Membros, revestiria uma envergadura constitucional que, pela sua natureza, ultrapassava os poderes conferidos pelo artigo 352.º do TFUE. A solução para esta questão surgiu com o Tratado de Lisboa. A adesão da UE à convenção encontra-se agora expressamente prevista no artigo 6.º, n.º 2, do TUE. As negociações relativas à adesão foram assim prontamente reiniciadas em 2010. Na primavera de 2013, chegou-se a um acordo quanto ao projeto do acordo de adesão. A Comissão enviou este projeto ao Tribunal de Justiça e solicitou o parecer deste sobre a compatibilidade do acordo com o direito da UE. No seu parecer 2/13, o Tribunal de Justiça concluiu que, no formato proposto, o projeto de acordo de adesão da UE à CEDH não era compatível com o direito da UE. Uma das críticas mais significativas salientava que, caso a UE aderisse à CEDH, o Tribunal de Justiça teria de se submeter às decisões do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Também a política externa e de segurança comum da União ficaria sujeita à supervisão dos direitos humanos pelo TEDH. Os juízes consideraram que tal seria contrário aos importantes princípios estruturantes da UE. Embora, em teoria, a adesão da União Europeia à CEDH continue a ser possível após esta decisão, na prática a adesão está de momento fora de questão, uma vez que existem vários aspetos técnicos no documento de adesão que necessitam de ser previamente alterados.

Independentemente da questão da adesão da UE à CEDH, o Tratado de Lisboa representou um novo e muito decisivo passo na criação de uma ordem jurídica de direitos fundamentais para a UE, e colocou numa nova base a proteção dos direitos fundamentais na União. Um novo artigo sobre os direitos fundamentais (artigo 6.º do TUE) sujeita a atuação das instituições e dos Estados-Membros da UE, desde que estes apliquem e executem o direito da União, à Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, que é juridicamente vinculativa a nível da UE através de uma referência nesse artigo. Esta Carta dos Direitos Fundamentais resulta de um texto elaborado por uma convenção composta por 16 representantes dos chefes de Estado e de Governo dos Estados-Membros e do presidente da Comissão Europeia, 16 deputados do Parlamento Europeu e 30 deputados nacionais (dois de cada um dos então 15 Estados-Membros), sob a presidência do Prof. Doutor Roman Herzog, que viria a ser oficialmente proclamado pelos presidentes do Parlamento Europeu, do Conselho da União Europeia e da Comissão Europeia, na abertura do Conselho Europeu de 7 de dezembro de 2000 realizado em Nice, como «Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia». No decurso das consultas sobre uma constituição europeia, esta Carta dos Direitos Fundamentais viria a ser revista, tornando-se parte integrante do Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa de 29 de outubro de 2004. Após o fracasso deste tratado, a Carta dos Direitos Fundamentais foi de novo oficialmente proclamada como ato jurídico autónomo pelos Presidentes do Parlamento Europeu, do Conselho da UE e da Comissão Europeia em 12 de dezembro de 2007 em Estrasburgo. O TUE remete agora para o texto da Carta de uma forma vinculativa, conferindo-lhe um caráter vinculativo e estabelecendo simultaneamente o âmbito de aplicação dos direitos fundamentais no direito da União. No entanto, esta disposição não se aplica à Polónia e ao Reino Unido. Estes dois Estados-Membros não puderam, ou não quiseram, subordinar o regime dos direitos fundamentais à Carta por recearem que, com a aplicação dos direitos fundamentais consagrados na Carta, determinadas posições nacionais, designadamente em questões de religião ou crença, ou do tratamento dado a minorias, poderiam ter de deixar de existir ou ser, pelo menos, alteradas. Para estes dois Estados-Membros o caráter vinculativo dos direitos fundamentais não resulta da Carta dos Direitos Fundamentais mas, tal como antes, da jurisprudência do Tribunal de Justiça da UE em matéria de direitos fundamentais.

OS MÉTODOS PARA UNIFICAR A EUROPA

A unificação europeia caracteriza-se por dois conceitos diferentes para definir a forma como os países da Europa trabalham em conjunto: cooperação e integração. A «cooperação reforçada» surgiu como um outro método.

Cooperação entre os Estados-Membros

A essência da cooperação traduz-se no facto de os Estados-Membros, embora preparados para o fazerem, só irem além das fronteiras nacionais para trabalharem em conjunto com outros Estados-Membros se a sua soberania nacional for, por uma questão de princípio, preservada. Por conseguinte, os esforços de unificação baseados na cooperação não visam criar um estado novo e único, limitam-se a estabelecer ligações entre estados soberanos com vista a formar uma federação de estados em que as estruturas nacionais são preservadas (confederação). Os métodos de trabalho do Conselho da Europa e da OCDE são coerentes com o princípio da cooperação.

O conceito da integração

O conceito da integração transcende a tradicional existência paralela de estados-nação. A noção tradicional de que a soberania dos estados é inviolável e indivisível é preterida a favor da convicção de que a ordem imperfeita da coexistência humana e nacional, a desadequação inerente do sistema nacional e os muitos exemplos na História europeia em que um estado impõe o seu poder em relação a outro («hegemonia») só podem ser superados se as soberanias nacionais individuais se reunirem para criar uma soberania comum e, a um nível mais elevado, se fundirem numa comunidade supranacional (federação).

A UE é uma criação deste conceito de integração, sem a fusão da soberania nacional. Os Estados-Membros não estavam preparados para abdicar da estrutura dos respetivos estados-nação, que tinham acabado de recuperar e que depois consolidaram após a Segunda Guerra Mundial, em prol de uma confederação europeia. Como tal, uma vez mais, houve necessidade de encontrar um compromisso que, sem ter de criar uma confederação europeia, assegurasse mais do que uma mera cooperação entre estados. A solução consistiu em estreitar progressivamente o fosso entre a conservação da independência nacional e uma confederação europeia. Não foi pedido aos Estados-Membros que abdicassem totalmente da sua soberania, foi-lhes pedido apenas que não a considerassem indivisível. Assim, tratou-se apenas de identificar domínios em que os Estados-Membros estivessem preparados para renunciar voluntariamente a parte da sua soberania em prol de uma comunidade que estava acima de todos eles. Os três tratados fundadores — CECA, CE(E) e Euratom — refletem o resultado destes esforços.

Estes tratados e os atuais Tratados da União especificam os domínios em que os direitos de soberania foram transferidos para a União. Neste contexto, não foi concedido à UE e às suas instituições um qualquer poder geral para tomar as medidas necessárias para alcançar os objetivos dos Tratados, em vez disso a natureza e extensão dos poderes para agir encontram-se nas respetivas disposições dos Tratados (princípio da atribuição de competências específicas). Desta forma, os Estados-Membros podem monitorizar e controlar os poderes de que abdicam.

Cooperação reforçada

O instrumento da cooperação reforçada constitui a base para implementar a ideia de integração a várias velocidades. A ideia é que mesmo grupos relativamente pequenos de Estados-Membros têm a oportunidade de aumentar o seu nível de integração num determinado domínio abrangido pelas competências da UE sem serem prejudicados por Estados-Membros que estejam relutantes ou poucos dispostos em fazê-lo.

Uma vez que as condições e os procedimentos para a utilização deste instrumento eram originalmente (Tratado de Amesterdão) muito restritos, estes foram um pouco aliviados aquando do alargamento da União Europeia (Tratado de Nice). O Tratado de Lisboa combina as anteriores disposições sobre cooperação reforçada no artigo 20.º do TUE (condições-quadro) e nos artigos 326.º a 334.º do TFUE (condições complementares, participação, procedimentos, regras de votação).

As regras relativas à cooperação reforçada podem ser resumidas da seguinte forma:

  • Tal cooperação só pode ser utilizada no âmbito das competências existentes na UE e deve favorecer a realização dos objetivos da União e reforçar o seu processo de integração (artigo 20.º TUE). Por conseguinte, é incapaz de atenuar as lacunas da união económica e monetária que já se encontram na própria arquitetura dos Tratados da UE. A cooperação reforçada não pode prejudicar o mercado interno nem a coesão económica e social da UE. Além disso, a cooperação reforçada não pode constituir uma restrição ou uma discriminação ao comércio entre os Estados-Membros nem provocar distorções de concorrência (artigo 326.º do TFUE). As competências, os direitos, os deveres e os interesses dos Estados-Membros não participantes devem ser respeitados (artigo 327.º do TFUE).
  • A cooperação reforçada tem de estar aberta a todos os Estados-Membros. Adicionalmente, os Estados-Membros também devem poder participar na cooperação a qualquer momento, desde que os Estados-Membros em causa respeitem as decisões tomadas no âmbito da cooperação reforçada. A Comissão e os Estados-Membros devem assegurar a participação do maior número possível de Estados-Membros na cooperação reforçada (artigo 328.º do TFUE).
  • A cooperação reforçada só pode ser iniciada como último recurso, quando se estabelecer no Conselho que os seus objetivos não podem ser atingidos, num prazo razoável, através da aplicação das disposições pertinentes dos Tratados. O número mínimo de Estados-Membros para se estabelecer uma cooperação reforçada é nove (artigo 20.º, n.º 2, do Tratado UE).
  • Os atos adotados no âmbito de uma cooperação reforçada não são considerados parte do acervo da UE. Estes atos apenas têm aplicabilidade direta nos Estados-Membros que participam no processo de tomada de decisão (artigo 20.º, n.º 4, do Tratado UE). Contudo, os Estados-Membros que não participam na cooperação não podem impedir a sua aplicação.
  • As despesas decorrentes da cooperação reforçada, que não sejam custos administrativos, devem ser financiadas pelos Estados-Membros participantes, salvo decisão em contrário do Conselho, deliberando por unanimidade de todos os membros que o compõem, após consulta ao Parlamento Europeu (artigo 332.º do TFUE).
  • O Conselho e a Comissão garantem a coerência das ações empreendidas no âmbito de uma cooperação reforçada com as outras políticas e atividades da União (artigo 334.º do TFUE).

Na prática, este instrumento só foi utilizado em dois casos até à data: pela primeira vez na história da União Europeia, os Estados-Membros serviram-se do procedimento de cooperação reforçada para criar um regulamento que permitisse aos cônjuges com nacionalidades diferentes escolher a lei aplicável em caso de divórcio. Após uma proposta da Comissão nesse sentido ter sido apresentada em 2006 e não ter conseguido a necessária unanimidade no Conselho, este último concedeu autorização para se avançar com a cooperação reforçada por decisão de 12 de julho de 2010. Com base numa nova proposta da Comissão, 14 Estados-Membros (Bélgica, Bulgária, Alemanha, Espanha, França, Itália, Letónia, Luxemburgo, Hungria, Malta, Áustria, Portugal, Roménia e Eslovénia) concordaram com as referidas disposições em matéria de divórcio ou separação de cônjuges com nacionalidades diferentes. O resultado encontra-se previsto no Regulamento (UE) n.º 1259/2010 do Conselho, de 20 de dezembro de 2010, que cria uma cooperação reforçada no domínio da lei aplicável em matéria de divórcio e separação judicial.

Um segundo caso em que foi aplicada a cooperação reforçada está relacionado com a proteção de patentes na Europa. Sem a Croácia e a Espanha, e com a subsequente participação da Itália, foram 26 os Estados-Membros que concordaram numa cooperação reforçada para criar a proteção unitária de patentes. O regulamento que estabelece a cooperação reforçada no domínio da criação da proteção unitária de patentes e o regulamento relativo ao regime de tradução aplicável entraram em vigor em 20 de janeiro de 2013. Contudo, os regulamentos só serão aplicáveis após a entrada em vigor do Acordo relativo ao Tribunal Unificado de Patentes. Para que tal aconteça, este acordo tem de ser ratificado, no mínimo, por 13 Estados-Membros. Até à data, só 11 o ratificaram.

A «CONSTITUIÇÃO» DA UNIÃO EUROPEIA

Todas as sociedades têm uma constituição. É através dela que é definida a estrutura do seu sistema político, ou seja, a constituição rege as relações dos membros da sociedade entre si e face ao todo, fixa os objetivos comuns e define o processo a seguir para a adoção das decisões vinculativas. A constituição da UE, que é uma união de estados para a qual foram transferidas tarefas e funções bem definidas, deve, por isso, poder responder às mesmas questões que a constituição de um estado.

As comunidades de estados regem-se por dois princípios fundamentais: o primado do direito («rule of law») e a democracia. Toda a ação da União, para ser consonante com os princípios fundamentais do direito e da democracia, deve ter legitimidade jurídica e democrática: criação, organização, competências, funcionamento, papel dos Estados-Membros e suas instituições, papel do cidadão.

A «constituição» da UE, depois do fracasso do Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa de 29 de outubro de 2004, e tal como antes acontecia, não foi como a maioria das constituições dos seus Estados-Membros consagrada num documento constitucional coerente. Resulta antes da soma de normas e valores fundamentais que os responsáveis encaram como vinculativos. Estas normas resultam quer dos próprios textos dos tratados europeus e dos atos jurídicos aprovados pelas instituições da União, quer de usos e costumes consagrados.

A natureza jurídica da União Europeia

Determinar a natureza jurídica significa classificar juridicamente, em termos gerais, uma organização com base nas respetivas características. Foi isto que foi feito em dois acórdãos fundamentais de 1963 e 1964 que fazem parte da jurisprudência do Tribunal de Justiça e que, apesar de terem sido proferidos quando existia a CEE, continuam a ter como antes validade jurídica para a União Europeia na sua atual configuração.

O processo Van Gend & Loos

Neste processo, a empresa de transporte neerlandesa Van Gend & Loos intentara uma ação num tribunal dos Países Baixos contra a administração aduaneira neerlandesa, por esta ter cobrado direitos aduaneiros majorados à importação de um produto químico proveniente da República Federal da Alemanha. A empresa considerava haver uma violação do artigo 12.º do Tratado CEE, que proíbe a introdução de novos direitos aduaneiros e o aumento dos já existentes no mercado comum. O tribunal neerlandês suspendeu o procedimento e apresentou um pedido de decisão prejudicial ao Tribunal de Justiça, para que este esclarecesse o alcance e a interpretação jurídica do artigo invocado do Tratado CE.

O Tribunal de Justiça aproveitou a ocasião para fixar certos aspetos fundamentais da natureza jurídica da CEE. No acórdão proferido a propósito pode ler-se:

O objetivo do Tratado CEE, que consiste em instituir um mercado comum cujo funcionamento diz diretamente respeito aos nacionais da Comunidade, implica que este Tratado seja mais do que um acordo meramente gerador de obrigações recíprocas entre os Estados contratantes. Esta conceção é confirmada pelo preâmbulo do Tratado, que, além dos governos, faz referência aos povos e, mais concretamente, pela criação de órgãos investidos de poderes soberanos cujo exercício afecta quer os Estados-Membros, quer os seus nacionais […] Daqui deve concluir-se que a Comunidade constitui uma nova ordem jurídica de direito internacional, a favor da qual os Estados limitaram, ainda que em domínios restritos, os seus direitos soberanos, e cujos sujeitos são não só os Estados-Membros, mas também os seus nacionais.»

O processo Costa vs. ENEL

Um ano mais tarde, o processo Costa vs. ENEL deu ao Tribunal de Justiça a possibilidade de aprofundar ainda mais a sua análise. Em causa estavam os seguintes factos: em 1962, a Itália nacionalizou a produção e a distribuição de eletricidade, tendo transferido o património das empresas do setor para a sociedade ENEL. Enquanto acionista da sociedade atingida pela nacionalização, a Edison Volta, Flaminio Costa viu-se privado de dividendos a que tinha direito e recusou-se a pagar uma fatura de eletricidade de 1926 liras italianas. Perante o «Giudice Conciliatore» de Milão, Flaminio Costa justificou a sua conduta fazendo valer, designadamente, o facto de que a lei da nacionalização violava uma série de disposições do Tratado CEE. O Tribunal de Milão apresentou então ao Tribunal de Justiça um pedido de decisão prejudicial relativamente à interpretação de algumas disposições do Tratado CEE. No seu acórdão, o Tribunal de Justiça estabeleceu, a propósito da natureza jurídica da CEE:

Diversamente dos tratados internacionais ordinários, o Tratado CEE institui uma ordem jurídica própria que é integrada no sistema jurídico dos Estados-Membros a partir da entrada em vigor do Tratado e que se impõe aos seus órgãos jurisdicionais nacionais. Efetivamente, ao instituírem uma Comunidade de duração ilimitada, dotada de instituições próprias, de capacidade jurídica, de capacidade de representação internacional e, mais especialmente, de poderes reais resultantes de uma limitação de competências ou de uma transferência de atribuições dos Estados para a Comunidade, estes limitaram, ainda que em domínios restritos, os seus direitos soberanos e criaram, assim, um corpo de normas aplicável aos seus nacionais e a si próprios.»

O Tribunal de Justiça sintetiza do modo que se segue as conclusões finais alcançadas na sequência de pormenorizadas deliberações.

Resulta do conjunto destes elementos que ao direito emergente do Tratado, emanado de uma fonte autónoma, em virtude da sua natureza originária específica, não pode ser oposto em juízo um texto interno, qualquer que seja, sem que perca a sua natureza comunitária e sem que sejam postos em causa os fundamentos jurídicos da própria Comunidade. A transferência efetuada pelos Estados, da sua ordem jurídica interna em benefício da ordem jurídica comunitária, dos direitos e obrigações correspondentes às disposições do Tratado implica, pois, uma limitação definitiva dos seus direitos soberanos, sobre a qual não pode prevalecer um ato unilateral ulterior incompatível com o conceito de Comunidade.»

À luz destes dois acórdãos fundamentais do Tribunal de Justiça, são os seguintes os elementos que conjuntamente conferem características específicas e singularidade à natureza jurídica da CE:

  • a estrutura institucional, que garante que o processo de elaboração das decisões na UE é também marcado ou influenciado pelo interesse geral da Europa, isto é, os interesses da União que emergem dos objetivos;
  • a transferência de competências verificada para as instituições da União num grau mais importante do que em outras organizações internacionais e que abrange domínios nos quais os Estados-Membros geralmente conservam a respetiva soberania;
  • a criação de uma ordem jurídica própria, independente da dos Estados-Membros;
  • a aplicabilidade direta do direito da União, que garante que as regras do direito da UE devem desenvolver a plenitude do seu efeito de uma forma completa e uniforme em todos os Estados-Membros e que tais disposições são fonte de direitos e de obrigações, quer para os Estados-Membros, quer para os respetivos cidadãos;
  • o primado do direito da União, que impede qualquer revogação ou alteração da legislação da União pelo direito nacional e garante o primado do direito comunitário em caso de conflito com o direito nacional.

A UE constitui, pois, uma entidade autónoma, dotada de direitos soberanos e de uma ordem jurídica independente dos Estados-Membros que se impõe, quer aos Estados-Membros, quer aos respetivos cidadãos nos domínios da competência da União Europeia.

As características da UE deixam também claro os seus pontos comuns e as suas diferenças em relação às organizações internacionais tradicionais e às estruturas de tipo federal.

A UE não é uma estrutura acabada, mas antes um «sistema em construção» cujos contornos finais não estão ainda definidos.

O único ponto comum entre as organizações internacionais tradicionais e a União Europeia reside no facto de a UE também ter nascido de tratados internacionais. No entanto, a União já se afastou bastante destas raízes do direito internacional. Isto porque os atos fundadores da UE levaram à criação de uma União autónoma dotada de direitos soberanos e competências próprias. Os Estados-Membros abdicaram de parte dos seus poderes soberanos em prol desta União e transferiram-nos para a UE para que possam ser exercidos conjuntamente.

As diferenças da União Europeia em relação às organizações internacionais correntes aproximam-na de uma estrutura estatal. A renúncia por parte dos Estados-Membros a uma parte da respetiva soberania em favor da UE constitui um dos elementos que permitiram concluir que a estrutura da União já se identificava com a de um estado federal. Todavia, esta conceção não atende ao facto de as competências das instituições da UE estarem circunscritas à realização dos objetivos consagrados pelos tratados e a certos domínios para os quais possuem competências definidas especificamente. Estas instituições não podem, por isso, fixar livremente os respetivos objetivos (como acontece num estado soberano) nem responder a todos os desafios que se colocam atualmente a um estado moderno. À UE falta a plenitude de competências que caracteriza os estados soberanos e a faculdade de instituir novas competências (a chamada competência das competências).

Consequentemente, a UE não é nem uma organização internacional «clássica» nem uma associação de estados, mas uma entidade que se situa a meio caminho entre estas formas tradicionais de associação entre estados com direitos de soberania. Em termos jurídicos, consagrou-se a delimitação desta posição especial graças ao conceito de «organização supranacional».

As competências da União Europeia

As competências da UE aproximam-na muito do ordenamento constitucional de um estado. Não se trata, contrariamente à maior parte das outras organizações internacionais, de uma transferência de competências técnicas exatamente delimitadas, mas de domínios de atividade na sua globalidade essenciais para a existência dos estados.

As competências da UE são previsivelmente muito diversificadas, abrangendo competências económicas, sociais e políticas.

Competências económicas

No cerne das competências económicas está a criação de um mercado comum que reúna no seu seio os «mercados nacionais» dos Estados-Membros e no qual todas as mercadorias e serviços possam ser vendidos e comercializados nas mesmas condições que num mercado interno, ao qual todos os cidadãos da União devem aceder livremente e em igualdade de circunstâncias. O conceito de criação de um mercado comum foi iniciado pelo antigo presidente da Comissão Europeia Jacques Delors, e realizado essencialmente através do programa para a realização do mercado interno até 1992, aprovado pelos chefes de Estado e de Governo. As instituições da União conseguiram criar o quadro jurídico necessário para o bom funcionamento do mercado interno. Este quadro tem sido preenchido sobretudo com medidas de transposição nacionais, resultando daí que o mercado único é atualmente uma realidade. Este mercado único também se faz sentir no quotidiano, em especial quando se viaja dentro da UE, onde os controlos de pessoas e bens nas fronteiras nacionais há muito que foram suprimidos.

O mercado interno foi acompanhado pela União Económica e Monetária.

O mercado interno com as suas quatro liberdades características (artigo 26.º do TFUE) é um dos principais elementos do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia: liberdade de circulação de mercadorias (artigo 34.º), liberdade de circulação de pessoas (artigo 45.º e artigo 49.º), liberdade de prestação de serviços (artigo 57.º) e liberdade de circulação de capitais (artigo 63.º).

As competências da UE em matéria de política económica não consistem, porém, em estabelecer e fazer funcionar uma política económica europeia, mas sim coordenar de tal forma as políticas económicas que as decisões económicas de um ou mais Estados-Membros não tenham efeitos negativos no funcionamento do mercado interno. Com esta finalidade, decidiu-se o estabelecimento de um Pacto de Estabilidade e Crescimento que fixasse critérios específicos a cada um dos Estados-Membros que lhes servissem de orientação na tomada das suas decisões no âmbito da política orçamental. Quando tal não acontece, a Comissão Europeia pode formular advertências, e em caso de défice orçamental excessivo e duradouro, o Conselho da UE pode aplicar sanções. No decurso da crise económica e financeira global, a cooperação em matéria de política económica ao nível da UE foi ainda mais reforçada entre 2010 e 2012. A coordenação em matéria de política económica ao nível da UE foi complementada por um mecanismo de crise permanente que consiste sobretudo nos seguintes elementos: reforço do papel da Comissão, introdução de novos mecanismos de correção automáticos, estabelecimento de coordenação das políticas económicas ao mais alto nível, coordenação concertada no Semestre Europeu com obrigações mais exigentes em termos de comunicação de informações por parte dos Estados-Membros, reforço do papel dos parlamentos nacionais e do Parlamento Europeu, bem como definição de compromissos voluntários no direito nacional. No coração deste novo mecanismo de crise encontra-se o Semestre Europeu.

O Semestre Europeu é um ciclo durante qual os Estados-Membros da UE coordenam as suas políticas económicas e orçamentais. Tal como o seu nome indica, o «Semestre» centra-se nos primeiros seis meses de um ano. Durante o Semestre Europeu, os Estados-Membros procedem ao alinhamento das políticas orçamentais e económicas nacionais pelas regras e objetivos fixados a nível da UE. Por conseguinte, o objetivo do Semestre Europeu é contribuir para assegurar a solidez das finanças públicas, fomentar o crescimento económico e evitar desequilíbrios macroeconómicos excessivos na UE.

Este mecanismo de crise deve ser encarado como um último recurso. O seu derradeiro objetivo é proteger a união económica e monetária. Contudo, a orientação política de base permanece a mesma: responsabilidade nacional na política económica e financeira, em que os Estados-Membros devem encarar as suas ações como uma questão de interesse comum.

Quem faz o quê no Semestre Europeu?

No final do ano recomeça um novo ciclo quando a Comissão apresenta uma panorâmica da situação económica na sua análise anual do crescimento para o ano seguinte.

O diagrama encontra-se disponível nas 24 línguas da UE em //www.consilium.europa.eu/pt/policies/european-semester/

As competências da UE em matéria de política monetária consistem em introduzir uma moeda única na UE e gerir de uma forma centralizada as questões monetárias. Já se alcançou algum êxito neste domínio com a introdução, em 1 de janeiro de 1999, do euro como moeda única europeia nos Estados-Membros que cumpriam já os critérios de convergência definidos com esse objetivo (taxa de inflação de 1,5%; défice orçamental = nova dívida anual: 3%; dívida pública: 60%; taxa de juro de longo prazo: 2%). Foram eles: Bélgica, Alemanha, Irlanda, Espanha, França, Itália, Luxemburgo, Países Baixos, Áustria, Portugal e Finlândia. No dia 1 de janeiro de 2002, as moedas nacionais destes países foram substituídas por notas e moedas de euro. Desde então, os pagamentos quotidianos e as transações financeiras nestes países foram feitos numa única moeda: o euro. Nos anos seguintes, o número de Estados-Membros que conseguiram cumprir os critérios de adoção do euro aumentou: Grécia (1 de janeiro de 2001), Eslovénia (1 de janeiro de 2007), Chipre (1 de janeiro de 2008), Malta (1 de janeiro de 2008), Eslováquia (1 de janeiro de 2009), Estónia (1 de janeiro de 2011), Letónia (1 de janeiro de 2014) e, por último, Lituânia (1 de janeiro de 2015). A «área do euro» (ou «zona euro»), constituída pelos países que usam o euro como moeda, conta atualmente com 19 Estados-Membros.

