O que podemos afirmar sobre os latifúndios no Nordeste durante a colonização do Brasil?

Por definição, plantation é o nome dado a um modelo de organização econômica em que se destacam quatro aspectos principais: latifúndio, monocultura, mão-de-obra escrava e produção voltada para o mercado externo. Durante o período colonial brasileiro, este foi o modelo adotado em larga escala, sendo a cana-de-açúcar o principal produto cultivado até meados do século 18.

A plantation foi utilizada por Portugal para organizar economicamente sua colônia na América. Afinal, o principal objetivo da

colonização do Brasil

era exatamente o de transformá-lo num gerador de riquezas para a metrópole.

A monocultura da cana, assim, apareceu para

Portugal

como a forma mais imediata de obter tais recursos. A partir daí, o uso em larga escala do latifúndio e da mão-de-obra

escrava

- principalmente negra - vieram completar o quadro que caracterizava a plantation.

O problema da vinculação externa

Organizado, de maneira geral, sob a forma de plantation, o Brasil logo se vinculou economicamente ao mercado internacional - naquele momento restrito à sua metrópole. Isso porque, sendo uma forma de organização voltada para o mercado externo, a plantation, ao ser empregada no Brasil, fez com que sua economia estivesse voltada em grande medida para fora, e não para dentro, para o mercado interno.

Embora verdadeira, essa constatação pode encobrir o fato de que nem toda a colônia estava organizada sob a forma de plantation. Nem tampouco vivia em torno do binômio senhor-escravo: o primeiro, associado ao controle do latifúndio; o segundo, à mão-de-obra empregada nele.

No Norte do Brasil, por exemplo, até meados do século 18, havia atividades econômicas importantes ligadas à extração das chamadas drogas do sertão, com o emprego da mão-de-obra escrava indígena, ao invés da negra. Na Região Sul, existia um espaço significativo dedicado à caça de gado, praticada por mestiços e índios, que viviam da comercialização de couro e da extração de mate. No interior do Nordeste, a economia de algumas áreas dependia sobretudo da pecuária, em cuja atividade eram empregados mestiços livres.

Economia não se restringiu à plantation

A questão, portanto, é saber que, apesar de a plantation ter sido o modelo mais geral de organização econômica nos primeiros dois séculos da ocupação portuguesa, e que sua implantação revelou o interesse em fazer do Brasil um verdadeiro gerador de riquezas para a metrópole, é importante lembrar também que a economia colonial não se limitou a esse sistema. Longe disso, havia outras atividades importantes em pontos distintos da colônia.

A visão mais difundida sobre esse período apresenta o Brasil como uma colônia absolutamente submissa à Portugal. Sua economia teria sido estruturada de modo a garantir as riquezas para a metrópole. Daí então o sentido da plantation. E, com ela, a impossibilidade de desenvolvimento do mercado interno - praticamente inexistente.

Mas novas pesquisas mostraram que as plantantions também possuíam um espaço reservado à produção de alimentos destinados ao mercado interno. Era a chamada "brecha camponesa", ou seja, uma porção do latifúndio em que o escravo produzia para seu senhor e também para si mesmo, o que lhe garantia algum vínculo com a terra - ajudando a inibir parcialmente as fugas para os

quilombos

- e recursos oriundos da venda do excedente - alimentando a perspectiva de comprar sua própria alforria.

Note-se, portanto, que há, nessas novas interpretações, uma redefinição das plantations e da própria inserção do escravo na vida sócio-política do Brasil colonial. Embora seja possível identificar a definição clássica de plantation como o modelo de organização da economia implantado no Brasil, é preciso estar atento para o fato de que ele nem foi generalizado em sua aplicação nem tampouco absoluto em suas características.

Na época do Império, embora o Brasil fosse agrário e dependesse da renda gerada pela exportação do café, a zona rural estava mergulhada no caos e na insegurança jurídica. Ao contrário de hoje, poucos eram os fazendeiros com o registro da propriedade. Eles eram os donos das chamadas sesmarias, terras doadas de papel passado pelo rei português, ainda nos idos da Colônia, com a exigência de que fossem cultivadas.