Em princípio, os restantes Estados-Membros estão obrigados a introduzirem o euro como moeda nacional logo que respeitarem os critérios de convergência. As únicas exceções à regra são a Dinamarca e o Reino Unido. Estes Estados-Membros decidiram adotar uma cláusula de exclusão (opting out) que lhes permite escolherem por si próprios se e quando desejam iniciar o processo de avaliação para a adesão à moeda única. A Suécia, que não adotou uma cláusula de exclusão, representa um caso especial. A sua adoção do euro depende em vez disso de uma recomendação da Comissão e do Banco Central Europeu ao Conselho no que toca à participação da Suécia. Caso tal recomendação seja feita, e o Conselho atue em conformidade, a Suécia não terá em princípio qualquer oportunidade de recusar essa participação. No entanto, a adesão à área do euro não tem, de momento, qualquer apoio junto da população sueca. Num referendo sobre o euro, realizado em 2003, 55,9% dos participantes rejeitaram a sua introdução. Segundo um inquérito feito em dezembro de 2005, esta rejeição era ainda de 49%, com 36% dos inquiridos a concordarem com a adoção da moeda única.

Não obstante todas as preocupações, o euro conseguiu impor-se como uma moeda forte e reconhecida internacionalmente, estabelecendo também uma ligação sólida entre os Estados-Membros da área do euro. Nem mesmo a crise da dívida soberana que começou em 2010 conseguiu mudar este facto. Muito pelo contrário. A UE respondeu à crise introduzindo mecanismos de apoio temporários, que foram permanentemente substituídos pelo Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) em 2013. O MEE, enquanto mecanismo permanente de resolução de crises, confere assistência financeira externa aos Estados-Membros da área do euro, com uma capacidade efetiva de concessão de crédito de 500 mil milhões de euros. Os Estados-Membros da área do euro só recebem esta assistência financeira em condições estritas, que visam uma rigorosa consolidação orçamental e são refletidas num programa de ajustamento económico a negociar pela Comissão e pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) em estreita cooperação com o Banco Central Europeu. Dotada do MEE, a UE está em condições de defender o euro, mesmo nas situações de maior gravidade. Este mecanismo é um reflexo inequívoco do interesse comum e da solidariedade no interior da área do euro, bem como da responsabilidade de cada Estado-Membro perante os seus pares.

Para além da política económica e da política monetária, são também da competência da UE outras áreas da política económica, designadamente a política agrícola e de pescas, a política de transportes, a política de defesa do consumidor, a política estrutural e de coesão, a política de investigação e desenvolvimento, a política aeroespacial, a política ambiental, a política de saúde, a política comercial e a política energética.

Competências sociais

Ao nível da política social, a UE também tem competências para moldar a dimensão social do mercado único e garantir que os benefícios da integração económica não sejam apenas sentidos por quem está ativo na economia. Um primeiro ponto de partida nesta matéria é, por exemplo, a introdução de um sistema de segurança social para trabalhadores migrantes. Este sistema garante que nenhum trabalhador que tenha exercido uma atividade profissional, em mais de um Estado-Membro e, em virtude disso, tenha estado inscrito em diferentes sistemas de segurança social, seja prejudicado por esse facto nas suas regalias sociais (pensão de velhice, pensão de invalidez, cuidados de saúde, prestações familiares, subsídio de desemprego). Um outro ponto de partida também importante para uma missão urgente no domínio da política social é o facto de, perante a situação do desemprego na UE, que suscita preocupação desde há vários anos, se ter dado prioridade à definição de uma estratégia europeia de emprego. Os Estados-Membros e a UE são chamados a desenvolver uma estratégia de emprego e, sobretudo, a promover a qualificação, formação e flexibilidade dos trabalhadores, adaptando, além disso, os mercados de trabalho às necessidades da transformação económica. A promoção do emprego é entendida como uma oportunidade para o bem comum, que requer dos Estados-Membros a coordenação, no seio do Conselho, das suas atividades nacionais. A UE deve contribuir para que se atinjam níveis elevados de emprego, incentivando a cooperação entre Estados-Membros, apoiando e, sempre que necessário, completando a sua ação, no pleno respeito das competências dos Estados-Membros nesta matéria.

Competências políticas

No domínio político as competências da UE situam-se no contexto da cidadania da União, da política de cooperação judicial em matéria penal e da política externa e de segurança comum. A cidadania da União permite reforçar ainda mais os direitos e interesses dos cidadãos dos Estados-Membros no seio da UE. Qualquer cidadão da União goza do direito de circular livremente na UE (artigo 21.º do TFUE), eleger e ser eleito nas eleições municipais (artigo 22.º do TFUE), e beneficia, no território de países terceiros, de proteção por parte das autoridades diplomáticas e consulares de qualquer Estado-Membro (artigo 23.º do TFUE), goza do direito de petição ao Parlamento Europeu (artigo 24.º do TFUE) e, de harmonia com o princípio da não discriminação, goza do direito de ser tratado em qualquer Estado-Membro em plano de igualdade com os nacionais desse Estado-Membro (artigo 20.º, n.º 2, conjugado com o artigo 18.º do TFUE).

No âmbito da Política Externa e de Segurança Comum, as competências da UE passam por salvaguardar os valores comuns, os interesses fundamentais e a independência da UE, reforçar a segurança da UE e dos seus Estados-Membros, assegurar a paz mundial e o reforço da segurança internacional, promover a democracia, o Estado de direito e a cooperação internacional, salvaguardar os direitos humanos e as liberdades fundamentais, bem como construir uma defesa comum.

Uma vez que a UE não é um estado, a realização destes objetivos só pode ser feita gradualmente. Tradicionalmente, a política externa, e sobretudo a de segurança, fazem parte das áreas em que os Estados-Membros dão uma especial atenção à preservação da sua soberania. Nesta perspetiva, é difícil definir interesses comuns nesta área, já que, na UE, só a França e o Reino Unido possuem armas nucleares. Outro problema é que alguns Estados-Membros não são membros da NATO. Atualmente, as decisões em matéria de política externa e de segurança comum são, por isso, tomadas ainda predominantemente no âmbito da cooperação entre estados. No entanto, desenvolveu-se um conjunto de instrumentos de ação autónomo, através do qual a cooperação entre estados adquiriu contornos jurídicos definidos.

No domínio da cooperação judiciária em matéria penal, trata-se sobretudo do exercício pela UE de competências que são de interesse europeu, e que incluem em especial a luta contra a criminalidade organizada e tráfico de seres humanos, bem como a sua punição. Já não é possível lutar sozinho e com eficácia contra a criminalidade organizada a nível nacional, sendo necessária uma atuação conjunta ao nível da UE. As primeiras medidas promissoras neste domínio foram já tomadas com a diretiva relativa à luta contra o branqueamento de capitais e a criação de um serviço europeu de polícia, a Europol (Agência da União Europeia para a Cooperação Policial) (artigo 88.º do TFUE), cuja atividade se iniciou em 1998. Além disso, trata-se neste contexto de facilitar e acelerar a cooperação nos processos judiciais e na aplicação de decisões, facilitar as extradições entre Estados-Membros, estabelecer regras mínimas quantos aos elementos constitutivos das infrações penais e das penas nos domínios da criminalidade organizada, terrorismo, tráfico de seres humanos e exploração sexual de mulheres e crianças, tráfico de droga e de armas, branqueamento de capitais e corrupção (artigo 83.º do TFUE).

Um dos progressos mais significativos na cooperação judicial na UE foi a criação da Eurojust em abril de 2003 (artigo 85.º do TFUE). A Eurojust, sedeada em Haia, inclui juízes e procuradores-gerais de todos os Estados-Membros da União Europeia. Compete-lhe facilitar a cooperação entre o trabalho de investigação e a ação penal em processos relativos a delitos transfronteiriços graves. A fim de combater as infrações lesivas dos interesses financeiros da UE, o Conselho pode instituir uma Procuradoria Europeia a partir da Eurojust (artigo 86.º do TFUE). Outro progresso é, desde janeiro de 2004, o mandado de detenção europeu. O mandado de detenção pode ser emitido assim que se verifique uma infração para a qual se aplique uma pena mínima de mais de um ano de prisão. O mandado de detenção europeu substituiu os morosos processos de extradição do passado.

Os poderes da União Europeia

Os Tratados fundadores da UE não concedem às instituições da UE qualquer competência geral para adotarem todas as medidas necessárias à concretização dos objetivos do Tratado, mas estabelecem para os diferentes capítulos o âmbito dos poderes para uma atuação em pormenor. O princípio fundamental é de que a UE e as suas instituições não podem tomar por si próprias decisões sobre as suas bases jurídicas e competências. Aplica-se também o princípio fundamental da atribuição de competências específicas limitadas (artigo 2.º do TFUE). Os Estados-Membros optaram por esta via para manterem uma visão de conjunto da renúncia aos seus próprios poderes e controlar esse processo.

A extensão material destes poderes específicos varia consoante as atribuições da UE. Desde que não tenham sido transferidas para a UE, as competências continuam a pertencer exclusivamente aos Estados-Membros. O TUE refere expressamente que as questões da «segurança nacional» permanecerão na competência exclusiva dos Estados-Membros.

Isso coloca naturalmente a questão da delimitação das competências da UE em relação às dos Estados-Membros. Esta delimitação é feita de acordo com três categorias de competências:

  • Competência exclusiva da UE (artigo 3.º do TFUE) nos domínios em que exista uma presunção de que uma medida ao nível da UE é mais eficaz do que uma medida não coordenada de qualquer Estado-Membro. Estes domínios estão exatamente delimitados e abrangem a União aduaneira, o estabelecimento das regras de concorrência necessárias ao funcionamento do mercado interno, a política monetária para os Estados-Membros cuja moeda seja o euro, a política comercial comum e partes da política comum das pescas. Nestas diferentes áreas de atuação só a União Europeia pode atuar legislativamente e aprovar atos jurídicos vinculativos. Os Estados-Membros podem apenas intervir quando a União Europeia lhes conferir poderes para isso ou para aplicar atos jurídicos da União Europeia (artigo 2.º, n.º 1, do TFUE).
  • Competência partilhada entre a UE e os Estados-Membros (artigo 4.º do TFUE) nos domínios em que uma intervenção da UE tenha uma vantagem acrescida face a uma intervenção dos Estados-Membros. Uma tal competência partilhada está prevista na regulamentação do mercado interno, na coesão económica, social e territorial, na agricultura e pescas, no ambiente, nos transportes, nas redes transeuropeias, na energia, no espaço de liberdade, segurança e justiça, assim como em problemas comuns de segurança em matéria de saúde pública, investigação e desenvolvimento tecnológico, espaço, cooperação para o desenvolvimento e ajuda humanitária. Em todos estes domínios a UE será a primeira a exercer essa competência, que aliás se estende apenas às componentes regulamentadas do ato jurídico da União em questão e não a toda a política visada. Os Estados-Membros exercem as suas competências na medida e desde que a UE não tenha exercido a sua, ou a tenha decidido deixar de exercer (artigo 2.º, n.º 2, do TFUE). Esta última situação verifica-se quando as instituições competentes da UE decidem revogar um ato legislativo, sobretudo para respeitarem os princípios de subsidiariedade e proporcionalidade. O Conselho pode também, por iniciativa de um ou mais dos seus membros, solicitar à Comissão que apresente propostas para a revogação de um ato jurídico.
  • Competências de apoio (artigo 6.º do TFUE). No exercício das competências de apoio, a UE pode exclusivamente coordenar ou completar as medidas dos Estados-Membros. Em nenhum caso a UE poderá proceder a uma harmonização das disposições jurídicas nacionais nos domínios sujeitos à competência de apoio (artigo 2.º, n.º 5, do TFUE). A responsabilidade pela forma jurídica cabe, assim, aos Estados-Membros, que para tal dispõem de uma margem considerável de ação. Abrangidas por esta categoria de competências estão a proteção e melhoria da saúde humana, a política industrial, a cultura, o turismo, o ensino, a juventude, o desporto e a formação profissional, a proteção contra catástrofes e a cooperação administrativa. Nos domínios da política económica e de emprego, os Estados-Membros reconhecem expressamente que as suas medidas nacionais devem ser coordenadas no âmbito da UE.

Para além destes poderes especiais de ação, os Tratados da União Europeia abrem também a possibilidade, às instituições da UE, de intervirem quando tal for indispensável para a realização e funcionamento do mercado interno e garantia de uma concorrência leal (comparar com o artigo 352.º do TFUE, a chamada competência para o preenchimento de lacunas ou cláusula de flexibilidade). Todavia, as instituições não têm poderes de ação generalizados para agir em domínios que ultrapassam os objetivos previstos nos Tratados, do mesmo modo que não podem alargar as suas próprias competências em detrimento dos Estados-Membros, invocando estes poderes de ação. Na prática, as possibilidades que estas competências oferecem foram muito utilizadas no passado, uma vez que a UE é hoje chamada a intervir em novas situações que não estavam previstas quando foram concluídos os tratados fundadores, não lhe tendo por isso sido atribuído nos tratados as respetivas competências. Este aspeto está sobretudo patente nos domínios da proteção do ambiente e da defesa do consumidor, ou na criação do Fundo Europeu para o Desenvolvimento Regional, que deverá contribuir para diminuir a distância entre as regiões desenvolvidas e menos desenvolvidas da UE. Para os referidos domínios foram, porém, entretanto previstas competências especiais. Com estas regulamentações claras diminuiu consideravelmente a relevância prática da competência para o preenchimento de lacunas. O exercício desta competência requer o aval do Parlamento Europeu.

Por último, as instituições da UE têm poderes para tomar medidas nos casos em que estas sejam necessárias ao exercício eficaz e ponderado dos poderes expressamente atribuídos (poderes implícitos). É principalmente no domínio das relações externas que estas competências adquirirem uma especial relevância. A UE pode também contrair obrigações face a países não membros ou outras organizações internacionais em domínios correspondentes às suas atribuições. Um exemplo ilustrativo é o do processo Kramer, que o Tribunal de Justiça teve de analisar e que tratava da competência da UE para, com o intuito de se estabelecerem quotas de capturas para a pesca em alto mar, cooperar com organizações de direito marítimo internacional e, eventualmente, assumir as correspondentes obrigações em matéria de direito internacional. O Tribunal de Justiça fez derivar a competência externa da UE, indispensável para este efeito, da competência interna em matéria de política de pescas no domínio da política agrícola comum em virtude da ausência de uma regulamentação expressa no Tratado.

O exercício de tais competências por parte da UE está subordinado ao princípio da subsidiariedade tomado de empréstimo à doutrina católica social, que, por estar consagrado no Tratado UE (artigo 5.º, n.º 3, do TUE), adquiriu um estatuto constitucional. Este princípio tem duas facetas, uma positiva e outra negativa: a positiva, isto é, a que estimula a existência de competências comunitárias, dispõe que a UE deve agir quando os objetivos pretendidos possam ser melhor alcançados ao nível da União. A negativa, isto é, a faceta limitativa do princípio da subsidiariedade, significa que a UE não deve atuar quando a ação dos Estados-Membros é suficiente para alcançar os objetivos pretendidos. Na prática, isto significa que todas as instituições da União, mas sobretudo a Comissão, estão sistematicamente obrigadas a demonstrar que são, de facto, necessárias uma regulamentação e uma ação comunitárias. Parafraseando Montesquieu: quando não é necessário aprovar um regulamento da UE é necessário não aprovar nenhum. Se houver efetivamente necessidade de uma regulamentação ao nível da União, há que colocar a questão da intensidade e do tipo da medida da UE a adotar. A resposta decorre do princípio da proporcionalidade, que se encontra consagrado no Tratado UE em conjugação com as disposições relativas às competências (artigo 5.º, n.º 4). Subsequentemente, deve analisar-se em pormenor se é necessário um instrumento jurídico e se outro meio de ação não seria suficiente em termos de eficácia. Tal significa que há que dar preferência sobretudo a regulamentos-quadro, a regulamentações mínimas e ao reconhecimento mútuo das disposições nacionais e evitar disposições legais que sejam exageradamente pormenorizadas e, sempre que possível, disposições de harmonização.

O respeito pelos princípios da subsidiariedade e proporcionalidade pode agora ser também verificado pelos parlamentos nacionais. Para isso, introduziu-se um sistema de alerta segundo o qual os parlamentos nacionais podem emitir um parecer fundamentado, no prazo de oito semanas após receberem uma proposta legislativa, onde expliquem as razões pelas quais a proposta legislativa em questão não está em consonância com os requisitos de subsidiariedade e proporcionalidade. Caso tal parecer fundamentado seja apoiado por pelo menos um terço dos votos atribuídos aos parlamentos nacionais (dispondo cada parlamento nacional de dois votos e cada sistema de câmaras de um voto por câmara), a proposta legislativa deverá ser novamente analisada pelo seu autor (que é, regra geral, a Comissão Europeia). Com base nesta avaliação, a proposta poderá ser mantida, modificada ou retirada. Caso a Comissão Europeia decida manter o projeto, terá de elaborar um parecer fundamentado para justificar a razão pela qual, no seu entender, o projeto está em consonância com o princípio da subsidiariedade. Este parecer fundamentado será transmitido com os pareceres fundamentados dos parlamentos nacionais ao legislador da UE para ser levado em consideração no processo legislativo. Caso o legislador da UE, recolhendo uma maioria de 55% dos membros do Conselho ou uma maioria dos votos expressos no Parlamento Europeu, entenda que a proposta não está em consonância com o princípio da subsidiariedade, cessará a apreciação da proposta legislativa.

As instituições da União Europeia

O artigo 13.º do Tratado UE (quadro institucional) diz o seguinte:

  1. A União dispõe de um quadro institucional que visa promover os seus valores, prosseguir os seus objetivos, servir os seus interesses, os dos seus cidadãos e os dos Estados-Membros, bem como assegurar a coerência, a eficácia e a continuidade das suas políticas e das suas ações.

    As instituições da União são:

    • o Parlamento Europeu;
    • o Conselho Europeu;
    • o Conselho;
    • a Comissão Europeia (adiante designada «Comissão»);
    • o Tribunal de Justiça da União Europeia;
    • o Banco Central Europeu;
    • o Tribunal de Contas.
  2. Cada instituição atua dentro dos limites das atribuições que lhe são conferidas pelos Tratados, de acordo com os procedimentos, condições e finalidades que estes estabelecem. As instituições mantêm entre si uma cooperação leal.
  3. As disposições relativas ao Banco Central Europeu e ao Tribunal de Contas, bem como as disposições pormenorizadas sobre as outras instituições, constam no Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.
  4. O Parlamento Europeu, o Conselho e a Comissão são assistidos por um Comité Económico e Social Europeu e por um Comité das Regiões Europeu, que exercem funções consultivas.

Outra questão que se levanta acerca da «constituição» da UE é a da sua organização. Quais são as instituições da UE? Uma vez que exerce funções que habitualmente só os estados exercem, cabe perguntar se a UE tem um governo, um parlamento, autoridades administrativas e órgãos jurisdicionais tal como existem nos Estados-Membros. O exercício das atribuições conferidas à União e a coordenação do processo de integração não foram deliberadamente deixados exclusivamente à iniciativa dos Estados-Membros ou da cooperação internacional. Pelo contrário, a União Europeia assenta num sistema institucional que lhe permite conferir novos impulsos e novas metas para a União Europeia e, ao mesmo tempo, desenvolver, nas matérias da sua competência, normas jurídicas igualmente vinculativas para todos os Estados-Membros.

Os principais intervenientes do sistema institucional da UE são as instituições da UE, designadamente o Parlamento Europeu, o Conselho Europeu, o Conselho, a Comissão Europeia, o Tribunal de Justiça da União Europeia, o Banco Central Europeu e o Tribunal de Contas. Como instituições complementares surgem ainda no sistema institucional da UE o Banco Europeu de Investimento, o Comité Económico e Social Europeu e o Comité das Regiões.

As instituições

O Parlamento Europeu (artigo 14.º do TUE)

O Parlamento Europeu (PE) representa os povos dos Estados reunidos na UE. O PE nasceu da fusão da Assembleia Comum da CECA com a Assembleia da CEE e a Assembleia da CEEA, consagrada na Convenção de 1957 relativa a Certas Instituições Comuns às Comunidades (primeiro Tratado de Fusão), e que deu uma origem a uma única «assembleia». A designação oficial «Parlamento Europeu» surgiu apenas quando o Tratado UE foi alterado pelo Tratado que institui a União Europeia (Tratado de Maastricht), e que se limitou a usar uma designação de uso já generalizado que teve a sua origem na alteração do próprio nome da Assembleia para «Parlamento Europeu» em 1958.

Composição e eleição

A composição do Parlamento Europeu deverá ficar clara através da repartição que se segue, a qual reflete as condições vigentes para a atual legislatura 2014-2019.

ESTRUTURA DO PARLAMENTO EUROPEU

PRESIDENTE
14 vice-presidentes
5 questores (papel consultivo)

O presidente, o vice-presidente e os questores (membros do Parlamento Europeu com funções administrativas e financeiras) compõem a Mesa do Parlamento Europeu, eleita pelo Parlamento para um mandato de dois anos e meio. Existe também o órgão político denominado Conferência dos Presidentes, composto pelo presidente do Parlamento e pelos presidentes dos grupos políticos. Este órgão é responsável pela organização do trabalho do Parlamento e pelas relações com as restantes instituições da UE e com outras instituições extracomunitárias.

SESSÃO PLENÁRIA DO PARLAMENTO EUROPEU COM 751 DEPUTADOS

Estado-MembroLugares no Parlamento Europeu
Alemanha 96
França 74
Itália 73
Reino Unido 73
Espanha 54
Polónia 51
Roménia 32
Países Baixos 26
Bélgica 21
República Checa 21
Grécia 21
Hungria 21
Portugal 21
Suécia 20
Áustria 18
Bulgária 17
Dinamarca 13
Eslováquia 13
Finlândia 13
Irlanda 11
Croácia 11
Lituânia 11
Letónia 8
Eslovénia 8
Estónia 6
Chipre 6
Luxemburgo 6
Malta 6

Até 1979, o Parlamento Europeu era composto por deputados dos parlamentos nacionais, escolhidos pelos respetivos colegas de bancada, e que eram enviados para o Parlamento Europeu. A eleição dos deputados do Parlamento Europeu pela população dos Estados-Membros por sufrágio universal direto, já prevista nos Tratados, só em 1979 se tornou realidade, após várias tentativas infrutíferas. As primeiras eleições diretas para o PE tiveram lugar em junho desse ano e a partir de então de cinco em cinco anos, no termo de cada legislatura. Após décadas de esforços foi introduzido um processo eleitoral uniforme, com o ato relativo à eleição dos representantes ao Parlamento Europeu por sufrágio universal direto em 1976, que posteriormente sofreu uma reforma profunda com o ato relativo às eleições diretas em 2002. Desde então cada Estado-Membro estabelece o seu próprio processo eleitoral mas utiliza as mesmas regras democráticas fundamentais:

  • sufrágio direto e universal;
  • representação proporcional;
  • voto livre e secreto;
  • idade mínima (para se ter o direito de voto todos os Estados-Membros requerem a idade mínima de 18 anos, à exceção da Áustria, onde a idade mínima foi reduzida para os 16 anos);
  • mandatos de cinco anos renováveis;
  • incompatibilidade com o exercício de outros cargos (os deputados do PE não podem exercer simultaneamente outros cargos, por exemplo, magistrado, procurador-geral, ministro, etc.; estando ainda sujeitos à legislação do seu país, que pode impor restrições adicionais no que diz respeito à acumulação de mandatos ou cargos);
  • data do escrutínio;
  • e igualdade entre homens e mulheres. Em alguns países o exercício do voto é obrigatório (Bélgica, Grécia e Luxemburgo).

Além disso, em 2009 entrou em vigor um novo estatuto único do deputado, que torna mais transparentes as condições de trabalho dos deputados e comporta regras claras. Introduz também um vencimento único para todos os deputados que é suportado pelo orçamento da União Europeia.

Com o sufrágio universal, o Parlamento Europeu ganhou legitimidade democrática e pode agora aspirar a ser o «representante dos cidadãos da UE». Porém, a mera existência de um parlamento diretamente eleito não basta para responder à exigência fundamental de uma constituição democrática, nos termos da qual todos os poderes do Estado emanam do povo. Entre estes figuram, além da transparência no processo de tomada de decisões e da representatividade nos órgãos responsáveis pela adoção de decisões, também a supervisão pelo Parlamento da legitimidade das instituições da UE que participam no processo de tomada de decisões. Nesta matéria também foram conseguidos progressos consideráveis nos últimos anos. Deste modo não só foram sendo constantemente aumentados os direitos do Parlamento como também, com o Tratado de Lisboa, o funcionamento da União Europeia no seu conjunto passou a ter a obrigação expressa de respeitar o princípio fundamental da democracia representativa. Assim sendo, todos os cidadãos da União estão diretamente representados no Parlamento Europeu e têm o direito de participarem ativamente na vida democrática da União. Pretende-se deste modo garantir que as decisões ao nível da UE sejam tomadas com toda a transparência e proximidade dos cidadãos que for possível. Os partidos políticos ao nível da UE devem contribuir para a formação de uma consciência europeia e articular as aspirações dos cidadãos da União Europeia. Se quisermos falar de um défice ainda existente no atual ordenamento democrático da UE poderemos referir o facto de o Parlamento Europeu, ao contrário do que acontece no modelo nacional de democracia parlamentar, não escolher um governo que seja responsável perante o Parlamento.

O artigo 10.º do TUE (democracia representativa)

  1. O funcionamento da União baseia-se na democracia representativa.
  2. Os cidadãos estão diretamente representados, ao nível da União, no Parlamento Europeu.
  3. Os Estados-Membros estão representados no Conselho Europeu pelo respetivo chefe de Estado ou de Governo e no Conselho pelos respetivos governos, eles próprios democraticamente responsáveis, quer perante os respetivos parlamentos nacionais, quer perante os seus cidadãos.

  4. Todos os cidadãos têm o direito de participar na vida democrática da União. As decisões são tomadas de forma tão aberta e tão próxima dos cidadãos quanto possível.
  5. Os partidos políticos ao nível europeu contribuem para a criação de uma consciência política europeia e para a expressão da vontade dos cidadãos da União.

Este «défice» explica-se, aliás, pelo simples facto de não existir na UE um governo na sua forma convencional. Em vez disso, as funções equiparáveis à governação previstas nos Tratados da União são repartidas entre o Conselho e a Comissão Europeia. No entanto, ao Parlamento foram concedidos recentemente pelo Tratado de Lisboa amplos poderes na designação da Comissão, que vão desde a escolha do presidente da Comissão Europeia pelo Parlamento Europeu, por proposta do Conselho Europeu, até à aprovação pelo Parlamento Europeu de todo o elenco da Comissão Europeia (o chamado voto de confiança). Em contrapartida, o Parlamento não dispõe de influência comparável na composição do Conselho, pois este apenas está sujeito a uma supervisão parlamentar idêntica àquela a que está sujeito cada membro, na sua qualidade de ministro, por parte do Parlamento do seu país de origem.

O papel do Parlamento Europeu no processo legislativo da UE foi consideravelmente reforçado. Através da inclusão do processo de codecisão no processo legislativo ordinário, o Parlamento Europeu tornou-se, em conjunto com o Conselho, um quase colegislador. No âmbito do processo legislativo ordinário, o Parlamento pode apresentar em várias leituras alterações aos atos jurídicos e, dentro de determinados limites e em certos casos, impô-las com êxito ao Conselho. Sem acordo entre o Conselho e o Parlamento Europeu um ato jurídico da União não pode entrar em vigor.

Tradicionalmente o Parlamento desempenha também um papel determinante no processo orçamental. Com o Tratado de Lisboa os poderes orçamentais do Parlamento Europeu viram-se ampliados na medida em que o PE deve autorizar o quadro financeiro plurianual e participar na codecisão no que respeita a todas as despesas.

O Parlamento dispõe de um direito de emissão de parecer favorável em todos os acordos internacionais importantes que incluam algum domínio sujeito à codecisão, bem como nos Tratados de Adesão assinados com novos Estados-Membros e que estabeleçam as condições de adesão.

Também as funções de supervisão do Parlamento Europeu foram conhecendo substancial ampliação ao longo do tempo. A supervisão consiste sobretudo na obrigatoriedade para a Comissão de se justificar perante o Parlamento, defender as suas posições nas sessões plenárias públicas e elaborar anualmente um «relatório geral sobre a atividade da União Europeia» destinado ao Parlamento Europeu. Nesse momento, o Parlamento pode apresentar uma moção de censura que, se for aprovada por maioria de dois terços, implicará a demissão da Comissão Europeia (artigo 234.º do TFUE). Até agora já foram apresentadas diversas moções de censura no Parlamento Europeu, mas contudo nenhuma obteve a maioria necessária (2). Uma vez que o Conselho tem, na prática seguida pela União, de responder às perguntas do Parlamento Europeu, este tem a possibilidade de realizar um debate político direto com duas importantes instituições da UE do ponto de vista constitucional.

A primavera está no ar junto aos edifícios do Parlamento Europeu.

Estas possibilidades de supervisão política por parte do Parlamento foram entretanto ainda complementadas por outros mecanismos de controlo. O Parlamento pode também constituir comissões de inquérito para examinar casos de alegadas infrações ou má gestão administrativa na União. Em junho de 2016 foi criada uma dessas comissões devido às revelações no âmbito dos «Papéis do Panamá» acerca de empresas offshore e dos seus proprietários secretos. Competiu a esta comissão de inquérito investigar possíveis violações do direito da União relacionadas com branqueamento de capitais, elisão fiscal e evasão fiscal. Acresce que o Tratado garante às pessoas singulares e coletivas o direito de apresentarem petições ao Parlamento, sendo as mesmas examinadas pela Comissão das Petições, que é uma comissão permanente do PE. Por fim, o Parlamento fez valer o seu direito de designar um Provedor de Justiça Europeu (Ombudsman) encarregado de examinar queixas sobre as atividades das instituições ou dos órgãos comunitários, com exceção do Tribunal de Justiça. O Provedor pode ordenar a realização de inquéritos e dirigir-se à instituição em causa, e presta contas da sua atividade elaborando um relatório destinado ao Parlamento Europeu.

Sede

O Parlamento tem a sua sede em Estrasburgo, onde se realizam 12 sessões plenárias por ano, incluindo a sessão relativa ao orçamento. Outras sessões plenárias são realizadas em Bruxelas, onde os comités também se reúnem. Contudo, o Secretariado-Geral do Parlamento tem a sua sede no Luxemburgo. A decisão do Conselho de 1992 relativa a estas localizações foi confirmada no Protocolo n.º 6 do Tratado de Lisboa. Um resultado pouco satisfatório desta decisão é que os deputados do Parlamento Europeu, bem como uma parte dos seus funcionários e agentes, veem-se obrigados a deslocações frequentes a Estrasburgo, Bruxelas e ao Luxemburgo, o que é muito dispendioso.

O Conselho Europeu (artigo 15.º do TUE)

O Conselho Europeu reúne, pelo menos duas vezes por semestre em Bruxelas, os chefes de Estado e de Governo dos Estados-Membros e os presidentes da Comissão e do Conselho.

Composição e funções

COMPOSIÇÃO DO CONSELHO EUROPEU

Chefes de Estado e de Governo dos Estados-Membros
Presidente do Conselho Europeu
Presidente da Comissão Europeia
Alto-representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança

Funções

Define as orientações e prioridades políticas gerais da UE

O Tratado de Lisboa criou o cargo de presidente do Conselho Europeu. Este presidente, ao contrário da presidência que até então existia, dispõe de um mandato europeu, e não nacional como acontecia até agora, válido por dois anos e meio e que é exercido a tempo inteiro. Deverá ser designada para presidente uma personalidade destacada, sendo eleito por maioria qualificada dos membros do Conselho Europeu e podendo ser reeleito uma vez. As suas funções incluem a preparação e o seguimento a dar às sessões do Conselho Europeu, representando também a UE nas cimeiras internacionais no domínio da Política Externa e de Segurança.

O Conselho Europeu não exerce funções legislativas. A sua função é estabelecer as orientações políticas gerais da ação da UE. Estas orientações assumem a forma de «conclusões» que são adotadas por consenso e contêm decisões ou instruções básicas e orientações políticas destinadas ao Conselho ou à Comissão Europeia. Assim, a União Económica e Monetária, o sistema monetário europeu, a eleição do Parlamento por sufrágio universal direto, ações de política social e as questões da adesão contam-se entre as áreas de ação do Conselho Europeu.

O Conselho (artigo 16.º do TUE)

Composição e presidência

No Conselho da UE estão representados os governos dos Estados-Membros. Os 28 Estados-Membros enviam um representante, geralmente (mas não necessariamente) os ministros responsáveis pelas questões previstas para debate e/ou os respetivos secretários de Estado. É importante que o representante de cada Estado-Membro tenha poderes para vincular o seu governo. As diferentes possibilidades de representação de um governo de um Estado-Membro tornam claro que não existe um membro permanente do Conselho, pois o Conselho reúne com dez formações diferentes consoante o assunto a tratar.

AS DEZ FORMAÇÕES DO CONSELHO

Um representante do Governo de cada Estado-Membro ao nível ministerial, com uma composição que varia de acordo com o assunto a tratar

Presidida pelo alto-representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança:

  • Negócios Estrangeiros

Presidida pelo Estado-Membro que exerce a Presidência do Conselho:

  • Assuntos Gerais
  • Assuntos Económicos e Financeiros
  • Justiça e Assuntos Internos
  • Emprego, Política Social, Saúde e Consumidores
  • Competitividade
  • Transportes, Telecomunicações e Energia
  • Agricultura e pescas
  • Ambiente
  • Educação, Juventude, Cultura e Desporto

O Conselho dos Assuntos Externos configura a atuação externa da UE face aos objetivos estratégicos do Conselho Europeu e procura conferir coerência à atuação da União. O Conselho dos Assuntos Gerais coordena o trabalho do Conselho nas suas diferentes formações e prepara, em conjunto com os presidentes do Conselho Europeu e da Comissão, as reuniões do Conselho Europeu. A Presidência do Conselho é exercida rotativamente pelos Estados-Membros por períodos de seis meses, à exceção do «Conselho dos Negócios Estrangeiros», que é presidido pelo alto-representante da UE para a Política Externa e de Segurança. A ordem de ocupação do lugar é decidida por unanimidade pelo Conselho. As mudanças de presidência ocorrem em 1 de janeiro e 1 de julho de cada ano [2016: Países Baixos e Eslováquia; 2017: Malta e Estónia (3); 2018: Bulgária e Áustria; 2019: Roménia e Finlândia; 2020: Croácia e Alemanha, etc.]. Dada a mudança relativamente frequente da Presidência, cada uma elabora como base na sua atividade um programa de trabalho que é decidido em conjunto com as duas presidências seguintes, sendo assim válido por um período de 18 meses (o chamado «Trio de Presidências»). À presidência do Conselho cabe sobretudo orientar os trabalhos dos conselhos e respetivos comités no âmbito das suas competências. Para além disso, a presidência do Conselho assume também um protagonismo político na medida em que o Estado-Membro que ocupa a presidência é avaliado pela comunidade internacional, o que permite nomeadamente aos «pequenos» países «medir-se» também com os «grandes» no plano político e afirmar-se no contexto da política europeia.

A atividade do Conselho é preparada por um número considerável de instâncias preparatórias (comités e grupos de trabalho) compostas por representantes dos Estados-Membros. A instância preparatória mais importante é o Comité de Representantes Permanentes dos governos dos Estados-Membros («Coreper I e II»), que, regra geral, reúne pelo menos uma vez por semana.

O Conselho conta com o apoio de um Secretariado-Geral, composto por aproximadamente 2800 funcionários e sob a autoridade de um secretário-geral nomeado pelo Conselho.

O Conselho tem a sua sede em Bruxelas.

Funções

O Conselho tem cinco funções principais:

  • A tarefa mais prioritária do Conselho é a elaboração de legislação, que exerce no quadro do processo de codecisão em conjunto com o Parlamento Europeu.
  • Seguidamente cabe ao Conselho a tarefa de coordenar as políticas económicas dos Estados-Membros.
  • Desenvolve a política externa e de segurança comum com base nas orientações políticas definidas pelo Conselho Europeu.
  • O Conselho é a instituição responsável por celebrar acordos entre a União, por um lado, e países terceiros ou organizações internacionais, por outro.
  • O Conselho elabora ainda, com base num anteprojeto da Comissão Europeia, um orçamento que depois precisa ainda de obter a aprovação do Parlamento Europeu. É também o Conselho que recomenda ao Parlamento Europeu que dê quitação à Comissão pela execução do orçamento.

Compete ainda ao Conselho nomear os membros do Tribunal de Contas, do Comité Económico e Social Europeu e do Comité das Regiões.

Negociações e tomada de decisão no Conselho

É no âmbito das deliberações do Conselho que se constrói o equilíbrio entre os interesses dos Estados-Membros e os da União. Embora sejam os interesses nacionais que geralmente prevalecem ao nível do Conselho, os seus membros devem todavia ter presentes os objetivos e as necessidades de toda a UE. O Conselho é uma instituição da União, não é uma conferência governamental, razão pela qual as suas deliberações visam conseguir não o mais pequeno denominador comum entre os interesses dos Estados-Membros mas um equilíbrio ideal entre os interesses da União e os interesses da cada Estado-Membro.

As reuniões e decisões do Conselho baseiam-se exclusivamente em documentos e projetos apresentados nas 24 línguas oficiais (alemão, búlgaro, checo, croata, dinamarquês, eslovaco, esloveno, espanhol, estónio, finlandês, francês, grego, húngaro, inglês, irlandês, italiano, letão, lituano, maltês, neerlandês, polaco, português, romeno e sueco). Em caso de urgência, são possíveis derrogações a esta regra, desde que decididas por unanimidade. O mesmo se aplica às propostas de alteração apresentadas e discutidas no decurso de uma sessão.

Por força dos Tratados fundadores da UE, os votos no Conselho seguem fundamentalmente o princípio da regra da maioria: como princípio fundamental vigora a maioria qualificada (artigo 16.º, n.º 3, do TUE). Só em determinados domínios, em especial questões processuais, é que a maioria simples é suficiente, dispondo cada membro do Conselho de um voto (a maioria simples para os 28 Estados-Membros é alcançada com 15 votos).

De acordo com o sistema de dupla maioria, obtém-se uma maioria qualificada quando a proposta da Comissão é apoiada por pelo menos 55% dos membros do Conselho, abrangendo pelo menos dezasseis Estados-Membros representando pelo menos 65% da população da UE (artigo 16.º, n.º 4, do TUE).

Para evitar que Estados-Membros menos populosos impeçam a adoção de uma decisão está previsto que uma minoria de bloqueio deva ser composta por pelo menos quatro Estados-Membros, representando pelo menos 35% da população da UE. O sistema é completado com um mecanismo adicional: caso não se verifique uma minoria de bloqueio, o processo de decisão pode ser suspenso. Neste caso, o Conselho não procede à votação mas continua as negociações durante um «prazo razoável», caso membros do Conselho que representem pelo menos 75% da população ou pelo menos 75% do número de Estados-Membros assim o exijam como necessário para se formar uma minoria de bloqueio.

Federica Mogherini, alta-representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, Donald Tusk, presidente do Conselho Europeu e Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia, com Jens Stoltenberg, secretário-geral da NATO, na Cimeira da NATO em Varsóvia em 8/9 de julho de 2016.

Está prevista nos Tratados a unanimidade para decisões políticas em domínios especialmente sensíveis. Todavia, as abstenções não podem obstar à tomada de uma decisão. A unanimidade aplica-se também a decisões relativas a impostos, segurança social e proteção dos trabalhadores, à determinação de violações aos princípios constitucionais por um Estado-Membro, bem como decisões relativas à definição dos princípios no domínio da Política Externa e de Segurança Comum e respetiva aplicação ou decisões no domínio da cooperação policial e judiciária em matéria penal.

O alto-representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança (artigo 18.° TUE)

O cargo de alto-representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança não se tornou, como previa o projeto de constituição, no de ministro dos Negócios Estrangeiros da UE, embora a sua posição na estrutura institucional se tenha visto significativamente reforçada e alargada. O alto-representante tem, por isso, uma ligação ao Conselho, onde ocupa a presidência do Conselho de Assuntos Externos, e outra à Comissão, onde é vice-presidente responsável pelos Negócios Estrangeiros. O alto-representante é nomeado pelo Conselho Europeu, por maioria qualificada, com o aval do presidente da Comissão, sendo assistido pelo Serviço Europeu para a Ação Externa (SEAE), que foi criado em 2011 e é resultado da fusão dos departamentos de política externa da Comissão e do Conselho e da integração dos diplomatas dos serviços diplomáticos nacionais.

A Comissão Europeia (artigo 17.º do TUE)

COMPOSIÇÃO

28 membros
incluindo
Presidente
Primeiro vice-presidente
Alto-representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança
5 outros vice-presidentes
20 comissários

Funções

Iniciar a legislação da União

Monitorizar a observância e a adequada aplicação do direito da União

Administrar e aplicar a legislação da União

Representar a UE nas organizações internacionais

Composição

A Comissão Europeia é composta por 28 membros, um membro por cada Estado-Membro, ou seja, a Comissão conta atualmente com 28 comissários (que desempenham várias funções) (artigo 17.º, n.º 4, do TUE). No seguimento de uma decisão do Conselho Europeu, o disposto no artigo 17.º, n.º 5, do TUE de reduzir o número de membros da Comissão para dois terços do número de Estados-Membros a partir de 1 de novembro de 2011 não entrou em vigor.

A liderança da Comissão cabe ao seu presidente, que tem uma posição forte dentro da Comissão. O presidente já não é um mero «primeiro entre iguais», é alguém que goza de uma posição de destaque no sentido em que define as orientações no âmbito das quais a Comissão exerce a sua missão e também determina a organização interna da Comissão (artigo 17.º, n.º 6, alíneas a) e b), do TUE). Como tal, o presidente tem autoridade tanto para emitir orientações como para exercer o controlo organizacional. Investido destes poderes, o presidente é responsável por assegurar que a ação tomada pela Comissão é coerente, eficiente e cumpre o princípio da colegialidade, que está especialmente patente no facto de as decisões serem tomadas por um órgão colegial (artigo 250.º, n.º 1, do TFUE). Além disso, o presidente estrutura e distribui as responsabilidades que incumbem à Comissão entre os seus membros, podendo alterar a distribuição dessas responsabilidades durante o mandato da Comissão (artigo 248.º do TFUE). O presidente nomeia o primeiro vice-presidente e os outros vice-presidentes, com exceção do alto-representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, que é um vice-presidente ex officio da Comissão. Além disso, encontra-se expressamente previsto que qualquer membro da Comissão deve apresentar a sua demissão se o presidente lho pedir (artigo 17.º, n.º 6, segundo parágrafo, do TUE). Por último, a posição de destaque do presidente também está patente no direito que lhe assiste de ser ouvido em relação à seleção de outros membros da Comissão e no facto de ser membro do Conselho Europeu.

Os comissários constituem equipas de projeto sob a liderança de um vice-presidente, tratando cada equipa de um dos seguintes domínios políticos: 1. União da Energia resiliente dotada de uma política em matéria de alterações climáticas virada para o futuro; 2. Emprego, Crescimento, Investimento e Competitividade; 3. Mercado Único Digital; 4. Euro e Diálogo Social; 5. Orçamento e Recursos Humanos.

Os vice-presidentes atuam em nome do presidente da Comissão como seus representantes. São eles que orientam e coordenam o trabalho de vários comissários nos domínios da sua responsabilidade. O primeiro vice-presidente assume um papel especial, atuando como «braço direito» do presidente, sendo-lhe confiadas funções horizontais como a agenda «Legislar Melhor», as relações interinstitucionais, o Estado de direito e a Carta dos Direitos Fundamentais. Uma proposta da Comissão só chega a ser debatida na Comissão se for reconhecida como uma medida necessária pelo primeiro vice-presidente.

O presidente e os membros da Comissão são nomeados para um período de cinco anos através do procedimento de investidura, cujas regras foram alteradas pelo Tratado de Lisboa no artigo 17.º, n.º 6, do TUE. Este procedimento desenrola-se em várias etapas: em primeiro lugar, nomeia-se o presidente; em segundo lugar, são selecionadas as pessoas a nomear para membros da Comissão. Na terceira etapa, nomeiam-se oficialmente o presidente da Comissão, o Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança e os outros membros da Comissão.

Depois de proceder às consultas adequadas, o Conselho Europeu, deliberando por maioria qualificada, propõe ao Parlamento Europeu um candidato ao cargo de presidente da Comissão. Os resultados das eleições para o Parlamento Europeu devem ser tomados em consideração aquando da seleção do candidato para o cargo de presidente. Este novo requisito tem como objetivo aumentar o nível de politização da Comissão. Em última análise, tal significa que os grupos políticos que controlam uma maioria no Parlamento têm um peso significativo na nomeação do presidente.

Aquando da nomeação de Jean-Claude Juncker, o Parlamento acabou por forçar o Conselho a propor-lhe o candidato avançado pelo grupo político maioritário no Parlamento (PPE). Para o efeito, o Parlamento utilizou a regra de que, se o candidato ao cargo de presidente for recusado pelo Parlamento, o Conselho, deliberando por maioria qualificada, deve propor um novo candidato no prazo de um mês a contar da decisão do Parlamento, que será nomeado em conformidade com o mesmo procedimento. Isto confere um valor considerável à nomeação pelos partidos de Spitzenkandidaten, ou candidatos de primeira linha, para as eleições parlamentares e torna mais visível para os cidadãos a importância da participação, uma vez que o seu voto contribui de forma indireta para a eleição do presidente da Comissão. O Parlamento elege o candidato proposto por maioria dos seus membros.

Uma vez eleito o presidente, o Conselho adota «por consenso» (artigo 15.º, n.º 4, do TUE) a lista das demais personalidades que tenciona nomear para membros da Comissão, que é elaborada de acordo com as propostas dos Estados-Membros. As pessoas são escolhidas em função da sua competência geral e do seu empenhamento europeu, devendo ser totalmente independentes no desempenho das suas obrigações. Uma maioria qualificada no Conselho é suficiente para nomear o alto-representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança (artigo 18.º, n.º 1, do TUE). O Conselho e o presidente eleito da Comissão devem chegar a consenso quanto aos candidatos. A nomeação do alto-representante exige mesmo o acordo expresso do presidente indigitado da Comissão. Os outros membros da Comissão não podem ser nomeados se o presidente eleito vetar a nomeação.

Uma vez eleito o presidente e nomeados o alto-representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança e os restantes membros da Comissão, o colégio está sujeito a um voto de aprovação do Parlamento Europeu. Contudo, os comissários indigitados devem primeiro responder às questões colocadas pelos deputados numa audição. As questões dizem habitualmente respeito a tópicos que se enquadram no âmbito previsto das suas responsabilidades e a posições pessoais quanto ao futuro da UE. Após a aprovação do Parlamento, para a qual é suficiente uma maioria simples, o presidente e os outros membros da Comissão são nomeados pelo Conselho, deliberando por maioria qualificada. A Comissão começa a exercer as suas funções assim que forem nomeados os seus membros.

A Comissão Europeia tem sede em Bruxelas.

Funções

A Comissão é o principal motor da política da UE. Está na origem de toda a ação da União, já que lhe compete apresentar ao Conselho propostas legislativas para a UE (o chamado direito de iniciativa da Comissão). A Comissão não desenvolve as suas atividades de acordo com as suas preferências, estando obrigada a agir quando o interesse da UE assim o exigir. Também o Conselho (artigo 241.º do TFUE), o Parlamento Europeu (artigo 225.º do TFUE) e um grupo de cidadãos da União (artigo 11.º, n.º 4, do TUE), no âmbito de uma iniciativa de cidadania, podem convidar a Comissão a elaborar uma proposta. À Comissão são atribuídos poderes legislativos primários apenas em casos pontuais (por exemplo no domínio do orçamento da UE, dos fundos estruturais, do combate à discriminação fiscal ou dos auxílios e cláusulas de salvaguarda). Bem mais vastos do que estes poderes legislativos primários são os poderes legislativos de execução das regras da União delegados na Comissão pelo Conselho e pelo Parlamento Europeu (artigo 290.º do TFUE).

Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia, durante o discurso sobre o estado da União em 14 de setembro de 2016 no Parlamento Europeu. Em segundo plano, é possível ver Frans Timmermans, primeiro vice-presidente, Federica Mogherini, vice-presidente e alta-representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, bem como outros membros da Comissão Europeia.

A Comissão é também «guardiã do direito da União». Vela pelo respeito e pela aplicação pelos Estados-Membros do direito primário e derivado da União. Em caso de violação do direito da União a Comissão instaura um procedimento por infração ao Tratado (artigo 258.º do TFUE) e pode, se necessário, recorrer ao Tribunal de Justiça. A Comissão intervém ainda em casos de infrações à legislação da União perpetradas por pessoas singulares ou coletivas, em especial infrações da lei europeia da concorrência, podendo também infligir pesadas sanções. Nos últimos anos, a luta contra o incumprimento das disposições da União tornou-se uma parte fulcral da atividade da Comissão.

Estreitamente ligada com a função de guardiã dos Tratados está a de representante dos interesses da União. A Comissão não pode por princípio defender outros interesses para além dos da União. Deve envidar todos os esforços nas negociações no Conselho, que são frequentemente difíceis, para fazer prevalecer o interesse da União e chegar a compromissos que tenham esse interesse em conta. É, pois, simultaneamente um papel de mediação entre os Estados-Membros, para o qual a sua neutralidade é especialmente apropriada e necessária.

Por último, a Comissão é — embora num âmbito limitado — um órgão executivo, designadamente no domínio do direito da concorrência, em que exerce as funções de uma autoridade administrativa clássica: analisa factos, concede autorizações, formula proibições e, se for o caso, inflige sanções. As competências administrativas da Comissão são também muito vastas no contexto dos fundos estruturais da UE e da execução orçamental. Regra geral, é todavia aos próprios Estados-Membros que compete velar pela execução das disposições da União em cada caso concreto. Esta solução, devidamente consagrada nos Tratados, tem a vantagem de aproximar os cidadãos de uma realidade para eles ainda um pouco «distante», a da ordem europeia, colocando-a sob a autoridade e no quadro familiar da ordem nacional.

ESTRUTURA ADMINISTRATIVA DA COMISSÃO EUROPEIA

Comissão
(28 membros) [Gabinetes]
Secretariado-Geral
Serviço Jurídico
Direção-Geral da Comunicação

Direções-gerais

  • Ação Climática
  • Agricultura e Desenvolvimento Rural
  • Ambiente
  • Assuntos Económicos e Financeiros
  • Assuntos Marítimos e Pescas
  • Centro Comum de Investigação
  • Comércio
  • Comunicação
  • Concorrência
  • Cooperação Internacional e Desenvolvimento
  • Educação, Juventude, Desporto e Cultura
  • Emprego, Assuntos Sociais e Inclusão
  • Energia
  • Estabilidade Financeira, Serviços Financeiros e União dos Mercados de Capitais
  • Eurostat — Estatísticas Europeias
  • Fiscalidade e União Aduaneira
  • Informática
  • Interpretação
  • Investigação e Inovação
  • Justiça e Consumidores
  • Mercado Interno, Indústria, Empreendedorismo e PME
  • Migração e Assuntos Internos
  • Mobilidade e Transportes
  • Orçamento
  • Política de Vizinhança e Negociações de Alargamento
  • Política Regional e Urbana
  • Proteção Civil e Operações de Ajuda Humanitária Europeias
  • Recursos Humanos e Segurança
  • Redes de Comunicação, Conteúdos e Tecnologias
  • Saúde e Segurança dos Alimentos
  • Secretariado-Geral
  • Serviço dos Instrumentos de Política Externa
  • Tradução

Serviços e organismos

  • Biblioteca Central
  • Centro Europeu de Estratégia Política
  • Responsável pela proteção de dados da Comissão
  • Serviço das Publicações
  • Serviço de Apoio à Reforma Estrutural
  • Serviço de Arquivo Histórico
  • Serviço de Auditoria Interna
  • Serviço de Gestão e Liquidação dos Direitos Individuais
  • Serviço de Infraestruturas e Logística (Bruxelas, Luxemburgo)
  • Serviço Europeu de Luta Antifraude
  • Serviço Europeu de Seleção do Pessoal
  • Serviço Jurídico

Sessão na Grande Secção do Tribunal de Justiça

O Tribunal de Justiça da União Europeia (artigo 19.º do TUE)

Nenhum ordenamento pode subsistir se as suas normas não forem controladas por uma autoridade independente. Além disso, numa União de estados, se as normas comunitárias estivessem sob controlo dos tribunais nacionais, elas seriam interpretadas e aplicadas diferentemente em cada estado. A aplicação uniforme do direito da União em todos os Estados-Membros seria assim posta em causa. Foram estes os motivos que, já em 1952, quando foi instituída a primeira Comunidade (CECA), levaram à criação de um tribunal que se tornaria em 1957 no órgão judicial para as duas outras Comunidades (C[E]E e CEEA), e que é hoje o órgão judicial da UE.