Sendo extensas demais e tendo só um pedaço efetivamente explorado, as sesmarias viviam sob o constante risco de serem confiscadas.

Em 1823, logo após a Independência, dom Pedro I proibiu a doação de novas sesmarias, mas não pôs no lugar nenhuma nova regra para a apropriação da zona rural. No vácuo legal, as pessoas começaram a invadir as terras públicas desocupadas. Nesse Brasil despovoado, ainda longe dos 10 milhões de habitantes (hoje são 210 milhões), havia terras livres de sobra. Assim, por meio da simples ocupação, surgiram humildes camponeses cultivando para a própria subsistência e também poderosos latifundiários plantando para a exportação.

Na ausência do título oficial da propriedade, tanto pobres quanto ricos não passavam de posseiros e, como tais, também corriam o risco de terem a terra confiscada a qualquer momento. Enquanto os sesmeiros eram minoria, os posseiros eram maioria.

— No Brasil, têm sido esbanjadas as terras — queixou-se o senador Bernardo Pereira de Vasconcellos (MG). — Só não é proprietário o que não quer ser. Depois da suspensão das sesmarias, qualquer apodera-se de terreno devoluto, fixa nele sua residência, planta, colhe e ninguém lhe disputa.

Para o senador Vergueiro (MG), o problema eram apenas os pequenos posseiros:

— Se não se puser obstáculo a essas invasões, apenas restarão algumas terras devolutas nas províncias do Pará, de Mato Grosso e de Goiás [as atuais Regiões Norte e Centro-Oeste inteiras]. Para as mais, acabam-se em pouco anos. E será isso útil? Não, é prejudicialíssimo não só aos interesses do Tesouro, mas da civilização, porque essa gente espalha-se pelo meio do sertão e barbariza-se, não reconhece autoridades senão as suas paixões.

 O senador Carneiro Leão (MG) concordou. Na visão dele, apenas os grandes posseiros eram dignos da proteção pública:

— Em presença da inércia, do desleixo do governo, a população cansou-se de esperar e entrou sem mais cerimônia pelas terras da nação, prestando assim um verdadeiro serviço ao país, pois contribuiu para o aumento e progresso da lavoura. Não se pense que todas as posses se reduzam a uma pequena roça e à construção de uma casinha de palha. A princípio podia ser assim, mas depois em boa parte delas estabeleceram-se grandes plantações.

Para completar o caos fundiário do Império, não existiam limites claros entre uma terra e outra. Os sesmeiros evitavam a demarcação porque os técnicos que mediam os terrenos eram escassos e careiros. Os posseiros, por sua vez, porque não tinham escritura. Em razão das divisas nebulosas, os conflitos entre vizinhos eram corriqueiros.

— Há nas terras muitas posses de muitos donos. Cada um deles fixa os seus limites arbitrariamente. Quando há contestações, a questão quase sempre se decide pelo bacamarte [espécie de espingarda] — afirmou o senador Francisco de Paula Souza (SP). — Agora mesmo tenho notícia de que na Vila da Constituição [atual Piracicaba], em São Paulo, nos últimos meses houve 13 ou 14 assassinatos em consequência de questões de terras. Eu estou convencido de que esta lei é sumamente necessária, principalmente para prevenir os abusos e as violências que se praticam no interior.

O historiador Marcio Both, professor da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste) e estudioso da Lei de Terras, explica que o sistema colonial de sesmarias já havia significado a escolha do Brasil pelo latifúndio. Como havia a exigência de que as sesmarias fossem exploradas, o latifúndio e o trabalho escravo andavam de mãos dadas.

— Em meados do século 19, no contexto de expansão mundial do capitalismo, o Brasil precisava oficializar a transformação da terra em mercadoria. É claro que, antes de 1850, a terra podia ser comercializada, mas essa não era a regra. A Lei de Terras veio como parte de uma série de reformas liberais que procuraram pôr o Brasil entre as nações ditas civilizadas.