A jurisprudência passou entretanto a ser fixada em duas instâncias:

  • o Tribunal de Justiça como mais alta instância judicial na jurisdição europeia (artigo 253.º do TFUE) e
  • o Tribunal Geral (artigo 254.º do TFUE).

Para diminuir a sobrecarga do Tribunal de Justiça e melhorar a proteção jurídica na UE, o Conselho Europeu decidiu criar em 2004 no Tribunal Geral um tribunal especializado para litígios administrativos (ver artigo 257.º do TUE). Contudo, em 2015, a legislatura da União decidiu aumentar gradualmente o número de juízes do Tribunal Geral para 56 e transferir para esse tribunal a jurisdição do Tribunal da Função Pública. Este tribunal foi pois dissolvido em 1 de setembro de 2016.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Composição

28 juízes e
11 advogados-gerais
nomeados pelos governos dos Estados-Membros
de comum acordo por um período de seis anos

Tipos de processos

Ações por incumprimento dos Tratados: Comissão contra um Estado-Membro (artigo 258.º do TFUE); Estado-Membro contra Estado-Membro (artigo 259.º do TFUE)

Recursos de anulação e ações por omissão de uma instituição da UE ou um Estado-Membro (contra o PE e/ou o Conselho) relativamente a atos jurídicos ilegais ou omissão de atos jurídicos (artigos 263.º e 265.º do TFUE)

Reenvio prejudicial a pedido de um órgão jurisdicional de um Estado-Membro sobre a interpretação e a validade do direito da União (artigo 267.º do TFUE)

Recursos contra decisões do Tribunal Geral (artigo 256.º do TFUE)

O Tribunal de Justiça é a jurisdição suprema para todas as questões decorrentes do direito da União. Compete-lhe na generalidade e para esse efeito «garantir o respeito do direito na interpretação e aplicação dos Tratados».

Esta apresentação geral das suas funções comporta três domínios fundamentais:

  • controlo do respeito do direito da União, quer em termos da conduta das instituições da UE aquando da aplicação das disposições dos Tratados, quer em termos do cumprimentos das obrigações decorrentes do direito da União pelos Estados-Membros e pessoas singulares;
  • interpretação do direito da União;
  • desenvolvimento da legislação da União.

O Tribunal de Justiça desempenha estas funções através de atividades de consulta jurídica e de jurisprudência. A consulta jurídica assume os contornos de pareceres vinculativos sobre acordos que a União pretende celebrar com países terceiros ou organizações internacionais. O seu papel de instância jurisprudencial é, porém, muito mais significativo. Neste contexto, o Tribunal de Justiça tem competências que no sistema jurídico dos Estados-Membros estão repartidas por várias jurisdições. Assim, age enquanto jurisdição constitucional nos litígios entre as instituições da União e no controlo da legalidade da legislação da União; é uma jurisdição administrativa para verificar os atos administrativos adotados pela Comissão ou, indiretamente, pelas autoridades dos Estados-Membros (com base no direito da União); funciona enquanto jurisdição social e do trabalho para as questões atinentes à liberdade de circulação, à segurança social dos trabalhadores e à igualdade de tratamento entre homens e mulheres no mundo do trabalho; tem um papel de jurisdição financeira para questões de validade e interpretação das diretivas relativas a direito fiscal e aduaneiro, e é uma jurisdição cível para julgar ações de reparação de danos ou para a interpretação da legislação relativa ao reconhecimento e à execução das decisões judiciais em matéria cível e comercial.

O Tribunal Geral

O número de processos que dão entrada no Tribunal Geral tem crescido de uma forma constante com o passar do tempo, e irá aumentar ainda mais se pensarmos nos potenciais conflitos que poderão surgir com a aprovação de numerosas diretivas para a realização do mercado interno que terão de ser transpostas para o direito nacional. Outras dúvidas, a que o Tribunal terá, em última análise, de dar resposta já se prefiguram hoje no quadro do Tratado da União Europeia. Para diminuir a pressão sobre o Tribunal de Justiça foi criado, já em 1988, um Tribunal Geral.

O TRIBUNAL GERAL

Composição

atualmente 44 juízes
cada Estado-Membro tem de nomear pelo menos um juiz nomeados pelos governos dos Estados-Membros de comum acordo por um período de seis anos

Tipos de processos

Recursos de anulação e ações por omissão interpostos por pessoas singulares ou coletivas contra atos jurídicos ilegais ou omissão de atos jurídicos;
Ações interpostas por Estados-Membros contra a Comissão e/ou o Conselho no domínio das subvenções, em matéria de antidumping e dos poderes de execução (artigos 263.º e 265.º do TFUE)

O Tribunal Geral não é uma nova instituição da União, mas antes um órgão do Tribunal de Justiça da União Europeia que é independente e está organicamente separado do Tribunal de Justiça. Possui uma estrutura administrativa própria e um regulamento processual. Num intuito de clareza, os processos que dão entrada no Tribunal Geral são classificados com a letra «T» (= Tribunal), seguida do número (por exemplo, T-1/99), enquanto os do Tribunal de Justiça são classificados com a letra «C» (= Court), seguida do número (por exemplo, C-1/99).

O Tribunal começou por ter competência apenas para um número limitado de queixas, mas atualmente dispõe das seguintes competências:

  • em primeira instância, ou seja, sob a jurisdição do Tribunal de Justiça, o Tribunal Geral é responsável pelos recursos de anulação e ações por omissão interpostas por pessoas singulares e coletivas contra um órgão da União, ações interpostas por Estados-Membros contra a Comissão e/ou o Conselho no domínio das subvenções, do antidumping e dos poderes de execução, decisões com base numa cláusula compromissória contida num Tratado concluído pela UE ou por um seu representante e ações de reparação/indemnização de danos contra a UE;
  • está previsto que em determinados domínios especializados possam também ser delegadas no Tribunal Geral competências para reenvios prejudiciais, possibilidade que no entanto não foi ainda usada.

O Banco Central Europeu (artigos 129.º e 130º do TFUE)

O Banco Central Europeu (BCE) tem a sua sede em Frankfurt-am-Main e está no cerne da União Económica e Monetária, cabendo-lhe determinar o volume das emissões da moeda europeia, o euro, e sendo também o responsável pela estabilidade desta divisa (artigo 128.º do TFUE).

Para que o BCE possa levar a bom termo a sua missão, inúmeras são as disposições que consagram a sua independência. Nem o BCE nem nenhum banco central de um Estado-Membro podem receber instruções das instituições da UE, dos governos dos Estados-Membros ou de qualquer outra entidade quando exercem os seus poderes e no cumprimento das suas atribuições e deveres. As instituições da UE e os governos dos Estados-Membros comprometem-se a não fazer qualquer tentativa neste sentido (artigo 130.º do TFUE).

O Sistema Europeu de Bancos Centrais (SEBC) compõe-se do BCE e dos bancos centrais dos Estados-Membros (artigo 129.º do TFUE). Cabe-lhe conceber e executar a política monetária da União, e só ele pode autorizar a emissão de notas e de moedas na União. Compete-lhe ainda gerir as reservas cambiais oficiais dos Estados-Membros e promover o bom funcionamento dos sistemas de pagamentos da União (artigo 127.º, n.º 2, do TFUE).

O Tribunal de Contas (artigos 285.º e 286.º do TFUE)

O Tribunal de Contas foi criado em 22 de julho de 1975 e iniciou funções em outubro de 1977 no Luxemburgo, tendo entretanto granjeado o estatuto de instituição da União (artigo 13.º do Tratado UE). É composto por 28 membros, o que corresponde ao número atual de Estados-Membros, que são nomeados, por um período de seis anos, pelo Conselho, que aprova por maioria qualificada uma lista elaborada pelos Estados-Membros com os membros propostos, após consulta do Parlamento Europeu (artigo 286.º, n.º 2, do TFUE). Os membros designam de entre si, por um período de três anos, o presidente do Tribunal de Contas, que pode ser reeleito.

O Tribunal de Contas tem como missão verificar a legalidade e regularidade das receitas e despesas da UE e assegurar-se de que a execução orçamental é correta. A verdadeira arma do Tribunal de Contas é o efeito mediático. Os resultados da sua atividade de fiscalização são compilados, após o encerramento do ano orçamental, num relatório anual que é publicado no Jornal Oficial da União Europeia, tornando-se assim conhecido da opinião pública. Além disso, o Tribunal de Contas pode, em qualquer altura, adotar posições relativamente a matérias específicas, que são igualmente publicadas no Jornal Oficial em relatórios extraordinários.

Organismo de política externa

Serviço Europeu de Ação Externa

O alto-representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança (artigo 18.º do TUE)

O cargo de alto-representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança não se tornou, como previa o projeto de constituição, no de ministro dos Negócios Estrangeiros da UE, embora a sua posição na estrutura institucional se tenha visto significativamente reforçada e alargada. O alto-representante tem, por isso, uma ligação ao Conselho, onde ocupa a presidência do Conselho de Assuntos Externos, e outra à Comissão, onde é vice-presidente responsável pelos Negócios Estrangeiros. O alto-representante é nomeado pelo Conselho Europeu, por maioria qualificada, com o aval do presidente da Comissão, sendo assistido pelo Serviço Europeu para a Ação Externa (SEAE), que foi criado em 2011 e é resultado da fusão dos departamentos de política externa da Comissão e do Conselho e da integração dos diplomatas dos serviços diplomáticos nacionais.

A repartição pelos Estados-Membros é feita da seguinte forma:

Número de membros no Comité Económico e Social Europeu e no Comité das Regiões, respetivamente
Alemanha, França, Itália, Reino Unido 24
Polónia, Espanha 21
Roménia 15
Bélgica, Bulgária, Grécia, Países Baixos, Áustria, Portugal, Suécia, República Checa, Hungria 12
Dinamarca, Finlândia, Irlanda, Croácia, Lituânia, Eslováquia 9
Letónia, Eslovénia 7
Estónia 6
Luxemburgo, Malta, Chipre 5

Os conselheiros estão organizados em três grupos (empregadores, trabalhadores e representantes da sociedade civil). Os pareceres que a assembleia plenária adota são elaborados por «grupos especializados». Acresce que o CESE coopera estreitamente com as comissões e os grupos de trabalho especializados do Parlamento Europeu.

Em determinadas circunstâncias, deve ser consultado no processo legislativo. Pode também emitir pareceres de sua própria iniciativa. Estes pareceres constituem uma síntese de posições por vezes muito díspares e extremamente úteis para a Comissão e o Conselho, na medida em que dão a conhecer as alterações que os grupos diretamente visados pelas propostas gostariam de nelas ver introduzidas.

O Comité das Regiões (artigo 305.º do TFUE)

Por força do Tratado que institui a União (Tratado de Maastricht) um novo órgão consultivo veio juntar-se ao CESE: o Comité das Regiões (CR). À semelhança do CESE, o CR não é uma instituição da UE, uma vez que só exerce funções consultivas e não desempenha — como as autênticas instituições da UE (Parlamento Europeu, Conselho Europeu, Conselho, Comissão Europeia, Tribunal de Justiça, Tribunal de Contas, Banco Central Europeu) — as funções cometidas à União de forma juridicamente vinculativa.

Tal como o CESE, o Comité das Regiões é composto por 350 membros, que representam as autoridades regionais e locais dos Estados-Membros que foram mandatadas para governar através de eleições, ou que respondem politicamente perante uma Assembleia eleita.

A consulta do CR pelo Conselho da UE ou pela Comissão é por vezes obrigatória («consulta obrigatória»), em especial quando se trata de questões da esfera da educação, cultura, saúde pública, redes transeuropeias, transportes, telecomunicações e infraestruturas energéticas, coesão económica e social, política de emprego e legislação social. Acresce que o Conselho consulta regularmente e sem obrigação jurídica o Comité das Regiões sobre diversos projetos legislativos («consulta facultativa»).

O Banco Europeu de Investimento (artigo 308.º do TFUE)

A UE dispõe, para o seu «desenvolvimento equilibrado e harmonioso», de um organismo financeiro sediado no Luxemburgo, o Banco Europeu de Investimento (BEI). O BEI tem como missão a concessão de empréstimos e garantias em todos os setores da economia, e sobretudo para desenvolver regiões menos desenvolvidas, modernizar ou reconverter empresas e criar novos postos de trabalho, assim como para projetos de interesse comum para vários Estados-Membros.

A ORDEM JURÍDICA DA UNIÃO EUROPEIA

A organização institucional da UE (a sua «constituição»), atrás descrita, principalmente no que respeita aos seus valores fundamentais, é inicialmente muito abstrata e para se tornar realidade necessita do direito da União. A UE é assim um fenómeno jurídico sob dois pontos de vista: é uma criação do direito e é uma ordem jurídica.

A UE, uma criação do direito e uma União baseada no direito

A característica decisivamente inovadora da UE em relação às tentativas anteriores reside no facto de que, para unificar a Europa, não usar a violência ou a submissão, mas antes a força do direito. Só uma união baseada no livre arbítrio poderá ter um futuro duradouro, uma união baseada em valores fundamentais, como a liberdade e a igualdade, e preservada e concretizada pelo direito. É neste entendimento que se baseiam os Tratados que criaram a União Europeia.

A Comunidade não só é uma criação do direito como também recorre exclusivamente ao direito na prossecução dos seus fins. Por outras palavras, é uma União baseada no direito. É o direito da União, não a força do poder, que regula a coexistência económica e social dos cidadãos dos Estados-Membros. É o direito da União que constitui a base do sistema institucional. É esse direito que define os processos de decisão das instituições da União e que regula as relações destas entre si. Atribui-lhes poderes de ação através de regulamentos, diretivas e decisões que podem ser aprovados e constituir atos jurídicos vinculativos para os Estados-Membros e seus nacionais. Os cidadãos tornam-se, assim, uma das principais preocupações da União e a ordem jurídica influencia cada vez mais diretamente a sua vida quotidiana. Confere-lhes direitos e impõe-lhes obrigações, quer como nacionais de um Estado quer como cidadãos da União, ficando assim estes submetidos a ordens jurídicas de níveis diferentes, tal como sucede num regime constitucional federal. Como em qualquer ordem jurídica, a ordem jurídica da UE constitui também um sistema fechado de proteção jurídica para litígios sobre o direito da União e para a sua aplicação. O direito da União determina igualmente as relações da UE com os Estados-Membros. Compete a estes tomar todas as medidas adequadas para cumprimento das obrigações que lhes incumbem por força dos Tratados ou dos atos das instituições da União. Compete-lhes ainda facilitar a ação da UE e abster-se de tomar quaisquer medidas suscetíveis de pôr em risco a realização dos objetivos dos Tratados. Os Estados-Membros respondem perante os cidadãos da UE por todos os danos causados pela violação do direito da União.

As fontes jurídicas do direito da União

O conceito de «fonte de direito» tem uma aceção dupla: o sentido inicial do termo aponta para a razão do nascimento do direito, isto é, a motivação na essência do direito. Assim, a fonte do direito da União foi a vontade de preservar a paz e de construir uma Europa mais próspera pela via da integração económica, as duas pedras basilares a que se deve a existência da União Europeia. Em linguagem jurídica, em contrapartida, o conceito de «fonte de direito» consubstancia a origem e a fundamentação do direito.

Os Tratados originários da UE enquanto direito primário da União

As primeiras fontes de direito primário são os Tratados originários da UE, incluindo os respetivos anexos e protocolos, bem como aditamentos e alterações posteriores. Os tratados originários e os respetivos aditamentos e alterações, sobretudo introduzidos pelos tratados de Maastricht, Amesterdão, Nice e Lisboa, bem como os diferentes Tratados de Adesão, contêm as normas jurídicas fundamentais relativas aos objetivos, à organização e ao modo de funcionamento da UE, bem como partes do seu direito económico. O mesmo se aplica à Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, que adquiriu o mesmo valor jurídico que os Tratados desde a entrada em vigor do Tratado de Lisboa (artigo 6.º, n.º 1, do TUE). São pois as disposições «constitucionais» de enquadramento da UE que proporcionam às instituições da União um quadro para o exercício das suas competências legislativas e administrativas no interesse da UE. Uma vez que se trata de direito criado diretamente pelos Estados-Membros, ele é designado, em linguagem jurídica, por direito primário da União.

Os atos jurídicos da UE enquanto direito derivado da União

O direito criado pelas instituições da União no exercício das suas competências derivadas tem a designação de direito derivado da União Europeia e é a segunda fonte importante do direito da UE.

Resulta de atos legislativos, atos não legislativos (instrumentos jurídicos simples, atos delegados, atos de execução), instrumentos não vinculativos (pareceres, recomendações) e outros atos que não são atos jurídicos (por exemplo, acordos interinstitucionais, resoluções, declarações, programas de ação). Os «atos legislativos» são atos jurídicos adotados no processo legislativo ordinário ou num processo legislativo especial (artigo 289.º do TFUE). Os «atos delegados» (artigo 290.º do TFUE) são atos jurídicos sem cariz legislativo, mas com uma aplicação geral e vinculativa, que permitem alterar ou completar determinados elementos não essenciais de um ato legislativo. São adotados pela Comissão, instituição na qual deve ser delegado expressamente o poder por meio de um ato legislativo. Caso a execução de atos jurídicos vinculativos da UE requeira o estabelecimento de condições uniformes de execução, tal será feito através dos respetivos atos de execução, que regra geral são aprovados pela Comissão e excecionalmente também pelo Conselho (artigo 291.º do TFUE). As instituições da União podem emitir recomendações e pareceres sob a forma de instrumentos não vinculativos. Existe finalmente toda uma série de «atos que não são atos jurídicos» que permitem às instituições da União emitir declarações e comunicados não vinculativos, ou que regulam a vida interna da UE ou das suas instituições, como é o caso dos regulamentos consensuais, ou dos acordos interinstitucionais, ou dos regulamentos internos das instituições.

Estes atos legislativos e não legislativos podem assumir formas totalmente distintas, sendo que os mais importantes estão enumerados e definidos no artigo 288.º do TFUE. Nos atos jurídicos vinculativos estão incluídos regulamentos, orientações e decisões. Nos atos jurídicos não vinculativos estão incluídos recomendações e pareceres. Contudo, a lista dos atos enunciados não é exaustiva. Existem muitos outros atos jurídicos que não se enquadram em categorias específicas. Contam-se entre estes as resoluções, as declarações, os programas de ação ou os livros brancos e verdes. Existem diferenças consideráveis entre as diferentes formas de ação no que se refere ao procedimento de adoção, às suas consequências jurídicas e aos seus destinatários, e por isso iremos estudar essas diferenças mais adiante num capítulo especificamente dedicado aos «instrumentos de ação» da União.

O direito derivado da União está a ser criado de uma forma paulatina e progressiva, e a sua adoção confere vitalidade ao direito primário da União criado pelos Tratados da UE, assim se construindo e completando, gradualmente, a ordem jurídica europeia.

Acordos internacionais da União Europeia

Esta terceira fonte de direito da União está ligada ao papel da UE no plano internacional. Como um dos polos do mundo, a Europa não pode limitar-se a ter nas suas mãos apenas a gestão dos seus assuntos internos e deve, pelo contrário, procurar desenvolver as relações económicas, sociais e políticas com outros países do mundo. Com este objetivo, a UE celebra com os «países não membros» da UE (os chamados países terceiros) e com outras organizações internacionais acordos de direito internacional. Os acordos apresentados a seguir são particularmente relevantes:

Acordos de associação

A associação é algo que ultrapassa a pura regulamentação de questões de política comercial e visa uma cooperação económica estreita associada a um vasto apoio financeiro da UE aos parceiros envolvidos (artigo 217.º do TFUE). Distinguem-se três tipos de acordos de associação.

Acordos destinados a salvaguardar relações especiais de certos Estados-Membros da UE com países terceiros

Motivo para a criação do instrumento de associação foi sobretudo a existência de países e territórios ultramarinos que mantinham relações económicas muito estreitas com a Bélgica, a Dinamarca, a França, a Itália, os Países Baixos e o Reino Unido e que tinham sido suas colónias. Uma vez que a introdução de uma regulamentação aduaneira comum na UE iria prejudicar consideravelmente o comércio externo com esses territórios, havia que adotar disposições especiais. A finalidade da associação é promover o desenvolvimento económico e social dos países e territórios e estabelecer relações económicas estreitas entre eles e a União no seu conjunto (artigo 198.º do TFUE). Existe, por isso, toda uma série de regulamentos preferenciais que possibilitam a importação de mercadorias provenientes destes países e territórios com redução ou até mesmo isenção de direitos aduaneiros. A ajuda financeira e técnica da UE processa-se através do Fundo Europeu de Desenvolvimento. Na prática, os acordos de longe mais importantes são os acordos de parceria UE-ACP, que ligam a UE a 70 países de África, das Caraíbas e do Pacífico (ACP). Estes acordos estão atualmente a ser convertidos em acordos de parceria económica, destinados a proporcionar progressivamente aos países ACP um livre acesso ao mercado interno europeu.

A Noruega (vista do fiorde Geiranger, província de Møre og Romsdal) é membro do Espaço Económico Europeu, que também inclui a Islândia, o Listenstaine e os 28 Estados-Membros da UE. As quatro liberdades (livre circulação de mercadorias, pessoas, serviços e capitais) são aplicáveis no Espaço Económico Europeu.

Acordos que visam preparar uma eventual adesão e criar uma união aduaneira

A associação pode também destinar-se a preparar a eventual adesão de um país à União Europeia. Trata-se de um passo que antecede uma eventual adesão e que se destina a aproximar as condições económicas do país candidato à adesão das condições existentes na UE. Esta estratégia está atualmente a ser implementada nos países dos Balcãs Ocidentais (Albânia, Bósnia-Herzegovina, Sérvia, Montenegro, Kosovo). Nestes casos, o processo de adesão está a ser apoiado por um processo alargado de estabilização e associação que irá proporcionar o quadro alargado necessário para uma aproximação dos países dos Balcãs Ocidentais à UE até à sua adesão no futuro. O processo de estabilização e associação procura alcançar três objetivos: 1. estabilização e rápida transição para uma economia de mercado viável; 2. promoção da cooperação regional; 3. perspetiva de adesão à UE. O processo de estabilização e associação baseia-se numa parceria progressiva em que a UE oferece concessões comerciais, apoio económico e financeiro, bem como uma relação contratual sob a forma de Acordos de Estabilização e Associação. Importa que cada país consiga fazer progressos no quadro do processo de estabilização e associação por forma a cumprir os requisitos para uma eventual adesão. Os progressos alcançados pelos países dos Balcãs Ocidentais no sentido de uma eventual adesão à UE são avaliados através de relatórios anuais.

Acordo relativo ao Espaço Económico Europeu (EEE)

O Acordo EEE proporcionou aos (restantes) países da Associação Europeia de Comércio Livre (EFTA) (Islândia, Listenstaine e Noruega) o acesso ao mercado interno da UE, ao mesmo tempo que lançou os alicerces seguros para uma eventual ulterior adesão destes países à UE, impondo-lhes a adoção de cerca de dois terços da legislação da União. Este processo visa concretizar a livre circulação de mercadorias, pessoas, serviços e capitais no EEE, com base no direito primário e derivado («acervo comunitário») da União, criar um regime uniforme de concorrência e de subvenções e reforçar a cooperação nas políticas horizontais e de acompanhamento (por exemplo, nos domínios da proteção do ambiente, da investigação e do desenvolvimento, ou ainda na esfera da educação).

Acordos de cooperação

Os acordos de cooperação não vão tão longe quanto os acordos de associação, na medida em que preveem apenas uma cooperação económica intensiva. A UE tem acordos deste tipo com os países do Magrebe (Marrocos, Argélia e Tunísia), os países do Machereque (Egito, Jordânia, Líbano e Síria) e com Israel.

Acordos comerciais

Por último, foram celebrados inúmeros acordos comerciais em matéria de política aduaneira e comercial com países terceiros, grupos de países terceiros ou ainda no âmbito de organizações comerciais internacionais. Os acordos comerciais internacionais mais importantes são: o Acordo que institui a Organização Mundial do Comércio (Acordo OMC) e os acordos comerciais multilaterais dele decorrentes, incluindo em especial o Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio (GATT 1994); o Código Antidumping e Antissubvenções, o Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços (GATS); o Acordo sobre os Aspetos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados com o Comércio (TRIPS); e o Memorando de Entendimento sobre as Regras e Processos que regem a Resolução de Litígios. Contudo, os acordos bilaterais de comércio livre têm vindo a ganhar cada vez mais terreno em relação aos acordos multilaterais. Devido às enormes dificuldades inerentes à celebração de acordos de liberalização multilaterais no quadro da OMC, por exemplo, todas as potências comerciais, incluindo a UE, começam a preferir celebrar acordos bilaterais de comércio livre. Os exemplos mais recentes são a conclusão bem-sucedida das negociações com o Canadá (Acordo Económico e Comercial Global — CETA) e com Singapura, bem como as negociações ainda em curso com os Estados Unidos (Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento — TTIP) e com o Japão.

As fontes não escritas do direito

Todas as fontes de direito até aqui descritas têm em comum o facto de serem fontes de direito escrito da União. Como qualquer outra ordem jurídica, também a ordem jurídica da UE não pode ser constituída apenas por normas escritas, pois todas as ordens jurídicas têm lacunas que deverão ser colmatadas por direito não escrito.

Os princípios gerais do direito

Os princípios gerais do direito são fontes não escritas do direito da União. Trata-se de normas que traduzem conceitos fundamentais de direito e justiça, às quais qualquer ordem jurídica está obrigada. O direito escrito da União, que fundamentalmente só regula situações económicas e sociais, cumpre esta obrigação apenas em parte; desta forma, os princípios gerais de direito são uma das fontes mais importantes do direito da União. Os referidos princípios permitem colmatar as lacunas existentes ou desenvolver de forma mais justa o direito estabelecido através de interpretação, recorrendo ao princípio da equidade.

A concretização destes princípios é feita através da aplicação do direito, principalmente através da jurisprudência do Tribunal de Justiça da UE, que, no âmbito das suas atribuições, «garante o respeito do direito na interpretação e aplicação do Tratado». Os principais pontos de referência para determinar os princípios gerais de direito são os princípios gerais comuns às ordens jurídicas dos Estados-Membros. Fornecem o material a partir do qual se cria, no âmbito do direito da UE, a regra necessária à solução de um problema.

Paralelamente aos princípios da autonomia, da aplicabilidade direta e do primado do direito da União, existem outros princípios jurídicos que incluem a proteção dos direitos fundamentais (pelo menos para a Polónia e o Reino Unido, que não estão sujeitos à Carta dos Direitos Fundamentais devido à cláusula de exclusão), o princípio da proporcionalidade (que foi efetivamente regulamentado por uma disposição positiva no artigo 5.º, n.º 4, do TUE), o princípio da proteção da confiança legítima, o direito à justiça ou ainda o princípio da responsabilidade dos Estados-Membros em caso de violação do direito da União.

O direito consuetudinário

O direito consuetudinário também faz parte das fontes não escritas do direito da União e pode definir-se como o direito que nasce da prática e da convicção jurídica e que completa ou altera o direito primário ou o derivado. A possibilidade da existência do costume no direito da União é, em princípio, reconhecida. Todavia, levantam-se consideráveis restrições na prática à real constituição do direito consuetudinário ao nível do direito da União. Uma primeira dificuldade é a que decorre da existência de um procedimento especial para a revisão dos Tratados (artigo 54.º do TUE) que, apesar de não excluir pura e simplesmente a constituição do direito consuetudinário, determina uma maior dificuldade quanto ao cumprimento dos critérios a estabelecer para fazer prova da sua existência e da respetiva certeza jurídica. A segunda dificuldade resulta do facto de a validade de qualquer ato das instituições da União só poder ser apreciada à luz dos Tratados da UE e não do comportamento real ou da vontade da instituição de criar relações jurídicas. Em consequência, e de acordo com os Tratados, o direito consuetudinário não pode de forma alguma ser estabelecido pelas instituições da União, mas só eventualmente pelos Estados-Membros e apenas em conformidade com os rigorosos critérios já mencionados. Os procedimentos e as certezas jurídicas dos órgãos da União não podem, no entanto, resultar da interpretação das disposições jurídicas emanadas destas instituições, o que, dependendo das circunstâncias, pode alterar significativamente as consequências de caráter jurídico e prático do ato jurídico em questão, devendo, no entanto, ser também devidamente considerados os requisitos e restrições estipulados pelo direito primário da União.

Acordos entre os Estados-Membros da União Europeia

Como última fonte de direito da UE são de mencionar os acordos celebrados entre Estados-Membros. Trata-se, por um lado, de acordos com vista à regulamentação de questões que têm ligação estreita com a atividade da UE, mas para as quais nenhuma competência foi atribuída às instituições da União (por exemplo, o Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária, conhecido como «Pacto Orçamental 2012», que foi celebrado sem o Reino Unido e a República Checa). Por outro, existem verdadeiros acordos internacionais (tratados e convenções) entre Estados-Membros, visando, nomeadamente, alargar o campo de aplicação das normas nacionais e criar um direito uniformemente aplicável na União. Estes acordos são da maior importância no domínio do direito privado internacional [por exemplo, a Convenção sobre a lei aplicável às obrigações contratuais (1980)].

Os instrumentos de ação da União Europeia

O sistema legislativo da União teve de ser «concebido» aquando da criação da UE. A principal questão que se levantou na altura foi qual a natureza e efeitos que a legislação devia ter. Considerou-se, por um lado, que as instituições deviam estar em condições de harmonizar de forma eficaz, isto é, sem dependerem da boa vontade dos Estados-Membros, as diversas e desiguais condições económicas, sociais e até ecológicas destes países, de forma que todos os cidadãos da União tivessem as melhores condições de vida possíveis. Por outro lado, as instituições só deviam interferir nas ordens jurídicas nacionais na medida em que fosse necessário. Todo o sistema de ação jurídica e jurisprudência da UE obedece, por isso, ao princípio segundo o qual quando é necessária uma regulamentação comum a todos os Estados-Membros, inclusive nos pormenores, as disposições nacionais devem ser substituídas por um ato comunitário, mas quando não existe tal necessidade há que atender às ordens jurídicas dos Estados-Membros.

Foi com este pano de fundo que se desenvolveram os instrumentos que permitem às instituições da União incidir, em graus diferentes, sobre os ordenamentos jurídicos nacionais. A forma extrema desta ação é a substituição das normas nacionais por normas da União. Seguem-se as normas que permitem às instituições da União incidir apenas indiretamente sobre o ordenamento jurídico dos Estados-Membros. Prevê-se ainda a possibilidade de, para a regulamentação de casos concretos, serem tomadas medidas em relação a um destinatário determinado ou determinável. Por último, estão previstos também atos jurídicos que não contêm qualquer disposição vinculativa para os Estados-Membros ou para os cidadãos da União.

Apresentam-se no quadro a seguir os instrumentos jurídicos do sistema normativo da UE, na perspetiva dos destinatários e dos efeitos que produzem nos Estados-Membros, com base no artigo 288.º do TFUE.

Regulamentos como «leis» da União

Os atos jurídicos através dos quais as instituições da União podem interferir mais profundamente nas ordens jurídicas nacionais são os regulamentos, que têm duas características não habituais no direito internacional:

  • A primeira característica é o seu caráter comunitário, que consiste na particularidade de imporem um direito igual a toda a União sem ter em conta as fronteiras e com validade uniforme e integral em todos os Estados-Membros. Isto significa que um Estado-Membro não pode, por exemplo, aplicar as disposições de um regulamento apenas parcialmente ou decidir quais as que irá aplicar para, desse modo, excluir as normas a que um Estado-Membro já se tenha oposto durante o processo de decisão ou que sejam contrárias a certos interesses nacionais. Os Estados-Membros também não podem recorrer a normas ou usos do direito nacional para se subtraírem à obrigatoriedade das disposições dos regulamentos.
  • A segunda característica é a sua aplicabilidade direta, ou seja, o facto de o disposto nos regulamentos estabelecer um mesmo direito que não carece de normativas especiais de aplicação de caráter nacional, conferindo direitos e impondo obrigações diretamente aos cidadãos da União. Os Estados-Membros, incluindo as suas instituições, tribunais e autoridades, estão diretamente vinculados ao direito da União e devem respeitá-lo da mesma forma que o direito nacional.

As similitudes destes atos jurídicos com as leis nacionais são manifestas e, enquanto forem adotados no âmbito do chamado processo legislativo ordinário com o Parlamento Europeu (ver capítulo seguinte), serão considerados «atos legislativos». Aos regulamentos que emanam exclusivamente do Conselho Europeu e da Comissão Europeia falta-lhes esta componente de corresponsabilização parlamentar, e assim, pelo menos formalmente, não apresentam todas as características essenciais de uma lei.

Diretivas

A diretiva é, juntamente com o regulamento, o instrumento de ação mais importante da UE. Trata-se de um ato através do qual se procura conciliar a necessária unidade do direito da União com a manutenção das diversas peculiaridades nacionais. Assim, o principal objetivo da diretiva não é (como no caso do regulamento) a unificação do direito, mas antes uma aproximação das diversas legislações que permita eliminar as contradições e os conflitos entre as disposições legislativas e administrativas dos Estados-Membros ou suprimir paulatinamente as diferenças, de modo a que sejam criadas nos diversos Estados-Membros condições tão idênticas quanto possível. Em consequência, a diretiva é um dos instrumentos básicos para a consecução do mercado interno.

A diretiva vincula os Estados-Membros apenas quanto ao resultado a alcançar, deixando às instâncias nacionais a competência quanto à forma e aos meios para realizar os objetivos estabelecidos pela União no quadro da ordem jurídica nacional. Esta participação dos Estados-Membros reflete a intenção de intervir na estrutura jurídica e administrativa nacional de forma mais atenuada, o que permite ter em conta as particularidades dos Estados-Membros na realização dos objetivos da União. As disposições de uma diretiva não substituem automaticamente as do direito nacional; são os Estados-Membros que ficam obrigados a transpor para o direito nacional as normas da União, o que implica a necessidade de um procedimento de criação do direito dividido em duas fases:

Na primeira fase, ao nível da UE, a diretiva estabelece o objetivo proposto de forma vinculativa para os destinatários, que são vários ou todos os Estados-Membros, e que deverão realizá-lo num prazo determinado. As instituições da União podem determinar esse objetivo através de normas de tal modo pormenorizadas que os Estados-Membros não disponham de espaço de manobra para dar uma configuração própria às suas disposições de transposição. É o que se passa sobretudo no âmbito das normas técnicas, bem como do ambiente.

A Diretiva 2012/27/UE de 25 de outubro de 2012 (Diretiva «Eficiência energética») contém um pacote de medidas vinculativas destinadas a contribuir para a consecução do objetivo da UE de aumentar, até 2020, a eficiência energética em 20%. Os Estados-Membros deveriam ter transposto a diretiva para o direito nacional até 5 de junho de 2014.

Na segunda fase, ao nível nacional, a realização do objetivo previsto no dispositivo da UE compete ao direito nacional de cada um dos Estados-Membros. Embora os Estados-Membros tenham essencialmente liberdade para escolher a forma e os meios da transposição, a avaliação para determinar se a transposição dessas normas se efetuou de acordo também com o direito da União é feita segundo os critérios da própria UE. O princípio fundamental a respeitar é o da criação de uma situação jurídica que permita reconhecer de forma suficientemente clara e precisa os direitos e as obrigações emanados da diretiva, de modo a que os cidadãos da União os possam invocar perante os órgãos jurisdicionais nacionais ou oporem-se a eles. Para esse efeito, é sempre necessária a adoção de um ato jurídico nacional de caráter vinculativo ou a supressão ou a alteração de disposições legislativas, regulamentares e administrativas vigentes. Uma simples prática administrativa não é suficiente, já que a mesma, em virtude da sua própria natureza, pode ser alterada conforme o entender a administração de tutela e não goza de publicidade suficiente.

As diretivas não criam normalmente direitos e obrigações diretos para e contra os cidadãos da União, sendo seus destinatários expressos apenas os Estados-Membros. Os cidadãos da União só ficam, em contrapartida, sujeitos a direitos e obrigações quando as autoridades competentes dos Estados-Membros realizam os atos de execução. Em princípio, pouco importa aos cidadãos da UE a forma como os Estados-Membros dão cumprimento às obrigações que lhes incumbem por força dos atos de direito da União. Porém, se os Estados-Membros não aprovarem, ou aprovarem de forma deficiente, o necessário ato de execução os cidadãos poderão vir a ser prejudicados se o objetivo previsto pela diretiva lhes proporcionava um benefício efetivo. Para evitar estes inconvenientes, o Tribunal de Justiça tem reiteradamente afirmado na sua jurisprudência que os cidadãos também podem, sob certas condições, fazer valer as disposições de uma diretiva e invocar os direitos nela previstos, bem como, se tal for o caso, invocá-los perante os órgãos jurisdicionais nacionais. O Tribunal de Justiça estabeleceu as condições necessárias para que a diretiva possa produzir esses efeitos diretos:

  • as disposições da diretiva devem determinar os direitos dos cidadãos e das empresas da União de forma suficientemente clara e precisa;
  • a invocação desses direitos não deve estar sujeita a qualquer condição ou obrigação;
  • o legislador nacional não deve dispor de qualquer margem de apreciação acerca da definição do conteúdo desses direitos; e
  • o prazo de transposição da diretiva deverá ter terminado.

Esta jurisprudência do Tribunal de Justiça sobre o efeito direto das diretivas baseia-se essencialmente na consideração de ordem geral de um Estado-Membro se estar a comportar de forma abusiva e contrária ao direito sempre que continua a aplicar a sua anterior legislação quando já está obrigado a respeitar o objetivo previsto nas disposições da diretiva. Este comportamento por parte de um Estado-Membro é abusivo e o reconhecimento do efeito direto da diretiva pretende evitar que o Estado-Membro em questão obtenha qualquer vantagem com a inobservância do direito comunitário. Assim, o efeito direto tem caráter de sanção para o Estado-Membro. Neste contexto, é significativo que o Tribunal de Justiça só tenha aplicado o princípio do efeito direto em processos entre cidadãos e Estados-Membros e só quando a aplicação da diretiva beneficia o cidadão da União, e não quando o prejudica, ou, por outras palavras, quando a situação do cidadão perante a lei alterada pela diretiva é mais favorável do que perante a lei inalterada (o chamado «efeito direto vertical»).

Em contrapartida, o Tribunal de Justiça ainda não reconheceu o efeito direto das diretivas nas relações entre os próprios cidadãos (o chamado «efeito direto horizontal»). O Tribunal considera, devido ao próprio caráter de sanção do efeito direto, que este não pode ser aplicado a relações entre particulares, uma vez que estes não podem ser responsabilizados pela omissão do Estado-Membro, sendo preferível que se baseiem antes nos princípios da segurança jurídica e da garantia da confidencialidade. Os cidadãos da União devem estar confiantes de que ficarão sujeitos aos efeitos de uma diretiva apenas em função das medidas nacionais de transposição. Contudo, o Tribunal de Justiça desenvolveu um princípio de direito primário segundo o qual o conteúdo de uma orientação também é aplicável a questões de direito privado, desde que dê expressão à proibição geral de discriminação. O conceito do Tribunal de Justiça vai além da proibição de discriminação, que, tal como consta das respetivas diretivas, obriga as autoridades nacionais e em especial os tribunais nacionais a proporcionar, dentro dos limites da sua jurisdição, a proteção jurídica que os indivíduos usufruem do direito da UE e assegurar a total eficácia desse direito, não aplicando se for caso disso qualquer disposição da legislação nacional que seja contrária a esse princípio. Por conseguinte, graças ao primado do direito da UE, a proibição da discriminação tal como definida nas respetivas diretivas sobrepõe-se ao direito nacional divergente. Como tal, embora não tenha posto em causa a sua jurisprudência sobre a falta de efeito horizontal das diretivas, o Tribunal acabou efetivamente por chegar a essa conclusão no que toca à proibição da discriminação em todos os processos onde se dá expressão a esta última numa diretiva. O Tribunal já antes considerou ser este o caso relativamente às orientações relacionadas com a tradicional discriminação em razão da nacionalidade, do sexo ou da idade. Contudo, trata-se de algo que deve ser aplicado a todas as orientações adotadas para combater as razões da discriminação enunciadas no artigo 19.º do TFUE.

O efeito direto de uma diretiva não implica necessariamente que uma disposição de uma diretiva confira direitos a um particular. Em vez disso, as disposições da diretiva exercem um efeito direto também na medida em que têm um efeito jurídico objetivo. Para reconhecer este efeito aplicam-se os mesmos requisitos que para o reconhecimento de um efeito direto, com a única diferença que em vez de um direito do cidadão ou da empresa da União definido com clareza e rigor é determinada uma obrigação do Estado-Membro com clareza e rigor. Sendo este o caso ficam todas as instituições, designadamente os legisladores, as administrações e os órgãos jurisdicionais dos Estados-Membros, vinculadas à diretiva e terão de a respeitar e aplicar ex officio como direito primário da União. Daqui resulta concretamente a obrigação de interpretar o direito nacional em conformidade com a diretiva («interpretação conforme à diretiva»), ou de fazer com que a disposição em causa da diretiva prevaleça sobre o direito nacional com que está em conflito. Além disso, as diretivas exercem determinados efeitos suspensivos sobre os Estados-Membros ainda antes de decorrido o prazo de transposição. No que se refere ao cariz vinculativo do objetivo de uma diretiva, e nos termos do princípio da cooperação leal com a União (artigo 4.º do TUE), os Estados-Membros, ainda antes de terminado o prazo de transposição, tomam todas as medidas para garantir que a realização do objetivo da diretiva não será seriamente posta em perigo.

Acresce que nos processos Francovich e Bonifaci, de 1991, o Tribunal de Justiça reconheceu que os Estados-Membros eram obrigados a pagar indemnizações por danos causados por ausência de transposição ou por transposição errónea. Em ambos os processos estava em causa a responsabilidade do Estado italiano pelo facto de a transposição da Diretiva 80/987/CEE do Conselho, de 20 de outubro de 1980, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes à proteção dos trabalhadores assalariados em caso de insolvência do empregador não ter sido feita no prazo previsto. Esta diretiva garantia o direito do trabalhador a remuneração durante o período anterior à declaração de insolvência do empregador ou ao despedimento por insolvência. Para esse fim deveriam ser criados fundos de garantia que não poderiam estar sujeitos à intervenção de outros credores dos empregadores e cujos meios financeiros resultariam de contribuições dos empregadores e/ou do Estado. O problema nestes processos residia no facto de a diretiva pretender conceder aos trabalhadores o direito de continuarem a receber uma remuneração a partir do fundo de garantia a criar. Ora, os tribunais nacionais estavam impedidos de assegurar a sua aplicabilidade direta, uma vez que, na ausência de transposição da diretiva, o fundo de garantia não tinha sido criado e não era possível determinar quem era o devedor das somas a pagar relacionadas com a situação de insolvência. O Tribunal de Justiça deliberou pois que o Estado italiano, ao não transpor a diretiva atempadamente, privou os trabalhadores em causa dos direitos instituídos pela diretiva, ficando consequentemente obrigado a indemnizá-los. Embora a obrigação de indemnizar não esteja expressamente prevista no direito da União, o Tribunal de Justiça considera-a parte integrante da ordem jurídica da UE, uma vez que a integridade da sua eficácia e os direitos por ela atribuídos estariam postos em causa se os cidadãos não tivessem a possibilidade de exigir e obter uma indemnização por violação dos seus direitos devido à atuação de um Estado-Membro contrária ao direito da União (4).

Decisões

O Tratado de Lisboa, com as «decisões», fez aumentar a variedade de instrumentos jurídicos. É possível distinguir entre duas categorias de decisões: decisões que especificam a quem se destinam e decisões gerais, que não especificam a quem se destinam (artigo 288.º, n.º 4, do TFUE). Enquanto as decisões que especificam a quem se destinam substituem as anteriores decisões que regulamentam casos individuais, as decisões gerais que não especificam a quem se destinam englobam uma variedade de instrumentos que têm em comum o facto de não regulamentarem casos individuais. Lamentavelmente, estes dois tipos de instrumentos jurídicos muito diferentes são designados com o mesmo nome, sendo que as inevitáveis questões de delimitação dão origem a muita incerteza jurídica. Teria sido melhor utilizar um termo para medidas que preveem casos individuais, com efeitos externos e juridicamente vinculativos para o indivíduo, e introduzir um outro termo para os outros instrumentos jurídicos com força vinculativa.

As instituições da UE (em especial o Conselho e a Comissão) utilizam habitualmente decisões que especificam a quem se destinam para desempenharem as suas funções executivas. Decisões deste tipo podem exigir que um Estado-Membro, uma empresa ou um cidadão da União aja ou se abstenha de agir, assim como conferir-lhe direitos e impor-lhe obrigações. Trata-se exatamente da situação que existe nas ordens jurídicas nacionais, onde também são as autoridades administrativas que fixam de forma vinculativa para os cidadãos as consequências da aplicação de uma lei a um caso concreto através da aprovação de uma decisão administrativa.

Este tipo de decisão tem as seguintes características estruturais:

  • Tem aplicabilidade individual, o que a distingue do regulamento. Dirige-se apenas individualmente aos destinatários, que deve obrigatoriamente designar. Para esse efeito, basta que o universo dos destinatários seja claramente identificável na altura da produção de efeitos da decisão e que tal universo não possa posteriormente ser alterado. O conteúdo da decisão deve, pois, ser adequado para produzir efeitos diretos e precisos no que se refere à situação do destinatário. Nesse sentido, a decisão pode também afetar individualmente terceiros, na medida em que estes, devido a características pessoais ou a circunstâncias específicas, sejam suscetíveis de ser identificados em condições similares aos destinatários e, por isso e de uma forma idêntica, possam ser identificáveis como destinatários.
  • A decisão é vinculativa em todos os seus elementos, o que a distingue da diretiva, que só vincula o Estado-Membro destinatário quanto ao resultado a alcançar.
  • A decisão tem aplicabilidade direta aos seus destinatários. Além disso, uma decisão dirigida a um Estado-Membro pode também, em condições idênticas às de uma diretiva, ser diretamente aplicável aos cidadãos da União.

As decisões gerais que não especificam a quem se destinam são vinculativas em todos os seus elementos, embora não seja claro quem fica vinculado por elas. Trata-se de algo que só fica determinado a partir do conteúdo de cada decisão. No caso das decisões gerais, é possível distinguir entre os seguintes tipos de instrumento:

  • decisões que alteram as disposições dos Tratados. Estas decisões são aplicáveis de uma forma geral e abstrata, ou seja, são vinculativas para todas as instituições, órgãos, organismos e agências da UE, bem como para todos os Estados-Membros. Refira-se as decisões que simplificam os procedimentos de adoção [artigo 81.º, n.º 3, e artigo 192.º, n.º 2, alínea c) do TFEU] ou que tornam menos exigentes os requisitos relativos a maiorias (artigo 312.º, n.º 2, e artigo 333.º, n.º 1 do TFEU);
  • decisões que acrescentam substância ao direito decorrente dos Tratados. Estas decisões têm efeito vinculativo para toda a UE ou para as instituições, órgãos, organismos e agências da UE caso se trate de uma decisão relativa à sua composição, não tendo qualquer efeito externo no indivíduo;
  • decisões que visam a adoção de direito intrainstitucional e interinstitucional. Estas decisões são vinculativas para as instituições, órgãos, organismos e agências da UE afetados e envolvidos. São exemplo destas decisões os regulamentos internos das instituições, bem como os acordos interinstitucionais celebrados entre os organismos da UE;
  • decisões no contexto do controlo organizacional. Estas decisões (por exemplo, nomeações, remuneração) vinculam o detentor do cargo ou os membros dos organismos pertinentes;
  • decisões para elaboração de políticas. Estas decisões concorrem com os regulamentos e as diretivas, mas não pretendem ter um efeito externo e juridicamente vinculativo no indivíduo. Em princípio, o seu efeito vinculativo está confinado às instituições envolvidas na sua emissão, em especial quando estão relacionadas com orientações ou diretrizes para políticas futuras. Apenas em casos excecionais é que têm efeitos jurídicos de natureza geral e abstrata ou consequências financeiras;
  • decisões no âmbito da política externa e de segurança comum. Estas decisões são juridicamente vinculativas para toda a UE. Até que ponto vinculam os Estados-Membros encontra-se restringido por disposições especiais (por exemplo, artigo 28.º, n.os 2 e 5, e artigo 31.º, n.º 1, do TUE). Não estão sujeitas à supremacia da jurisprudência do Tribunal de Justiça.

Recomendações e pareceres

Por fim, existe uma última categoria de atos, expressamente prevista nos Tratados da União, que é a categoria das recomendações e pareceres. Estes permitem às instituições da União pronunciarem-se de forma não vinculativa, isto é, sem que tal sirva para fundamentar qualquer obrigação jurídica para os destinatários relativamente aos Estados-Membros e, em certos casos, aos cidadãos da UE.

As recomendações sugerem aos destinatários um dado comportamento, sem com isso lhes impor uma obrigação legal. Assim, quando houver motivo para recear que a adoção ou alteração de uma disposição legislativa, regulamentar ou administrativa possa provocar uma distorção das condições de concorrência no mercado interno europeu, a Comissão recomendará aos estados interessados as medidas adequadas, tendentes a evitar a distorção em causa (artigo 117.º, n.º 1, segundo período, do TFUE).

Em contrapartida, os pareceres são emitidos pelas instituições da União sempre que se revele oportuno apreciar uma dada situação ou factos na União ou nos Estados-Membros. Em certos casos, os pareceres podem criar condições prévias à posterior formulação de atos jurídicos vinculativos ou constituem requisito necessário para a propositura de uma ação no Tribunal de Justiça (artigos 258.º e 259.º do TFUE).

Essencialmente, a importância das recomendações e dos pareceres é sobretudo política e moral. Os autores dos Tratados, ao preverem estes atos jurídicos, fizeram-no na expectativa de que os destinatários, tendo em conta o prestígio das instituições da UE e o facto de estas disporem de uma visão geral e de conhecimentos que ultrapassam o âmbito nacional, os acatariam voluntariamente e infeririam da apreciação de uma situação concreta por parte da UE as consequências necessárias. Aliás, as recomendações e os pareceres podem ter efeitos jurídicos indiretos quando constituem condições para atos jurídicos posteriores de caráter obrigatório ou quando a instituição da União que os formula se compromete a atuar de certa forma, podendo assim, em certas circunstâncias, criar legítimas expectativas.

Resoluções, declarações e programas de ação

Para além dos atos jurídicos expressamente previstos nos Tratados, as instituições da União dispõem de uma vasta panóplia de instrumentos de ação para modelar os contornos da ordem jurídica da UE. Na prática, os mais importantes são as resoluções, as declarações e os programas de ação.

Resoluções: as resoluções podem emanar do Conselho Europeu, do Conselho da UE e do Parlamento Europeu. Consubstanciam posições e intenções comuns em relação ao processo geral de integração e a ações específicas tanto no plano da UE como fora dela. As resoluções em matéria de assuntos internos tratam das grandes questões políticas da União, da política regional, da política energética e da união económica e monetária, sobretudo da criação do Sistema Monetário Europeu. A importância política destas resoluções decorre essencialmente da orientação que as mesmas imprimem aos trabalhos futuros do Conselho. Enquanto manifestações da vontade política comum, contribuem decisivamente para a constituição de plataformas de entendimento ao nível do Conselho. Asseguram ainda um mínimo de concordância ao nível da tomada de decisões entre as autoridades nacionais e da União Europeia. A avaliação do significado jurídico deste instrumento deve ter presentes estes elementos, isto é, a resolução deve manter uma certa flexibilidade, sem estar demasiado vinculada a requisitos e obrigações jurídicas.

Declarações: as declarações podem ser de dois tipos. Quando dizem respeito ao desenvolvimento da União, como é o caso das declarações relativas à UE, à democracia ou aos direitos fundamentais, aparentam-se às resoluções e servem essencialmente para atingir um vasto público ou um grupo específico de destinatários. Há também as declarações emanadas do processo decisório do Conselho, através das quais os membros do Conselho exprimem pareceres conjuntos ou individuais sobre a interpretação das decisões que o Conselho aprova. Estas declarações interpretativas, muito frequentes no Conselho, são essenciais na busca de compromissos. O alcance jurídico destas declarações deve ser avaliado à luz dos princípios fundamentais da interpretação, por força dos quais a interpretação de uma norma depende em grande parte das intenções que presidiram à sua elaboração. Todavia, este princípio só vale se às declarações em questão for dada a publicidade devida, já que o direito derivado da União, que reconhece direitos diretos ao cidadão, não pode ver-se preterido por disposições acessórias que não tenham sido tornadas públicas.