Ainda de acordo com Both, a mudança do status das terras em 1850 teve ligação com a iminente mudança de status dos escravos:

— Até então, o poder do latifundiário se media pelo número de pessoas sob seu controle, principalmente escravos. Em épocas em que a terra não tinha fronteiras definidas nem documentos que comprovassem a titularidade, os escravos, sim, tinham registro, garantiam segurança financeira e eram até utilizados como garantia em empréstimos. Com a abolição da escravidão a caminho, a terra precisava ser transformada definitivamente em mercadoria e ganhar valor. O poder do latifundiário foi passando dos escravos para a terra.

Os senadores e deputados, no fim das contas, não incluíram na Lei de Terras o tal preço estratosférico para a venda das terras públicas. Acabou ficando a cargo do governo fixar o valor. Por outro lado, eles tiveram sucesso em barrar uma proposta de taxação das terras privadas. O anteprojeto escrito pelos conselheiros de dom Pedro II previa a cobrança anual de um tributo semelhante ao atual Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR). No Parlamento, a grita foi geral.

— A simples enunciação desta proposição importa uma questão grave. Grave porque é odiosa. Odiosa porque tem em vista estabelecer um imposto — protestou o Visconde de Abrantes.

— Eu não me queixo pelo que me toca. Não me causa gravame pagar este imposto que se propõe, porque as minhas terras produzem, dão-me um lucro correspondente. Mas nem todos estão nestas circunstâncias — argumentou Vergueiro. — Meus vizinhos mesmo, que têm terras de inferior qualidade [e produzem pouco], não podem pagar isto. É muito pesado para eles. Não falo agora das terras que estão nos lugares mais remotos, nas províncias do interior, sem comércio de exportação 

— Como se pode tributar o terreno que nada produz ou produz muito pouco? Bem vê o Senado que esta medida não só é oposta às regras da ciência, como à justiça e ao bom senso — acrescentou Francisco de Paula Souza.

Em tom dramático, o senador Costa Ferreira argumentou que a situação dos fazendeiros já era dura demais sem o imposto:

— Quem não é lavrador e se sustenta à larga dos rendimentos dos lavradores julga que eles são felizes. Mas quem é lavrador experimenta o peso das desgraças sobre seus ombros e no fim do ano, depois de empregar 90 ou 100 escravos na lavoura, recolhe uma quantia tal que apenas chega para sustentar sua família. Esse homem é que sabe a vida que passa. Legisladores, quereis aumentar a aflição ao aflito, vós que nunca experimentastes a necessidade? Este tributo não é só injusto, mas injustíssimo, porque carrega sobre uma classe que não pode suportá-lo.

Ele deixou no ar uma sutil ameaça ao governo imperial:

— É assim que se quer avexar os lavradores, que são os verdadeiros sustentáculos da Monarquia? Lembrai-vos, senhores, que a besta suporta a carga, mas a sobrecarga a sacode.

Como se deu a formação de latifúndios no Brasil?

A origem do latifúndio está ligada ao processo de ocupação do Brasil após a chegada dos portugueses. Em 1536, Lisboa decidiu dividir o território brasileiro em grandes faixas de terras que iam do litoral até a linha imaginária determinada pelo Tratado de Tordesilhas.

O que são latifúndios e como eles se relacionam com o início da exploração ordenada da terra no Brasil?

Latifúndio corresponde a uma extensa propriedade agrícola privada, geralmente não exploradas economicamente, portanto improdutivas. Quando exploradas são destinadas ao cultivo de um único produto agrícola (monocultura), com finalidade de abastecer, comumente, o mercado externo, devido à produção em larga escala.

Quais as consequências do latifúndio?

A expulsão dos trabalhadores rurais do campo e a ampliação dos latifúndios tem como consequência intensos conflitos entre grandes proprietários e camponeses. Segundo a Pastoral da Terra, somente nos estados do Pará, Bahia, Mato Grosso, Paraíba e Rondônia em 2018, foram assassinadas 28 pessoas.

Qual o maior latifúndio do Brasil?

A fazenda Curuá fica em Altamira e pertence a uma empresa do grupo C.R. Almeida, sócia majoritária da EcoRodovias, que administra diversas estradas no Brasil. Na sentença da 9ª Vara Federal, em Altamira, o juiz Hugo da Gama Filho refere-se ao território como o "maior latifúndio do Brasil".