Programas de ação: estes programas são elaborados pelo Conselho e pela Comissão, por iniciativa própria ou a pedido do Conselho Europeu, e têm por objetivo a realização de programas legislativos e a consecução dos objetivos gerais que os Tratados consagram. Sempre que os programas estejam expressamente previstos nos Tratados, as instituições da União devem respeitar estas disposições na elaboração dos mesmos. Há também outros programas que, na prática, funcionam como simples orientações, desprovidas de qualquer efeito juridicamente vinculativo. Consubstanciam, no entanto, uma vontade política das instituições da União de se conformarem às disposições que deles emanam.

Os «livros brancos» e os «livros verdes» também têm uma importância considerável na União. Os livros brancos são publicados pela Comissão e contêm propostas concretas de medidas num domínio político específico ao nível da UE. Se um livro branco for favoravelmente acolhido pelo Conselho, pode servir de base a um programa de ação na União. São exemplos disto os livros brancos sobre os serviços de interesse geral (2004), sobre uma política de comunicação europeia (2006) ou sobre o futuro da Europa (2017). Os livros verdes pretendem estimular a discussão sobre determinados tópicos ao nível europeu e constituem a base para consultas públicas e debates sobre os tópicos abordados no livro verde. Podem conduzir a desenvolvimentos legislativos que serão então delineados em livros brancos.

Publicação e comunicação

Os atos legislativos são publicados no Jornal Oficial da União Europeia, Série L (Legislação). Entram em vigor na data neles prevista ou no vigésimo dia subsequente ao da sua publicação.

Os atos não legislativos são assinados pelo presidente da instituição que os adotou. São publicados no Jornal Oficial da União Europeia, Série C [«informações e notificações» (C = Comunicação)].

Os atos legislativos que especificam a quem se destinam são comunicados àqueles a quem se destinam e entram em vigor através desta comunicação.

Os instrumentos não vinculativos não estão sujeitos a qualquer obrigatoriedade de publicação ou comunicação, mas habitualmente são também publicados no Jornal Oficial («informações e notificações»).

O processo legislativo na União Europeia

Ao contrário dos processos de elaboração das decisões nacionais que se desenvolvem no Parlamento, o processo de elaboração de decisões na UE foi durante muito tempo e de forma decisiva marcado pelos representantes dos governos dos Estados-Membros, reunidos no Conselho, e isto porque a UE não emana de um «povo europeu», devendo antes a sua existência e configuração aos Estados-Membros. Estes renunciaram a parte da sua soberania sem contrapartidas em favor da UE, mas ousaram dar este passo apenas por disporem de uma posição forte no processo de decisão da UE. Com o desenvolvimento e o aprofundamento da ordem jurídica da UE, a repartição de competências no processo de tomada de decisões, que no princípio favorecia de forma excessivamente unilateral os interesses dos Estados-Membros, evoluiu de uma forma constante para um sistema de decisão mais equilibrado, nomeadamente através do reforço da posição do Parlamento Europeu. Foi assim que se passou da consulta inicial do Parlamento Europeu para uma colaboração entre este e o Conselho, e posteriormente para a codecisão, que vem agora completar a participação do Parlamento no processo legislativo da UE.

O processo legislativo na UE foi reorganizado e restruturado pelo Tratado de Lisboa. Importa distinguir entre: 1. o processo legislativo ordinário para adoção de atos legislativos (artigo 289.º, n.º 1, do TFUE), que corresponde essencialmente ao anterior processo de codecisão e, regra geral, é aplicável à tomada de decisão ao nível da UE, bem como o processo legislativo especial (artigo 289.º, n.º 2, do TFUE), em que os atos legislativos são adotados pelo Parlamento Europeu com a participação do Conselho ou por este último com a participação do Parlamento Europeu; 2. alguns atos jurídicos estão sujeitos a um processo de aprovação no Parlamento antes de produzirem efeitos; 3. os atos não legislativos são adotados através de um processo simplificado; 4. existem processos especiais para a adoção de atos delegados e atos de execução.

Processo de adoção de atos legislativos

Processo legislativo ordinário
(artigo 294.º do TFUE)

Desenrolar do processoFase de elaboração de uma proposta

Cabe à Comissão fundamentalmente desencadear o processo, com a elaboração de uma proposta (é o chamado «direito de iniciativa») sobre a medida da UE a tomar. Esta iniciativa é tomada pelo serviço da Comissão que se ocupa do domínio económico em causa, sendo frequente nesta fase o recurso a especialistas nacionais. A consulta destes peritos nacionais decorre em parte no contexto de comités criados para o efeito ou sob a forma de um processo de consulta «ad hoc» de peritos por parte dos serviços da Comissão. Importa, no entanto, ter presente que a Comissão não está vinculada aos pareceres dos peritos nacionais na fase de elaboração da proposta. O projeto da autoria da Comissão é então discutido de uma forma pormenorizada quanto ao seu conteúdo e ao modelo das medidas a tomar pelos membros da Comissão e finalmente aprovado por maioria simples, sendo simultaneamente transmitido ao Conselho e ao Parlamento Europeu, sob a forma de «proposta da Comissão», bem como eventualmente ao Comité Económico e Social Europeu, para parecer, e/ou ao Comité das Regiões, acompanhado de uma pormenorizada exposição de motivos.

Primeira leitura no Parlamento Europeu e no Conselho

O presidente do Parlamento Europeu remete a proposta para a comissão parlamentar competente, cujas conclusões são depois discutidas na sessão plenária, após o que é emitido um parecer que aprova, recusa ou modifica a proposta. O Parlamento Europeu transmite seguidamente a sua posição ao Conselho.

O Conselho pode então proceder do seguinte modo na primeira leitura:

  • aprova a posição do Parlamento, sendo o ato jurídico em questão aprovado com a redação da posição do Parlamento e ficando o processo legislativo assim concluído. Na verdade, tornou-se prática comum o processo legislativo ficar concluído na primeira leitura. Para o conseguir, utiliza-se o «trílogo informal», em que representantes do Parlamento, do Conselho e da Comissão se reúnem e tentam chegar a um compromisso mutuamente aceitável nesta fase inicial do processo legislativo;
  • não aprova a posição do Parlamento, estabelecendo assim a sua posição em primeira leitura, que depois comunicará ao Parlamento Europeu.

O Conselho informa o Parlamento Europeu, de forma pormenorizada, sobre as razões pelas quais estabeleceu a sua posição em primeira leitura. A Comissão informa o Parlamento Europeu, de forma pormenorizada, sobre a sua posição.

Segunda leitura no Parlamento Europeu e no Conselho

O Parlamento Europeu tem, na segunda leitura, três possibilidades para agir, no prazo de três meses, após receber a posição do Conselho:

  1. pode aprovar a posição do Conselho ou não se pronunciar sobre ela. Nesse caso, o ato jurídico em questão será adotado na versão da posição do Conselho;
  2. o Parlamento rejeita a posição do Conselho por maioria dos seus membros. Nesse caso, o ato jurídico proposto é considerado não adotado e o processo legislativo fica assim concluído;
  3. o Parlamento aprova, por maioria dos seus deputados, alterações à posição do Conselho. Nesse caso, a versão modificada é transmitida ao Conselho e à Comissão, emitindo a Comissão um parecer sobre estas alterações.

O Conselho delibera sobre a posição modificada e tem, no prazo de três meses após a entrada das alterações do Parlamento, duas possibilidades para agir:

  1. pode aprovar todas as alterações apresentadas pelo Parlamento. Nesse caso, o ato jurídico em questão é adotado, para o que basta uma maioria qualificada, se a Comissão concordar com as alterações apresentadas pelo Parlamento. Se isso não se verificar, o Conselho só poderá aprovar as alterações do Parlamento por unanimidade;
  2. caso o Conselho não aprove todas as alterações apresentadas pelo Parlamento, ou não seja obtida a necessária maioria, será iniciado o processo de conciliação.
Processo de conciliação

O início do processo de conciliação é desencadeado pelo presidente do Conselho, em consonância com o presidente do Parlamento Europeu, sendo para tal criado um Comité de Conciliação que atualmente é composto por 28 representantes do Conselho e 28 do Parlamento Europeu, dotados de direitos iguais. O Comité de Conciliação tem a tarefa de, por maioria qualificada e no prazo de seis semanas após a sua convocação, alcançar um consenso com base nas posições adotadas em segunda leitura pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho. Para tal é necessário chegar uma solução de compromisso que só pode ser alcançada se «todos os aspetos de discórdia forem analisados». Contudo, a questão passa sempre e muito simplesmente por se chegar a um compromisso entre as duas posições divergentes do Parlamento e do Conselho. Para o efeito, podem ser utilizados novos métodos que facilitem o processo de compromisso, desde que estes se enquadrem no resultado global da segunda leitura. Contudo, não é possível utilizar alterações que não tenham conseguido alcançar as maiorias necessárias na segunda leitura.

A Comissão participa nos trabalhos do Comité de Conciliação e toma todas as iniciativas necessárias para obter uma aproximação das posições do Parlamento Europeu e do Conselho.

Caso o Comité de Conciliação não aprove, no prazo de seis semanas após a sua convocação, um projeto comum, o ato jurídico proposto será considerado como não aprovado.

Terceira leitura no Parlamento Europeu e no Conselho

Caso o Comité de Conciliação aprove um projeto comum no prazo de seis semanas, o Parlamento Europeu e o Conselho dispõem de um prazo de seis semanas, a partir desta aprovação, para aprovar o ato jurídico em questão de acordo com este projeto, sendo necessária a maioria dos votos expressos no Parlamento Europeu e uma maioria qualificada no Conselho. Caso contrário, o ato jurídico proposto é considerado não adotado e o processo legislativo fica assim concluído.

Publicação

Uma vez aprovado, o ato jurídico é redigido, na sua forma final, nas atuais 24 línguas oficiais da União (alemão, búlgaro, checo, croata, dinamarquês, eslovaco, esloveno, espanhol, estónio, finlandês, francês, grego, húngaro, inglês, irlandês, italiano, letão, lituano, maltês, neerlandês, polaco, português, romeno e sueco), assinado pelos presidentes do Parlamento Europeu e do Conselho e, por fim, publicado no Jornal Oficial da União Europeia ou, se o ato jurídico se destinar a determinados destinatários, «notificado aos respetivos destinatários».

O processo de codecisão representa simultaneamente um desafio e uma oportunidade para o Parlamento Europeu. Na verdade, o êxito deste processo requer um acordo prévio no Comité de Conciliação mas simultaneamente transforma de uma forma fundamental a relação entre o Parlamento Europeu e o Conselho. Entre ambas as instituições existe uma igualdade na atividade legislativa e está nas mãos do Parlamento Europeu e do Conselho demonstrarem a sua capacidade de compromisso político e, se possível, chegarem a acordo sobre um projeto comum no Comité de Conciliação.

O processo legislativo especial

O processo legislativo especial caracteriza-se habitualmente por uma tomada de decisão por parte do Conselho, deliberando por unanimidade sobre uma proposta da Comissão e após consulta ao Parlamento Europeu (por exemplo, artigo 308.º do TFUE: Estatutos do Banco Europeu de Investimento) ou pela adoção de um ato jurídico por parte do Parlamento Europeu após obter aprovação do Conselho (por exemplo, artigo 226.º, n.º 3, do TFUE: exercício do direito de inquérito através de uma comissão parlamentar de inquérito; artigo 228.º, n.º 4, do TFUE: condições gerais de exercício das funções do Provedor de Justiça).

Existem outras formas de legislar que diferem destes casos habituais mas que, não obstante, não deixam de enquadrar-se no processo legislativo especial.

  • É o caso das decisões tomadas em matéria de orçamento (artigo 314.º do TFUE), o processo tem regras pormenorizadas e corresponde em grande medida ao processo legislativo ordinário.
  • O Conselho toma uma decisão por maioria sobre uma proposta da Comissão, após consulta ao Parlamento Europeu (ou outras instituições da UE e órgãos consultivos); este era originalmente o processo de consulta em que, no início, se traduzia o processo legislativo normal ao nível da UE, mas agora é utilizado apenas em casos isolados como num processo legislativo especial (por exemplo, artigo 140.º, n.º 2, do TFUE: derrogações no contexto da União Económica e Monetária; artigo 128.º, n.º 2, do TFUE: emissão de moedas).
  • O Conselho toma uma decisão sem a participação do Parlamento Europeu. Contudo, trata-se de uma rara exceção que, para além do domínio da política externa e de segurança comum, onde o Parlamento é informado das decisões do Conselho (artigo 36.º do TUE), só acontece em casos pontuais (por exemplo, artigo 31.º do TFUE): fixar os direitos da pauta aduaneira; artigo 301.º, n.º 2, do TFUE: composição do Comité Económico e Social).

O processo legislativo especial previsto para certos domínios políticos pode ser substituído pelo processo legislativo ordinário através das «cláusulas-ponte», assim como a unanimidade no Conselho pode ser substituída por uma maioria qualificada. Importa distinguir entre dois tipos de cláusulas-ponte. Em primeiro lugar, existem as cláusulas-ponte gerais aplicáveis a todos os domínios políticos, sendo que a sua utilização deve acontecer através de uma decisão unânime do Conselho Europeu. Em segundo lugar, existem cláusulas-ponte específicas aplicáveis a determinados domínios políticos (por exemplo, quadro financeiro plurianual — artigo 312.º do TFUE; cooperação judiciária em matéria de direito da família — artigo 81.º do TFUE; cooperação reforçada — artigo 333.º do TFUE; domínio social — artigo 153.º do TFUE e ambiente — artigo 192.º do TFUE). Estas cláusulas são diferentes das cláusulas-ponte gerais, na medida em que, regra geral, os parlamentos nacionais não têm direito de veto e a decisão também pode ser tomada pelo Conselho e não necessariamente pelo Conselho Europeu.

Processo de aprovação

Uma forma igualmente importante de participação do Parlamento Europeu no processo legislativo no seio da UE é o processo de aprovação. Este processo implica que um instrumento jurídico, para poder ser adotado, seja previamente aprovado pelo Parlamento Europeu. Todavia, este processo não permite ao Parlamento Europeu influenciar diretamente a natureza das disposições jurídicas, porque, no âmbito do processo de aprovação, o Parlamento Europeu não pode propor nem impor alterações, limitando-se a aprovar ou rejeitar o instrumento jurídico proposto. Este processo está previsto em relação à celebração de acordos internacionais (artigo 218.º, n.º 6, alínea a), do TFUE), à cooperação reforçada (artigo 329.º, n.º 1, do TFUE) ou ao exercício de poderes para adotar disposições (artigo 352.º, n.º 1, do TFUE). O processo de aprovação pode fazer parte tanto de um processo legislativo especial de adoção de atos legislativos como de um processo legislativo simplificado de adoção de atos não legislativos vinculativos.

Processo de adoção de atos não legislativos

Os atos não legislativos são adotados através de um processo simplificado em que uma instituição ou outro órgão da UE adota um ato jurídico no âmbito das suas competências. A autoridade para o fazer advém da base de competências pertinente prevista nos Tratados da UE.

Este processo é inicialmente aplicável a (meros) atos legislativos vinculativos adotados por uma instituição da UE no âmbito das suas competências (por exemplo, Comissão em relação a um auxílio estatal — artigo 108.º, n.º 2, do TFUE).

O processo simplificado é utilizado também para os instrumentos jurídicos não vinculativos, designadamente as recomendações e os pareceres emitidos pelas instituições da UE e pelos órgãos consultivos.

Processo de adoção de atos delegados e atos de execução

Há muito que é prática comum o Conselho e o Parlamento conferirem poderes legislativos e de execução à Comissão. Os poderes conferidos têm sido exercidos através da criação de comités de comitologia, em que a influência da Comissão, do Conselho, dos Estados-Membros e do Parlamento varia. Contudo, não houve uma separação clara entre a delegação de poderes para criação de legislação (poderes legislativos) e a atribuição de poderes de execução (poderes de execução). O Tratado de Lisboa fez a distinção que há muito se exigia no direito primário entre a realização de tarefas legislativas e tarefas executivas (artigos 290.º e 291.º do TFUE).

A adoção de atos delegados cabe à Comissão com base numa autorização especial dada por um ato legislativo adotado pelo Conselho e pelo Parlamento (artigo 290.º do TFUE). O conteúdo da delegação só pode consistir na alteração de determinados elementos não essenciais de um ato legislativo, sendo que os elementos essenciais de determinado domínio não podem estar sujeitos a uma delegação de poder. Isto significa que as disposições fundamentais são adotadas pelo próprio órgão legislativo e não podem ser delegadas no órgão de execução. São, assim, tidos em conta os princípios da democracia e da separação de poderes. Caso estejam envolvidas decisões politicamente importantes com consequências abrangentes, cabe ao Parlamento e ao Conselho assumir a sua responsabilidade primária de legislar. Tal aplica-se especialmente a objetivos políticos para ação legislativa, à seleção dos meios para alcançar esses objetivos e a possíveis implicações das disposições para pessoas singulares e coletivas. Além disso, os atos delegados destinam-se apenas a alterar ou complementar um ato legislativo, por forma a não comprometer a finalidade do mesmo. Por último, as disposições a alterar ou acrescentadas através do ato delegado devem estar claramente especificadas no ato legislativo. Por conseguinte, os atos delegados podem englobar adaptações legislativas relativas a desenvolvimentos futuros, tais como alterações no estado da arte, alinhamento com alterações previsíveis noutra legislação ou garantir que as disposições de um ato legislativo sejam aplicadas mesmo quando surgem circunstâncias especiais ou novas informações. A delegação de poderes pode ter um período de vigência ou, se for válida por tempo ilimitado, pode existir uma disposição que preveja o direito de a revogar. Para além da possibilidade de revogar a delegação de poderes, o Conselho e o Parlamento podem prever o direito de formular objeções à entrada em vigor dos atos delegados da Comissão. Caso o Conselho e o Parlamento tenham delegado poderes de execução na Comissão, esta última pode adotar atos de execução. Não existe qualquer disposição no direito primário que autorize a inclusão de outras instituições. Contudo, a Comissão está autorizada a consultar em especial peritos nacionais, o que, na prática, acontece geralmente.

A adoção de atos de execução pela Comissão (artigo 291.º do TFUE) foi concebida como exceção do princípio da responsabilidade dos Estados-Membros em relação à execução administrativa do direito da UE (artigo 289.º, n.º 1, do TFUE) e, por conseguinte, encontra-se sob o controlo dos Estados-Membros. Trata-se de um afastamento significativo da posição jurídica anterior, em que o processo de comitologia dava ao Conselho e ao Parlamento direitos de codeterminação na adoção de medidas de execução. Esta alteração reflete o facto de a clara separação entre atos delegados e atos de execução significar que os direitos de controlo e participação tiveram de ser reorganizados em conformidade. Considerando, como o legislador da UE, que o Conselho e o Parlamento têm acesso aos atos delegados, este acesso cabe aos Estados-Membros no caso dos atos de execução, em conformidade com a responsabilidade que lhes está inerente de execução administrativa do direito da UE. Em consonância com o seu mandato legislativo, o legislador da UE (ou seja, o Conselho e o Parlamento) definiu regras e princípios gerais relativos aos mecanismos de controlo do exercício das competências de execução no Regulamento (UE) n.º 182/2011 («Regulamento Comitologia»). O Regulamento Comitologia reduziu para dois o número de procedimentos de comitologia: o procedimento consultivo e o procedimento de exame. Foram criadas disposições específicas relativas à escolha do procedimento.

No procedimento consultivo, um comité consultivo dá pareceres aprovados por maioria simples, que são exarados em atas. A Comissão deve ter devidamente em conta esses pareceres, mas não é obrigada a fazê-lo.

No procedimento de exame, o comité de comitologia, que é composto por representantes dos Estados-Membros, vota o projeto de medidas de execução, apresentado pela Comissão por maioria qualificada. Em caso de aprovação, a Comissão deve adotar as medidas tal como foram apresentadas. Caso não seja tomada uma decisão por falta de quórum, a Comissão pode em princípio adotar o seu projeto. Em caso de parecer negativo do comité ou falta de aprovação, a Comissão pode apresentar um novo projeto ao comité de exame ou enviar o projeto original ao comité de recurso.

No processo Jégo-Quéré, uma sociedade de armação de pesca pediu a anulação de partes de um regulamento sobre a proteção das unidades juvenis de pescada. Mais especificamente, as partes relativas à proibição de redes de pesca com malhas de 8 cm, tais como as utilizadas pela Jégo-Quéré. Para garantir uma proteção judicial efetiva, o Tribunal de Primeira Instância interpretou de forma lata a noção de pessoa a quem um ato diz individualmente respeito e considerou a ação admissível. O Tribunal de Justiça não concordou. Considerou que o facto de a empresa ser diretamente afetada por um regulamento de aplicação geral não pode ser equiparado a um ato que lhe diga individualmente respeito.

O comité de recurso é a segunda instância no procedimento de exame. Submeter a questão ao comité de recurso serve para a Comissão e os representantes dos Estados-Membros chegarem a um compromisso quando não foi possível alcançar um resultado no comité de exame. Caso o comité de recurso dê parecer favorável, a Comissão adota o ato de execução. Também o pode fazer se não for apresentado qualquer parecer.

O sistema de proteção jurídica da União Europeia

Uma União que se considera como comunidade de direitos deve colocar à disposição dos sujeitos do direito um sistema de proteção jurídica integral e eficaz. O sistema de proteção jurídica da UE cumpre este requisito, pois reconhece o direito do indivíduo a usufruir de uma proteção legal eficaz dos direitos decorrentes da ordem jurídica da UE. Esta proteção, que está consagrada no artigo 47.º da Carta dos Direitos Fundamentais, insere-se nos direitos fundamentais de cariz jurídico decorrentes das tradições constitucionais comuns dos Estados-Membros e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (artigos 6.º e 13.º), sendo garantida pela jurisdição da UE (o Tribunal de Justiça e o Tribunal Geral) (artigo 19.º, n.º 1, do TUE). Neste âmbito, estão à disposição uma série de procedimentos que iremos a seguir apresentar sucintamente.

Ação por incumprimento dos Tratados (artigo 258.º do TFUE)

Este processo aplica-se quando se constata que um Estado-Membro não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do direito da União. Este processo é exclusivamente executado pelo Tribunal de Justiça da União Europeia. Tendo em conta a gravidade da acusação, antes de se recorrer ao Tribunal de Justiça é executado um procedimento preliminar nos termos do qual é dada oportunidade ao Estado-Membro em causa para apresentar as suas observações sobre as acusações. Se o litígio não ficar resolvido nesta fase, a Comissão (artigo 258.º do TFUE) ou um Estado-Membro (artigo 259.º do TFUE) podem recorrer ao Tribunal de Justiça por incumprimento do Tratado. Na prática, a iniciativa parte quase sempre da Comissão. O Tribunal de Justiça instrui o processo e determina se existe ou não incumprimento. No caso de declarar verificado o incumprimento, o Estado-Membro em causa deve tomar as medidas necessárias para se conformar sem demora com o direito da União. Se o referido Estado-Membro não tomar as medidas necessárias para a execução do acórdão, a Comissão dispõe da possibilidade de condenar, por incumprimento do Tratado, um Estado que já tenha ignorado um acórdão do Tribunal de Justiça obrigando ao pagamento de uma quantia fixa e/ou sanção pecuniária compulsória (artigo 260.º do TFUE). O não respeito continuado de um acórdão do Tribunal de Justiça, por violação do Tratado, tem também consequências financeiras significativas para um Estado-Membro que não cumpra o Tratado.

Recurso de anulação (artigo 263.º do TFUE)

O recurso de anulação (também designado por ação de nulidade ou ação de resolução) vem permitir a possibilidade de um controlo judicial e objetivo das ações das instituições da União (controlo abstrato de normas) e abre ao cidadão, embora com determinadas restrições, o acesso à jurisdição da UE (garantia da proteção dos direitos individuais).

Entre as ações que podem ser contestadas contam-se todas as medidas das instituições da União que produzam efeitos jurídicos vinculativos que interfiram com os interesses do queixoso através de uma intrusão no seu estatuto jurídico. O recurso pode ser interposto pelos Estados-Membros, o Parlamento Europeu, o Conselho, a Comissão, o Tribunal de Contas, o Banco Central Europeu e o Comité das Regiões, na medida em que se queiram opor a uma violação dos direitos que lhes foram conferidos.

Em contrapartida, os cidadãos e as empresas da União só podem interpor recurso de anulação contra decisões de que sejam destinatários ou contra decisões que, embora dirigidas a terceiros, lhes digam direta e individualmente respeito. Nos termos da jurisprudência do Tribunal de Justiça, uma pessoa só pode ser individual e diretamente destinatária de uma decisão se a mesma a individualizar de uma forma que a distinga de todos os outros agentes económicos. Com este critério do «efeito direto» pretende garantir-se que só sejam submetidos ao Tribunal de Justiça ou ao Tribunal Geral os casos em que esteja estabelecido com segurança o tipo de interferência no estatuto jurídico do demandante e a respetiva realização. O critério da «pessoa a quem um ato diz individualmente respeito» deverá também permitir excluir as chamadas «ações populares».

O Tratado de Lisboa também introduziu uma categoria adicional de atos contra os quais também podem ser interpostos recursos de anulação diretamente por pessoas singulares e coletivas. Atualmente, as pessoas singulares e coletivas também têm legitimidade para dar início a procedimentos contra um «ato regulamentar», desde que este «diga diretamente respeito à pessoa e não implique medidas de execução». Esta nova categoria colmatou uma «lacuna na proteção jurídica» que já tinha sido identificada pelo Tribunal de Justiça no processo Jégo-Quéré, uma vez que, anteriormente, não havia sido garantida proteção judicial em casos onde um operador económico, embora fosse diretamente afetado por um ato legislativo da UE, não tinha possibilidade de rever a legalidade desse ato utilizando as vias de recurso disponíveis para o efeito: os recursos através de uma ação de anulação (artigo 263.º do TFUE) eram malsucedidos devido ao facto de os atos não lhes dizerem direta e individualmente respeito; o processo de decisão prejudicial (artigo 267.º do TFUE) não podia ser utilizado devido à ausência de medidas de execução nacionais (exceto em determinados processos penais relativos ao incumprimento de obrigações ao abrigo do direito da União por parte do operador económico, que contudo deviam ser cumpridas, porque não se podia esperar que o operador económico conseguisse um exame da legalidade através de conduta ilegal); por fim, as ações de reparação/indemnização não podiam resultar numa solução que defendesse os interesses do cidadão da União, uma vez que também não podiam ser utilizadas para suprimir atos legislativos ilegais da ordem jurídica da UE.

Devido ao facto de o artigo 263.º, parágrafo 4, do TFUE prescindir da necessidade de o ato «dizer individualmente respeito à pessoa» quando se interpõe recursos contra atos regulamentares e requerer apenas que os atos lhe digam diretamente respeito e não necessitem de medidas de execução, parte desta lacuna foi colmatada.

Contudo, o significado de «atos regulamentares» é problemático. Quando interpretado de forma restrita, o termo é entendido como fazendo apenas referência a atos de aplicação geral que não sejam atos não legislativos, ao passo que, quando interpretado de forma mais lata, é entendido como abrangendo todo os atos de aplicação geral, incluindo atos legislativos. No acórdão do processo Inuit Tapiriit Kanatami, o Tribunal Geral analisou pormenorizadamente as duas abordagens e, com base numa interpretação gramatical, histórica e teleológica, concluiu que «atos regulamentares» podem ser entendidos apenas como atos de aplicação geral que não sejam atos legislativos. Para além dos atos delegados (artigo 290.º do TFUE) e dos atos de execução (artigo 291.º do TFUE), estes também englobam diretivas, desde que sejam diretamente aplicáveis de acordo com a jurisprudência, e decisões de natureza abstrata e geral, desde que não tenham sido adotadas através do processo legislativo. Por conseguinte, o Tribunal Geral adotou claramente uma interpretação restrita do conceito de «regulamentar». O Tribunal de Justiça confirmou esta conclusão no seu acórdão do recurso em 2013. Trata-se de uma decisão lamentável da perspetiva de garantir uma proteção jurídica efetiva, uma vez que a lacuna existente na proteção jurídica é colmatada apenas parcialmente quando se utiliza a abordagem restrita.

Os atos criados por órgãos ou outros organismos da UE, particularmente os que são criados pelas várias agências, passam também a poder ser fiscalizados quanto à sua legalidade (artigo 263.º, parágrafo 5, do TFUE). Desta forma, uma lacuna na proteção jurídica que anteriormente só fora corrigida pela jurisprudência, encontra-se agora colmatada. Além disso, o direito primário também tem em conta o facto de que foram atribuídas a alguns destes organismos competências que lhes permite elaborarem atos que produzem efeitos jurídicos em relação a terceiros, pelo que, no interesse de ter um sistema de proteção jurídica livre de lacunas, importa que o recurso a ações jurídicas esteja disponível também em relação a estes atos.

Se o recurso tiver fundamento, o Tribunal de Justiça ou o Tribunal Geral podem anular, com efeitos retroativos, o ato em causa. Em casos devidamente fundamentados o Tribunal de Justiça ou o Tribunal Geral só podem limitar o recurso de anulação a partir da data da sentença. A fim de salvaguardar os direitos e os interesses das partes demandantes não se aplica a estas a limitação de efeitos de uma sentença de anulação.

Ação por omissão (artigo 265.º do TFUE)

Este tipo de ação completa a proteção jurídica face ao Parlamento Europeu, ao Conselho Europeu, ao Conselho, à Comissão e ao BCE, uma vez que lhes dá também a possibilidade de interporem uma ação judicial contra uma omissão ilegal de um ato da União. Porém, antes de interpor a ação, existe um procedimento prévio nos termos do qual o demandante deve convidar a instituição da União em causa a agir. Uma ação deste tipo, quando interposta pelas instituições, tem como objetivo requerer que se verifique se a instituição em questão se absteve, violando o Tratado, de adotar um ato jurídico. Quando o demandante é um cidadão da União ou uma pessoa coletiva, o objeto da ação por omissão está além disso limitado pelo facto de ser necessário constatar que o ato jurídico notificado ao demandante, ou seja, uma decisão visando o demandante de uma instituição da União e que viola o Tratado, não foi adotada. Com a sentença final é apenas constatada a ilegalidade da omissão, já que o Tribunal de Justiça/Tribunal Geral não são competentes para nas suas sentenças ordenarem a adoção obrigatória das medidas necessárias. A parte vencida fica apenas obrigada a adotar as medidas contidas na sentença (artigo 266.º do TFUE).

Ação de reparação/indemnização (artigo 268.º e artigo 340.º, n.º 2, do TFUE)

Esta ação possibilita aos cidadãos da União e pessoas coletivas, e também aos Estados-Membros que tenham suportado danos em virtude de um erro de um dos agentes da UE, recorrerem ao Tribunal de Justiça para solicitar uma indemnização por estes danos. Os pressupostos da responsabilidade da UE são regulados pelos Tratados de uma forma incompleta, sendo definidos em geral de acordo com os princípios gerais do direito que as ordens jurídicas dos Estados-Membros partilham entre si. O Tribunal de Justiça desenvolveu estes princípios na sua jurisprudência, tendo fixado as seguintes condições prévias para que possa haver reparação de danos por parte da UE: 1. Comportamento ilícito por parte de uma instituição da União ou de um agente da UE no exercício das suas funções. Estamos perante um comportamento ilícito quando há uma violação qualificada de uma norma do direito da União aprovada para conferir direitos ou proteger uma pessoa singular ou coletiva ou um Estado-Membro. Os direitos fundamentais e as liberdades do mercado interno, ou os princípios de proteção da confidencialidade e da proporcionalidade, são os que apresentam principalmente características de normas de proteção, mas também qualquer outra jurisprudência diretamente aplicável que confira direitos pessoais ao cidadão da União. A violação é suficientemente qualificada quando a instituição da União interveniente ultrapassou as suas competências de uma forma flagrante e considerável. O Tribunal tem geralmente em conta o número limitado de pessoas afetadas pelo ato ilícito em questão e o nível do dano alegado, que tem de exceder o risco comercial esperado no setor económico em causa; 2. Existência de um dano; 3. Nexo causal entre o ato da instituição da União e o alegado dano; 4. Não é necessário provar a culpa da instituição da União.

Recurso dos funcionários da União (artigo 270.º do TFUE)

O Tribunal de Justiça é também competente em matéria de litígios entre a União Europeia e os seus funcionários ou familiares sobrevivos que nele possam ser dirimidos no contexto das condições de trabalho. É o Tribunal Geral que tem jurisdição sobre estas ações.

Processos de recurso (artigo 256.º do TFUE)

As relações entre o Tribunal de Justiça e o Tribunal Geral foram concebidas de forma que todas as decisões do Tribunal Geral sejam passíveis de recurso para o Tribunal de Justiça, limitado às questões de direito. Este recurso apenas pode ter por fundamento a incompetência do Tribunal Geral, irregularidades processuais que prejudiquem os interesses do recorrente ou uma violação do direito da União pelo Tribunal Geral. Se o recurso for procedente, o Tribunal de Justiça anula a decisão do Tribunal Geral. Pode julgar definitivamente o litígio, se o mesmo estiver em condições de ser julgado, ou remeter o processo para o Tribunal Geral para novo julgamento. Se assim for, o Tribunal Geral fica vinculado à solução dada às questões de direito pela decisão do Tribunal de Justiça.

Proteção jurídica provisória (artigo 278.º e artigo 279.º do TFUE)

As ações intentadas no Tribunal de Justiça ou no Tribunal Geral, bem como os recursos das decisões do Tribunal Geral para o Tribunal de Justiça, não têm qualquer efeito suspensivo. Nada impede, porém, que o Tribunal de Justiça ou o Tribunal Geral ordenem a suspensão da execução do ato impugnado (artigo 278.º do TFUE) ou ordenem as necessárias medidas provisórias (artigo 279.º do TFUE).

Na prática seguida pela jurisprudência, o fundamento de um pedido de medidas provisórias é determinado à luz dos seguintes três critérios: 1. A probabilidade da existência de um direito (fumus boni juris). À instância competente cabe avaliar a suficiência da probabilidade de êxito, a partir de um estudo sumário dos argumentos do recorrente. 2. A urgência da decisão: a urgência é determinada consoante a decisão solicitada se destina ou não a evitar com urgência ao recorrente danos graves e irreparáveis. Os critérios aplicados são a natureza e a gravidade da infração, assim como o prejuízo concreto e definitivo em relação à propriedade ou a outros bens do recorrente protegidos juridicamente. Considera-se que um prejuízo financeiro é basicamente grave e irreparável sempre que o mesmo não possa ser integralmente reparado, mesmo se o recorrente obtiver ganho de causa. 3. Equilíbrio dos interesses: os inconvenientes para o recorrente, se não forem decretadas medidas provisórias, são comparados com o interesse da UE em dar de imediato execução às medidas e com os inconvenientes para terceiros da aplicação de medidas provisórias.

Pedido de decisão prejudicial (artigo 267.º do TFUE)

O pedido de decisão prejudicial, ou reenvio prejudicial, destina-se a proporcionar aos órgãos jurisdicionais a possibilidade de recorrerem ao Tribunal de Justiça. Sempre que uma questão visando o esclarecimento de um litígio sobre disposições do direito da UE seja apresentada a um órgão jurisdicional nacional, esse órgão pode suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a questão da validade e/ou da interpretação do ato jurídico adotado pelas instituições da UE à luz dos Tratados da União. A questão assim formulada pelo tribunal nacional é submetida ao Tribunal de Justiça, que responde com um acórdão, e não com um mero parecer, a fim de sublinhar, também pela forma, o caráter vinculativo da sua decisão. Não obstante, o reenvio prejudicial não é um processo de contencioso destinado a resolver um litígio como os outros processos já descritos, e representa apenas um elemento de um processo global que começa e termina perante um tribunal nacional.

O objetivo deste processo é, antes de mais, garantir a interpretação uniforme do direito da União Europeia e, com ela, a unidade da ordem jurídica da UE. Para além desta função de preservação da uniformidade do direito da UE, este processo desempenha também um importante papel na proteção dos direitos individuais. A garantia de que é dada aos tribunais nacionais a possibilidade de verificarem a conformidade da legislação nacional com o direito da União e, em caso de incompatibilidade, que prevalecerá o primado do direito da União diretamente aplicável, requer que o conteúdo e o alcance das disposições da UE estejam claramente definidos. Regra geral, só um pedido de decisão prejudicial pode garantir esta clareza, pelo que este processo permite também ao cidadão da União opor-se a ações do seu país contrárias à legislação da UE e conseguir a aplicação desta legislação perante os tribunais nacionais. Esta dupla função da decisão prejudicial compensa de certa forma as reduzidas possibilidades de os particulares recorrerem diretamente para o Tribunal de Justiça e reveste-se de uma importância crucial para a proteção jurídica das pessoas singulares. Todavia, para que dê resultado, em última análise, os juízes e os órgãos jurisdicionais nacionais devem estar «dispostos» a submeter a questão ao Tribunal de Justiça.

Matéria: O Tribunal de Justiça decide sobre a interpretação do direito da União e controla a validade dos atos jurídicos das instituições da UE. As disposições de direito nacional não podem ser objeto de reenvio prejudicial. No âmbito deste processo o Tribunal de Justiça não é competente para interpretar o direito nacional nem para decidir da respetiva conformidade com o direito da União Europeia. Este aspeto é frequentemente negligenciado nos pedidos de decisão prejudicial dirigidos ao Tribunal de Justiça. Com efeito, inúmeros são os casos em que se interpela o Tribunal de Justiça sobre a conformidade de uma disposição nacional com uma disposição da União ou sobre a aplicabilidade de uma disposição da UE específica a um processo tramitado num órgão jurisdicional nacional. Embora o Tribunal de Justiça não possa receber tais questões prejudiciais, estas não são pura e simplesmente rejeitadas, sendo antes interpretadas pelo Tribunal de Justiça, já que o tribunal nacional que decide um reenvio o que pretende é conhecer, na sua essência, os critérios de interpretação da legislação pertinente da UE para poder avaliar autonomamente a compatibilidade entre a legislação nacional em questão e a legislação da União Europeia. O Tribunal de Justiça aproveita a ocasião para, a partir da totalidade da documentação fornecida, designadamente a fundamentação do reenvio, identificar as disposições de direito da União que carecem de interpretação no contexto do litígio em questão.

Capacidade para introduzir um pedido de reenvio prejudicial: são competentes para introduzir pedidos de reenvios prejudiciais todos os «órgãos jurisdicionais dos Estados-Membros». O sentido e o alcance do conceito de jurisdição no direito da União devem ser definidos não de acordo com a designação mas com a função e posicionamento de um órgão no sistema de proteção jurídica do Estado-Membro. Órgãos jurisdicionais são, por isso, todos os órgãos independentes, isto é, não sujeitos a indicações de terceiros, a quem compete resolver os litígios num estado de direito e cujas decisões produzem efeitos jurídicos. Em consequência, os tribunais constitucionais dos Estados-Membros e as instâncias de arbitragem que não integram o sistema judiciário — com exceção dos tribunais de arbitragem privados — também são competentes para decidir de um reenvio prejudicial. Um juiz nacional fará uso do seu direito de decisão de reenvio prejudicial em função da pertinência das questões de direito da União Europeia para a decisão a tomar no processo principal, sendo essa decisão da sua exclusiva responsabilidade. As partes no litígio apenas podem formular observações. O Tribunal de Justiça apenas verifica a pertinência das questões para a decisão final para efeitos de controlo da respetiva admissibilidade, isto é, para se certificar de que a questão jacente incide verdadeiramente sobre a interpretação dos Tratados da UE ou sobre a validade de um ato emanado de uma instituição da União, ou ainda para aferir da presença efetiva de um litígio jurídico, designadamente, se os pontos sobre os quais o Tribunal de Justiça é chamado a pronunciar-se a título prejudicial não são apenas hipotéticos ou abstratos tendentes a induzir o Tribunal de Justiça a dar um parecer através de uma decisão prejudicial. É raro que o Tribunal de Justiça se recuse a apreciar um reenvio invocando estas razões, já que, dada a importância da cooperação entre as autoridades judiciárias, o Tribunal de Justiça age nestes dois domínios com uma certa contenção. Todavia, a jurisprudência recente demonstra que o Tribunal de Justiça dá agora provas de maior rigor em matéria de admissibilidade dos pedidos de decisão a título prejudicial, na medida em que aplica à letra o requisito já mencionado de que o reenvio prejudicial deve comportar uma descrição suficientemente clara e pormenorizada das questões de facto e de direito do processo inicial. Na falta de tais informações, o Tribunal de Justiça declara-se incompetente para proceder a uma interpretação correta da legislação da União Europeia e indefere o pedido.

Obrigatoriedade de introdução de um pedido de reenvio prejudicial: qualquer órgão jurisdicional cujas decisões não sejam passíveis de recurso judicial previsto no direito nacional está obrigado a introduzir um pedido de reenvio prejudicial. O conceito de recurso abrange todas as vias de recurso que permitam verificar decisões de facto e de direito (como por exemplo a invocação) ou só de direito (por exemplo a revisão) tomadas por um órgão jurisdicional de uma instância superior. Não se incluem aqui os recursos ordinários com efeitos limitados ou específicos (revisão, verificação da constitucionalidade). O órgão jurisdicional obrigado a submeter um pedido de reenvio prejudicial só pode subtrair-se a essa obrigação se a questão prejudicial não for relevante para a solução do litígio, se já foi objeto de um acórdão do Tribunal de Justiça ou ainda se não subsistir qualquer dúvida quanto à interpretação de uma disposição de direito da União Europeia. Em contrapartida, se um órgão jurisdicional nacional pretender invocar a invalidade de um ato da UE, é obrigado a introduzir um pedido de reenvio prejudicial sem restrições. Neste contexto, o Tribunal de Justiça estabeleceu claramente que detém competência exclusiva para rejeitar disposições que violem o direito da União Europeia. Em consequência, os órgãos jurisdicionais nacionais devem aplicar e respeitar o direito da União enquanto o Tribunal de Justiça não tiver decidido da respetiva invalidade. Admite-se uma exceção para os órgãos jurisdicionais no âmbito de um processo para proteção jurídica provisória. Nos termos da jurisprudência mais recente do Tribunal de Justiça, estes órgãos jurisdicionais podem, sob certas condições, suspender a execução de atos administrativos nacionais decorrentes de um regulamento da União ou tomar medidas provisórias a fim de previamente decidirem sobre situações ou relações jurídicas litigiosas sem ter em conta uma disposição jurídica da União Europeia.

Qualquer violação da obrigação de reenvio implica simultaneamente uma violação dos Tratados da União Europeia e pode levar à propositura de uma ação por incumprimento contra o Estado-Membro em questão, que poderá ser sancionado através de uma ação por incumprimento dos Tratados. Na prática, as consequências de uma tal ação permanecem muito circunscritas na medida em que o Governo do Estado-Membro em causa não pode dar seguimento a uma eventual condenação do Tribunal de Justiça, já que não pode dar instruções às instâncias jurisdicionais nacionais, por força do princípio da independência do poder judicial e da separação dos poderes. As possibilidades de êxito são todavia mais importantes desde que foi reconhecido o princípio da responsabilidade contratual dos Estados-Membros em caso de violação do direito da União (ver ponto seguinte), que permite que sejam intentadas ações de indemnização por danos suscetíveis de resultarem do desrespeito pelo Estado-Membro da obrigação de reenvio.

Efeitos do reenvio prejudicial: o reenvio prejudicial, que assume a forma de uma sentença, obriga o órgão jurisdicional que introduziu o pedido de decisão a título prejudicial, assim como as outras instâncias envolvidas no litígio. Acresce que, na prática, os reenvios prejudiciais funcionam como precedentes que têm também consideráveis efeitos sobre outros processos similares.

A responsabilidade dos Estados-Membros por violações do direito da União

O princípio da responsabilidade de um Estado-Membro pelos danos causados aos particulares por violações do direito da União Europeia que lhe são imputáveis foi reconhecido pelo Tribunal de Justiça no acórdão de 5 de março de 1996, nos processos apensos C-46/93 («Brasserie du pêcheur») e C-48/93 («Factortame»). Este acórdão inscreve-se na linha dos anteriores acórdãos relevantes pronunciados pelo Tribunal de Justiça em matéria de primado do direito da União Europeia, aplicabilidade direta das disposições do direito da UE e reconhecimento dos direitos fundamentais próprios da União. Conforme referiu o Tribunal de Justiça, o direito à reparação dos danos «constitui o corolário necessário do efeito direto das disposições comunitárias, cuja violação está na origem do prejuízo causado» e reforça consideravelmente as possibilidades de que os particulares dispõem para obrigar as autoridades nacionais (executivas, legislativas e judiciais) a respeitar e aplicar a legislação da União Europeia. O Tribunal de Justiça já desenvolveu a jurisprudência iniciada com os acórdãos «Francovich» e «Bonifaci». Ao passo que estes acórdãos circunscreviam a responsabilidade dos Estados-Membros aos casos em que particulares tinham sofrido danos em razão de uma transposição tardia de uma diretiva que lhes reconhecia direitos subjetivos, mas da qual não eram destinatários diretos, o acórdão mais recente estabelece o princípio da responsabilidade geral, que inclui todas as violações do direito da UE imputáveis ao Estado-Membro.

A responsabilidade dos Estados-Membros por violações do direito da União é reconhecida sempre que estão reunidas três condições prévias, que em si correspondem fundamentalmente às que se aplicam à União numa situação análoga.

  1. A disposição violada da UE deve ter por objeto o reconhecimento de direitos aos particulares.
  2. A violação deve ser suficientemente caracterizada, ou seja, é necessário que um Estado-Membro tenha violado de uma forma flagrante e considerável os limites impostos ao seu poder de apreciação. Esta apreciação incumbe aos órgãos jurisdicionais nacionais, pois só eles são competentes para estabelecer os factos e caracterizar as violações do direito da UE em causa. No seu acórdão, o Tribunal de Justiça formula algumas orientações fundamentais destinadas aos órgãos jurisdicionais nacionais. Designadamente:
    … entre os elementos que o órgão jurisdicional competente pode ser levado a tomar em consideração figuram o grau de clareza e precisão da regra violada, o âmbito da margem de apreciação que a regra violada deixa às autoridades nacionais ou [da União], o caráter intencional ou involuntário do incumprimento verificado ou do prejuízo causado, o caráter desculpável ou não de um eventual erro de direito, e o facto de as atitudes adotadas por uma instituição [da União] terem podido contribuir para a omissão, a adoção ou a manutenção de medidas ou práticas nacionais contrárias ao direito [da União]. De qualquer modo, encontramo-nos perante uma violação do direito [da União] suficientemente caracterizada, quando esta perdurou, apesar de ter sido proferido um acórdão em que se reconhecia o incumprimento imputado ou um acórdão num reenvio prejudicial, ou apesar de existir uma jurisprudência bem assente do Tribunal de Justiça na matéria, dos quais resulte o caráter ilícito do comportamento em causa.»
  3. Deve existir um nexo causal direto entre a violação da obrigação que incumbe ao Estado-Membro e o dano sofrido pelas pessoas lesadas. Não é indispensável a presença de culpa grave (intencional ou por negligência) que ultrapasse a violação suficientemente caracterizada do direito da União Europeia.

O Tribunal de Justiça estabeleceu inequivocamente que os princípios enunciados da responsabilidade também se aplicam ao terceiro poder, o poder judicial. As decisões que dele emanam podem doravante ser apreciadas não só pelas diferentes instâncias de recurso, bem como — na medida em que tiverem sido proferidas em desrespeito ou violação das normas do direito da União — no âmbito de uma ação de reparação/indemnização interposta junto dos órgãos jurisdicionais competentes dos Estados-Membros. Quando se procede ao apuramento da violação do direito da UE através da sentença em questão é necessário reexaminar as questões materiais atinentes à legislação da União Europeia sem que o órgão jurisdicional competente possa invocar eventuais efeitos vinculativos da sentença no mérito da questão. A instância para a qual os órgãos jurisdicionais nacionais competentes podem recorrer para quaisquer questões de interpretação e/ou de apreciação da validade das disposições da UE ou de compatibilidade entre as disposições nacionais em matéria de responsabilidade e o direito da União Europeia é de novo o Tribunal de Justiça, que pode ser demandado no âmbito de um reenvio prejudicial (artigo 267.º do TFUE). A responsabilidade por uma atuação indevida pelo poder judicial permanecerá, de resto, uma exceção. Tendo em conta o rigor das disposições em matéria de responsabilidade, esta responsabilidade só acaba por ser tomada em consideração quando um órgão jurisdicional ignora arbitrariamente o direito da União Europeia em vigor ou, como no processo «Köbler», um órgão jurisdicional de última instância, ignorando o direito da União Europeia, adota uma decisão com validade jurídica que prejudica os cidadãos da União Europeia sem ter sido previamente demandado o Tribunal de Justiça para se pronunciar sobre os condicionalismos jurídicos à luz do direito da União Europeia. Em última análise, a proteção dos direitos dos cidadãos da União Europeia, assente no direito da União Europeia, obriga imperativamente a que os cidadãos da UE, que sofram prejuízos em virtude de um órgão jurisdicional de última instância, sejam indemnizados.

O DIREITO DA UNIÃO EUROPEIA NO CONJUNTO DO SISTEMA JURÍDICO

Tendo em conta tudo o que vimos até agora sobre a estrutura da UE e a sua ordem jurídica, não é fácil determinar a posição do direito da União Europeia no conjunto do sistema jurídico e estabelecer as suas fronteiras com as outras ordens jurídicas. Duas tentativas de classificação são de rejeitar a priori: a que considera o direito da União como sendo apenas um conjunto de acordos entre estados e a que o vê como parte ou apêndice das ordens jurídicas nacionais.

A autonomia da ordem jurídica da União Europeia

Ao instituírem a União, os Estados-Membros limitaram os seus poderes legislativos soberanos e criaram uma ordem jurídica independente que os vincula, tal como aos seus nacionais, e que deve ser usada pelos seus órgãos jurisdicionais.

Um dos processos mais conhecidos ouvidos pelo Tribunal de Justiça foi o processo Costa vs. ENEL em 1964, em que o Sr. Costa intentou uma ação contra a nacionalização da geração e distribuição de eletricidade e a consequente aquisição do negócio das antigas companhias de eletricidade pela ENEL, a nova empresa pública.

A autonomia da ordem jurídica da UE tem um significado fundamental para ela própria, pois constitui a única garantia de que o direito da União Europeia não será desvirtuado pela interação com o direito nacional e de que poderá ser aplicado uniformemente em todos os Estados-Membros. Em virtude dessa autonomia, os conceitos jurídicos da UE são interpretados fundamentalmente à luz das exigências do direito e dos objetivos da União Europeia. Esta determinação dos conceitos, específica da União Europeia, é imprescindível, uma vez que os direitos garantidos pela ordem jurídica da UE poderiam estar em perigo se cada Estado-Membro pudesse ter a última palavra para decidir por si próprio a interpretação que faria dos princípios relativos às liberdades garantidas pelo direito da União. Analisemos, por exemplo, o conceito de «trabalhador», que determina o alcance do direito à liberdade de circulação. O conceito especificamente comunitário de «trabalhador» pode perfeitamente não corresponder inteiramente aos conceitos utilizados e conhecidos na ordem jurídica de um ou outro Estado-Membro. Acresce que o padrão para avaliar os atos da UE é exclusivamente o próprio direito da União e não o direito nacional ou constitucional de um Estado-Membro.

Assim, perante esta noção de autonomia da ordem jurídica da UE, como descrever a relação entre direito da União e direito nacional?

Mesmo apresentando-se o direito da UE como uma ordem jurídica independente das ordens jurídicas dos Estados-Membros, não se deve pensar que aquela e estas se sobrepõem como se fossem camadas. Contra esta visão rígida das ordens jurídicas existem dois argumentos: por um lado, elas dizem respeito a um mesmo indivíduo que reúne em si as qualidades de cidadão de um Estado e de cidadão da União. Por outro lado, um tal entendimento esqueceria que o direito da União Europeia só tem aplicação prática se for transposto para as ordens jurídicas dos Estados-Membros. A ordem jurídica da UE e as ordens jurídicas nacionais são, na verdade, interdependentes e cooperam entre si.

A interação entre o direito da União e o direito nacional

Este aspeto da relação entre o direito da União e o direito nacional abrange os domínios em que ambos se completam mutuamente. O artigo 4.º, n.º 3, do TUE ilustra muito bem esta relação:

Em virtude do princípio da cooperação leal, a União e os Estados-Membros respeitam-se e assistem-se mutuamente no cumprimento das missões decorrentes dos Tratados. Os Estados-Membros tomam todas as medidas gerais ou específicas adequadas para garantir a execução das obrigações decorrentes dos Tratados ou resultantes dos atos das instituições da União. Os Estados-Membros facilitam à União o cumprimento da sua missão e abstêm-se de qualquer medida suscetível de pôr em perigo a realização dos objetivos da União.»

A formulação deste princípio geral da cooperação leal ficou a dever-se ao facto de haver consciência de que a ordem jurídica da UE não tem condições para realizar, por si só, os objetivos pretendidos com a fundação da União Europeia. Ao contrário das ordens jurídicas nacionais, a ordem jurídica da UE não constitui um sistema autossuficiente, pois depende dos sistemas nacionais que estão na sua base para a respetiva aplicação. Todos os órgãos estatais legislativos, executivos (incluindo as administrações) e judiciais têm, pois, de reconhecer que a ordem jurídica da UE não é um sistema «externo» ou «estrangeiro» e que os Estados-Membros e as instituições da União pertencem solidariamente a um todo indissolúvel destinado a alcançar objetivos comuns. A UE não é apenas uma comunidade de interesses, é sobretudo uma comunidade solidária. Consequentemente, as autoridades nacionais devem não só respeitar os Tratados da União e as respetivas normas de execução emanadas das instituições da UE, mas também aplicá-las e dar-lhes vida. A interação entre o direito da União Europeia e o direito nacional assume aspetos tão multifacetados que vale a pena dar alguns importantes exemplos que ilustram isso mesmo.

A principal ilustração desta estreita ligação e da forma como a ordem jurídica da UE é completada pelas ordens jurídicas nacionais e vice-versa é o sistema da diretiva, que já abordámos quando falámos dos atos jurídicos. Ao passo que a diretiva estabelece apenas o objetivo a atingir de uma forma que é vinculativa para os Estados-Membros, são as autoridades nacionais, através da aplicação do direito nacional, que decidem acerca dos meios e da forma para o alcançar. No âmbito judicial, os dois sistemas estão estreitamente interligados através do processo de decisão prejudicial previsto no artigo 267.º do TFUE, nos termos do qual os órgãos jurisdicionais nacionais podem (devem) pedir ao Tribunal de Justiça uma decisão prejudicial quanto à interpretação ou à validade do direito da UE que pode ser relevante para as decisões nos processos que têm pendentes. O processo de decisão prejudicial demonstra que, por um lado, também os órgãos jurisdicionais dos Estados-Membros são obrigados a respeitar e aplicar o direito da União e, por outro, que a interpretação e a decisão quanto à validade do direito da UE competem exclusivamente ao Tribunal de Justiça. A interdependência entre as ordens jurídicas nacionais e da UE também é ilustrada pelos casos em que é necessário colmatar lacunas da ordem jurídica da União Europeia. O direito da União remete para as normas existentes no direito nacional para completar as normas que ele próprio determina. Por conseguinte, a partir de determinada altura, o destino de uma disposição do direito da União é determinado pelas respetivas disposições do direito nacional. De facto, este princípio aplica-se a todos os aspetos da execução do direito da União, sempre que este não estabeleça as suas próprias normas de execução. Em todos estes casos, as autoridades nacionais aplicam o direito da União segundo as normas do seu próprio direito nacional. Este princípio aplica-se obviamente apenas na medida em que não questione a eficácia do direito da União e respeite os requisitos de aplicação uniforme do direito da UE, devendo sempre evitar-se que os agentes económicos sejam tratados segundo padrões diferentes, logo injustos.

O conflito entre o direito da União e o direito nacional

As relações entre o direito da União e o direito nacional caracterizam-se igualmente pelo facto de a ordem jurídica da UE «colidir» por vezes com as ordens jurídicas nacionais. Fala-se então em conflito entre o direito da União e o direito nacional. Uma situação como esta surge sempre que uma disposição da União Europeia cria direitos e obrigações diretos para os seus cidadãos cujo conteúdo está em contradição com uma norma de direito nacional. Perante este problema, aparentemente simples, surgem duas questões fundamentais da organização da UE cuja solução devia constituir a pedra de toque da ordem jurídica da UE: a aplicabilidade direta do direito da União e o primado do direito da UE sobre o direito nacional que lhe é contrário.

A aplicabilidade direta do direito da União no direito nacional

A aplicabilidade direta do direito da União significa apenas que o direito da UE cria obrigações e confere direitos, não só para as instituições da UE e os Estados-Membros, mas também para os cidadãos da União.

Um dos grandes méritos do Tribunal de Justiça é o de ter reconhecido a aplicabilidade direta das disposições de direito da UE, apesar da resistência inicial de determinados Estados-Membros, e de ter consolidado assim a existência da ordem jurídica da União. O ponto de partida para esta jurisprudência foi o já referido processo que envolveu a empresa neerlandesa Van Gend & Loos, que intentou uma ação junto dos tribunais neerlandeses contra a administração das alfândegas do seu país por esta pretender cobrar um direito aduaneiro mais alto na importação de um produto químico da República Federal da Alemanha. A resolução deste litígio dependia de se saber se um particular podia invocar o disposto no artigo 12.º do Tratado CEE, que proíbe expressamente a introdução pelos Estados-Membros de novos direitos aduaneiros ou o aumento dos existentes no mercado comum. O Tribunal de Justiça pronunciou-se, contra o parecer de numerosos governos e do seu advogado-geral, pela aplicabilidade direta das disposições da UE, tendo em conta a natureza e os objetivos da União. Na fundamentação do acórdão proferido a propósito pode ler-se:

… que a Comunidade constitui uma nova ordem jurídica (…) cujos sujeitos são não só os Estados-Membros, mas também os seus nacionais. Por conseguinte, o direito comunitário, independente da legislação dos Estados-Membros, tal como impõe obrigações aos particulares, também lhes atribui direitos que entram na sua esfera jurídica. Tais direitos nascem não só quando é feita uma atribuição expressa pelo Tratado, mas também como contrapartida de obrigações impostas pelos Tratados de forma bem definida, quer aos particulares, quer aos Estados-Membros, quer às instituições comunitárias.»

Esta posição, por si só, não permite avançar muito porque resta saber quais são as disposições do direito da União Europeia que são diretamente aplicáveis. O Tribunal de Justiça começou por examinar esta questão à luz do direito primário da União, tendo estabelecido que todas as disposições dos Tratados da União Europeia podem ser diretamente aplicáveis aos nacionais dos Estados-Membros sempre que: 1) são formuladas sem reservas; 2) são autossuficientes e juridicamente perfeitas, e por estas razões; 3) não necessitam de qualquer ação dos Estados-Membros ou das instituições da União para a sua execução e eficácia.

Foi o que o Tribunal decidiu quanto ao antigo artigo 12.º do Tratado CEE. A empresa «Van Gend & Loos» podia basear-se neste artigo para fazer valer os seus direitos, que o tribunal neerlandês tinha que salvaguardar e, consequentemente, tinha de considerar ilícito o aumento do direito de importação, por contrário ao Tratado. Esta jurisprudência foi mais tarde desenvolvida pelo Tribunal de Justiça para outras disposições do Tratado CEE que são para o cidadão da União muito mais importantes do que o artigo 12.º do Tratado CEE, sendo de salientar os acórdãos relativos à aplicabilidade direta da livre circulação (artigo 45.º do TFUE), da liberdade de estabelecimento (artigo 49.º do TFUE) e da livre prestação de serviços (artigo 56.º do TFUE).

No que se refere às garantias de livre circulação, o Tribunal de Justiça pronunciou-se a favor da sua aplicabilidade direta no processo «Van Duyn». Em causa estavam os seguintes factos: em maio de 1973, a Sra. Van Duyn, cidadã neerlandesa, viu ser-lhe recusada a entrada no Reino Unido por aí querer trabalhar como secretária na «Igreja da Cientologia», uma organização que o Ministério do Interior britânico considerava «socialmente perigosa». Invocando as disposições do direito da União Europeia sobre livre circulação dos trabalhadores, a Sra. Van Duyn solicitou ao «High Court» que confirmasse o seu direito de residência no Reino Unido para aí exercer uma atividade profissional por conta de outrem e que, para tal, lhe fosse dada autorização para entrar no país. Instado pelo «High Court», no âmbito de um reenvio prejudicial, o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 48.º do Tratado CEE (artigo 45.º do TFUE) era diretamente aplicável e conferia aos particulares direitos que as jurisdições nacionais de um Estado-Membro deviam salvaguardar.

O Tribunal de Justiça foi instado pelo Conseil d’État belga relativamente à aplicabilidade direta do princípio da liberdade de estabelecimento, em relação ao qual este último tinha sido chamado a pronunciar-se numa ação interposta pelo advogado neerlandês J. Reyners, em que este invocava os seus direitos decorrentes do disposto no artigo 52.º do Tratado CEE (artigo 49.º do TFUE). Este advogado viu-se obrigado a intentar a ação na sequência de lhe ter sido recusada autorização para exercer advocacia na Bélgica, em razão da sua nacionalidade, apesar de ter passado os exames necessários na Bélgica. No seu acórdão de 21 de Juni de 1974, o Tribunal de Justiça estabeleceu que uma desigualdade de tratamento entre nacionais e estrangeiros em matéria de direito de estabelecimento não se podia manter após o período de transição, pois, a partir daí, o artigo 52.º do Tratado CEE era de aplicação direta e conferia aos cidadãos da União o direito de acesso a uma profissão e o direito de a exercer noutro Estado-Membro como qualquer nacional desse Estado. Com fundamento neste acórdão, o Sr. Reyners foi autorizado a exercer a sua atividade profissional de advogado na Bélgica.

O Tribunal de Justiça teve também ocasião de se pronunciar sobre a aplicabilidade direta do princípio da livre prestação de serviços no âmbito do processo «Van Binsbergen». Tratava-se, nomeadamente, de saber se uma disposição legal neerlandesa, por força da qual só os residentes nos Países Baixos podiam intervir como mandatários «ad litem» junto de um órgão jurisdicional de recurso, era compatível com as disposições do direito da União Europeia relativas à livre prestação de serviços. O Tribunal de Justiça respondeu pela negativa, fundamentando-se no facto de considerar que todas as restrições à liberdade de estabelecimento a que um cidadão da União estivesse sujeito em razão da nacionalidade ou da sua residência seriam contrárias ao artigo 59.º do Tratado CEE (artigo 56.º do TFUE) e, por isso, nulas.

Importa igualmente sublinhar a grande importância prática do reconhecimento da aplicabilidade direta do princípio da livre circulação de mercadorias (artigo 41.º do TFUE), do princípio da igualdade de remuneração entre homens e mulheres (artigo 157.º do TFUE), da proibição de qualquer forma de discriminação (artigo 25.º do TFUE) e da livre concorrência (artigo 101.º do TFUE).

No domínio do direito derivado, a questão da aplicabilidade direta coloca-se em relação às diretivas e às decisões cujos destinatários sejam os Estados-Membros, uma vez que os regulamentos e as decisões cujos destinatários são pessoas singulares são já diretamente aplicáveis por força dos Tratados da UE (artigo 288.º, n.os 2 e 4, do TFUE). Desde 1970 que o Tribunal de Justiça tornou o princípio da aplicabilidade direta do direito primário da União extensível às disposições das diretivas e às decisões dirigidas aos Estados-Membros.

Nunca será de mais salientar a importância prática da aplicabilidade direta do direito da União, tal como tem sido reconhecida pelo Tribunal de Justiça de uma forma frutuosa e cada vez mais alargada: reforça a posição dos cidadãos, na medida em que transforma as liberdades previstas no mercado comum em direitos que podem ser invocados perante os tribunais nacionais. A aplicabilidade direta é, por assim dizer, uma das traves-mestras em que assenta a ordem jurídica da União Europeia.

O primado do direito da União sobre o direito nacional

A aplicabilidade direta de uma norma da União suscita uma outra questão igualmente fundamental: o que acontece quando uma disposição do direito da União, que estabelece direitos e obrigações diretamente para os cidadãos da UE, é incompatível no seu conteúdo com uma norma de direito nacional?

Tal conflito apenas se resolve se uma das duas ordens jurídicas prevalecer sobre a outra. O direito escrito da União Europeia não contém qualquer disposição clara nesta matéria. Em nenhum dos Tratados existe uma regra que determine se é o direito da UE que deve ceder ou se é o direito nacional. O conflito entre estes dois direitos só pode ser resolvido na medida em que seja dado ao direito da União o primado sobre o direito nacional e, assim, todas as disposições nacionais que se afastem de uma disposição da UE sejam esquecidas e esta ocupe o seu lugar nas ordens jurídicas nacionais. Doutro modo, o que restaria do direito da União se o pretendêssemos subordinar ao direito nacional? Quase nada! As disposições da União podiam ser anuladas por qualquer lei nacional e, assim, estaria igualmente excluída a sua aplicação uniforme em todos os Estados-Membros. Outra consequência seria a impossibilidade de a UE cumprir as tarefas que lhe foram cometidas pelos Estados-Membros. O funcionamento da União seria posto em causa e a construção de um sistema comum de direito europeu, portador de grandes esperanças, estaria definitivamente comprometida.

Um problema desta natureza não existe nas relações entre direito internacional e direito nacional. Uma vez que o direito internacional deve ser integrado ou transposto para o direito interno para poder fazer parte da ordem jurídica de um país, a questão do primado resolve-se exclusivamente na base do direito interno. Consoante o lugar que o direito nacional reconhece ao direito internacional, este último pode exercer a sua primazia sobre o direito constitucional, ser colocado entre o direito constitucional e o direito comum ou ao mesmo nível que o direito comum. As relações ao mesmo nível entre a legislação internacional integrada ou transposta e a legislação nacional regem-se pelo princípio do primado das disposições mais recentes sobre as mais antigas (lex posterior derogat legi priori). Estas disposições nacionais que regem os conflitos entre normas jurídicas não se aplicam, em contrapartida, à relação entre direito da União e direito nacional, já que aquele não é parte integrante da ordem jurídica nacional. Em consequência, qualquer conflito entre a legislação da União e a legislação nacional deve ser exclusivamente resolvido com base na ordem jurídica da UE.

Foi de novo o Tribunal de Justiça que, prevendo estas consequências, impôs o princípio do primado do direito da UE sobre o direito nacional, fazendo-o, no entanto, com a resistência de alguns Estados-Membros. Dotou, assim, a ordem jurídica da UE de uma segunda trave-mestra, depois da aplicabilidade direta, que a transformou definitivamente num edifício sólido.

No já mencionado acórdão «Costa vs. ENEL», o Tribunal de Justiça formulou duas considerações muito significativas no tocante às relações entre o direito da União e o direito nacional:

  • Primeiro: os Estados-Membros transferiram de forma definitiva para uma Comunidade, por eles criada, certos direitos soberanos, e medidas unilaterais posteriores seriam incompatíveis com o conceito de direito da União Europeia.
  • Segundo: o Tratado estabelece como princípio fundamental que um Estado-Membro não pode pôr em causa a particularidade que tem o direito da UE de se impor uniforme e completamente no conjunto da União.

Resulta destas considerações que o direito da União, criado por força dos poderes previstos nos Tratados, detém o primado sobre toda e qualquer norma jurídica de direito nacional a ele contrária. Prevalece não só sobre a legislação nacional anterior, mas também sobre atos legislativos ulteriores.

Em síntese, o Tribunal de Justiça, quando proferiu o acórdão Costa vs. ENEL, não pôs em causa a nacionalização do setor da eletricidade em Itália, mas estabeleceu sem equívoco o primado do direito da União sobre o direito nacional.

A consequência jurídica deste princípio do primado é que, em caso de conflito entre leis, a disposição nacional contrária à disposição da UE deixa de ser aplicável e não podem ser introduzidas novas disposições de direito interno contrárias à legislação da União.

O Tribunal de Justiça manteve-se fiel a estes princípios na sua jurisprudência posterior. Num ponto, contudo, desenvolveu-a. Assim, embora no acórdão supracitado o Tribunal de Justiça se tenha apenas pronunciado em relação ao primado do direito da União Europeia sobre as leis nacionais, afirmou também o princípio do primado do direito da UE nas relações entre este último e o direito constitucional nacional. Embora no início hesitassem, os tribunais nacionais acabaram por seguir, no essencial, a interpretação do Tribunal de Justiça. Nos Países Baixos, onde a constituição reconhece expressamente o princípio do primado do direito da União Europeia sobre o direito nacional (artigos 65.º a 67.º), nunca poderiam surgir dificuldades. Nos outros Estados-Membros, os órgãos jurisdicionais nacionais reconheceram igualmente este princípio face às legislações nacionais. Em contrapartida, os tribunais constitucionais da República Federal da Alemanha e da República Italiana começaram por não aceitar o princípio do primado do direito da UE sobre o direito constitucional interno, em especial no que se refere a garantias nacionais em matéria de direitos fundamentais. Apenas admitiram esse primado quando a proteção dos direitos fundamentais na ordem jurídica da UE tinha atingido um nível correspondente, no essencial, ao que consagram as constituições nacionais. No entanto, subsistem as reservas do Tribunal Constitucional da República Federal da Alemanha face a uma progressiva integração, que exprimiu com clareza, sobretudo nos seus acórdãos sobre o Tratado de Maastricht e, ultimamente, sobre o Tratado de Lisboa.

No processo Pfeiffer, o Tribunal de Justiça clarificou, em 2004, que os assistentes de emergência médica estão abrangidos pelo âmbito de aplicação da Diretiva «Tempo de trabalho» (Diretiva 93/104/CE). Os serviços de urgência interna tinham de ser considerados para efeitos do cálculo da duração máxima de trabalho semanal de 48 horas.

A interpretação do direito nacional em conformidade com o direito da União

Para evitar um conflito sobre normas cuja resolução requeira o recurso à regra do primado do direito da União sobre o direito nacional, todas as autoridades nacionais que aplicam o direito ou a jurisprudência devem inicialmente recorrer à interpretação do direito nacional em conformidade com o direito da União.

A figura da interpretação da conformidade com o direito da União só foi reconhecida de forma relativamente tardia pelo Tribunal de Justiça quando foi introduzida na ordem jurídica da União Europeia. Só depois de o Tribunal de Justiça, em resposta a questões dos órgãos jurisdicionais nacionais, ter considerado que era «adequado garantir» uma interpretação uniforme das disposições jurídicas nacionais no âmbito de aplicação de uma diretiva é que, apenas em 1984, se determinou que se assumiria um compromisso para uma interpretação conforme das diretivas no processo Von Colson e Kamann. Este processo dizia respeito à fixação do montante de uma indemnização por danos resultantes da discriminação de mulheres na contratação laboral. Ao passo que o Governo alemão previa apenas uma indemnização pela quebra de confiança (e sobretudo as despesas puramente resultantes da candidatura), a Diretiva 76/207/CEE exigia a aplicação de sanções efetivas segundo o direito nacional para implementação da igualdade dos géneros no acesso à profissão. Porém, uma vez que a sanção não teve concretização, a diretiva não pôde ser considerada como de aplicação direta neste ponto, com o risco de que viesse a ser proferida uma sentença que estabelecesse a ilegalidade da legislação nacional face à legislação da União mas não desse fundamento às instâncias jurisdicionais nacionais para deixarem de levar em conta as disposições nacionais. Foi por isso que o Tribunal de Justiça estatuiu que os órgãos jurisdicionais nacionais eram obrigados a interpretar e aplicar as disposições nacionais de direito civil de forma a garantir uma sanção efetiva da discriminação com base no género. Uma indemnização meramente simbólica não era suficiente para dar resposta à necessidade de transpor a diretiva de uma forma eficaz.

O Tribunal de Justiça considera como base jurídica de uma interpretação em conformidade com o direito da União Europeia o princípio da cooperação leal (artigo 4.º, n.º 3, do TUE). Assim sendo, os Estados-Membros são obrigados a tomar todas as medidas adequadas, de cariz geral ou específico, para cumprir as obrigações resultantes do TUE ou da ação das instituições da União Europeia. Acresce que as autoridades nacionais devem ajustar a aplicação e interpretação do direito nacional que venha a entrar em conflito com as disposições da UE no que se refere ao respetivo teor e objetivo (dever de lealdade para com a União Europeia — processo Pfeiffer). Os órgãos jurisdicionais nacionais verão aqui também refletido o seu papel como órgãos jurisdicionais europeus enquanto depositários do dever de utilizarem e respeitarem devidamente o direito da União Europeia.

Uma forma especial de interpretação da conformidade com o direito da UE é a interpretação conforme das diretivas. Por conseguinte, os Estados-Membros estão obrigados a transporem as diretivas. Os responsáveis pela aplicação do direito e os órgãos jurisdicionais devem contribuir para uma interpretação conforme das diretivas, de forma que esta obrigação seja plenamente respeitada pelo Estado-Membro em questão. A interpretação conforme das diretivas permite alcançar a conformidade das diretivas ao nível da aplicação do direito e garante, deste modo, a interpretação e aplicação uniformes da legislação transposta para o direito nacional de todos os Estados-Membros. Não se deve dividir no plano nacional o que acabou agora precisamente de ser harmonizado por diretivas ao nível da União Europeia.

A interpretação quanto à conformidade com o direito da UE atinge os seus limites quando a redação de forma clara da disposição nacional não permite uma interpretação. Mesmo perante a obrigação que o direito da União Europeia tem de adotar uma interpretação conforme com o direito da União, não pode o direito nacional ser interpretado «contra legem», e isto também é válido no caso de uma recusa expressa do legislador nacional de transpor uma diretiva para o direito nacional. Um conflito daí resultante, entre o direito da União e o direito nacional, só poderá ser solucionado através de uma ação por incumprimento dos Tratados (artigos 258.º e 259.º do TFUE).

CONCLUSÕES

Qual a visão de conjunto que podemos extrair da estrutura da União Europeia e da sua ordem jurídica?

A ordem jurídica da UE é o fundamento essencial da União e caracteriza-a como uma comunidade de direito. Só a criação e a salvaguarda de um novo direito permitem realizar os objetivos que presidiram à instituição da UE. A ordem jurídica da União Europeia conseguiu fazer muito nesta perspetiva. É também graças a esta nova ordem jurídica que 510 milhões de pessoas sentem já, na sua vida diária, o mercado interno europeu como uma realidade quotidiana, com a abertura das fronteiras, o elevado intercâmbio de mercadorias e serviços, a livre circulação de trabalhadores e a intensidade das relações entre empresas de diferentes países. Uma outra característica da ordem jurídica da UE, hoje já com uma importância histórica, é o seu forte contributo para a paz. Tendo como objetivo a manutenção da paz e a liberdade, esta nova ordem jurídica substitui-se à força quando se trata de resolver conflitos, uma vez que as suas regras de direito obrigam, quer os cidadãos, quer os Estados-Membros numa comunidade solidária. A ordem jurídica torna-se, assim, um importante instrumento de construção e salvaguarda da paz.

A ordem jurídica da UE, assim como a comunidade de direito dela dependente, só sobrevivem na medida em que o seu respeito e a sua proteção sejam garantidos, o que acontece, de facto, mercê dos dois pilares em que assenta a primeira: a aplicabilidade direta do direito da UE e o seu primado sobre o direito nacional. Estes dois princípios, para cuja existência e salvaguarda o Tribunal de Justiça contribuiu com grande determinação, garantem a aplicação uniforme e prioritária do direito da União em todos os Estados-Membros.

Apesar das lacunas que a caracterizam, o contributo da ordem jurídica da UE para a solução dos problemas políticos, económicos e sociais dos Estados-Membros tem um valor inestimável.

JURISPRUDÊNCIA CITADA

Todas as decisões do Tribunal de Justiça da União Europeia podem ser consultadas em: www.eur-lex.europa.eu. Além disso, o sítio EUR-Lex.europa também fornece acesso gratuito, nas 24 línguas oficiais da UE, ao seguinte:

  • direito da UE (Tratados da UE, regulamentos, diretivas, decisões, legislação consolidada, etc.);
  • atos preparatórios (propostas legislativas, relatórios, livros verdes e brancos, etc.),
  • convenções internacionais;
  • sínteses da legislação da UE que colocam os atos legislativos nos respetivos contextos políticos.

Natureza jurídica e primado do direito da União Europeia

Competências da União Europeia

Processo 6/76 — Kramer, ECLI:EU:C:1976:114 (relações externas; compromissos internacionais; autoridade da UE).

Parecer 2/91, ECLI:EU:C:1993:106 (repartição de competências entre a UE e os Estados-Membros).

Parecer 2/94, ECLI:EU:C:1996:140 (adesão da UE à CEDH; ausência de competências).

Parecer 2/13, EU:C:2014:2454 (incompatibilidade do projeto de acordo de adesão da UE à CEDH com o direito da UE).

Efeitos dos atos jurídicos

Direitos fundamentais

Proteção jurídica

NOTAS

(1) De acordo com o estatuto definido na Resolução 1244 do Conselho de Segurança das Nações Unidas.

(2) A demissão da «Comissão Santer» em 1999 foi desencadeada pela recusa de quitação do Parlamento pela execução orçamental, tendo sido rejeitada a moção de censura que também foi apresentada, embora por uma margem relativamente pequena.

(3) Após o referendo relativo ao Brexit, o Reino Unido renunciou à sua presidência do Conselho agendada para o segundo semestre de 2017.

(4) Para mais informações, consultar o capítulo sobre responsabilidade dos Estados-Membros por violações do direito da União.

Acerca desta publicação

A publicação «O ABC do direito da União Europeia» pode ser encontrada na Internet em //publications.europa.eu/pt/publication-detail/-/publication/f8d9b32e-6a03-4137-9e5a-9bbaba7d1d40

Comissão Europeia
Direção-Geral da Comunicação
Unidade «Informação dos Cidadãos»
1049 Bruxelas
BÉLGICA

Manuscrito concluído em dezembro de 2016

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Qual é o nível de integração da União Europeia?

VERDADEIRO – A União Europeia é o bloco econômico que melhor expressa um projeto de organização e integração regional, englobando todos os níveis de integração: Zona de Livre Comércio, União Aduaneira, Mercado Comum e União Política, Econômica e Monetária. O euro é a moeda adotada por esse bloco.

Como surgiu a integração da União Europeia?

A criação da União Europeia veio apenas em 1992, na cidade de Maastricht na Holanda, quando os países da CEE se reuniram e assinaram o chamado Tratado de Maastricht. Este tratado, que entrou em vigor apenas em 1993, propôs uma integração e cooperação econômica, buscando harmonizar os preços e as taxas de importação.

O que é a União Europeia como ela chegou a esse grau de integração dos países?

Resumo sobre União Europeia Foi oficialmente criada, em 1992, com a assinatura do Tratado de Maastricht. Trata-se de uma união econômica e política que estabelece a livre circulação de pessoas, capitais e mercadorias entre os seus países-membros, além de garantir a segurança e liberdade de sua população.

Quais as etapas da integração europeia?

As bases constitutivas da União Europeia foram consagradas nos tratados: O Tratado de Paris, que instituiu a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA), em 1951; Os Tratados de Roma, que instituíram a Comunidade Económica Europeia (CEE) e a Comunidade Europeia da Energia Atómica (Euratom), em 1957.

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