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30/11/2005 - 20:25 A Comissão de Seguridade Social e Família realizou nesta quarta-feira audiência pública para celebrar os 70 anos de nascimento do sociólogo Herbert José de Souza, o Betinho (1935-1997). Lei orgânica Biografia Reportagem - Adriana Resende e Idhelene Macedo
O presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), Francisco Menezes, afirmou que o trabalho
de Betinho contra a miséria e a fome transformou o conceito de cidadania. "Ele ajudou a mostrar que temos de acabar com a idéia do fatalismo, de que as coisas são como são. A miséria foi construída por um grupo de fatores e forças e mantida por falta de vontade política para acabar com ela", salientou.
A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), que solicitou a realização da audiência, concordou que Herbert de Souza era um idealizador, mas tinha também um lado prático na luta contra a fome. "A
grande marca dele foi recriar o conceito de cidadania, mostrando à sociedade seu papel essencial no combate à fome, junto ao do governo, que não pode fugir à responsabilidade", afirmou Jandira Feghali.
Francisco Menezes é também coordenador de Segurança Alimentar do Instituto de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), entidade fundada por Betinho. Menezes observou que o Projeto de Lei 6047/05, do Poder Executivo, que cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e
Nutricional (Sisan), significa a continuação da obra do sociólogo. Segundo Menezes, a idéia é organizar os programas e as ações de segurança alimentar, que hoje são muito fragmentados.
"O projeto pretende organizar o sistema. Essa é uma antiga ambição de Betinho e todos aqueles que militavam dentro da perspectiva da segurança alimentar e nutricional e sempre dentro do olhar do direito humano à alimentação."
Nascido em Bocaiúva (MG) em 1935, Betinho completaria 70
anos. Assim como os irmãos - o cartunista Henfil e o compositor Chico Mário -, o sociólogo herdou da mãe a hemofilia. Os três contraíram o vírus da aids em transfusões de sangue e morreram em conseqüência da doença.
Desde a época de estudante, Betinho expunha suas idéias em favor da democracia. Em 1964, com o regime militar, passou a ser procurado e teve de passar cinco anos na clandestinidade. Também viveu no exílio por 11 anos, primeiro no Chile, depois no Canadá e Suécia.
O sociólogo
voltou ao Brasil em 1979 e logo fundou o Ibase. Em 1990, organizou um grande evento no Rio de Janeiro pela reforma agrária e pela luta ambiental. No ano seguinte, ganhou o prêmio Global 500, da Organização das Nações Unidas.
O sociólogo Betinho tornou-se conhecido nacionalmente em 1993, por sua campanha contra a fome. Organizou a ONG Ação Cidadania Contra a Miséria e pela Vida. O trabalho da entidade foi reconhecido com um prêmio internacional: o Troféu Criança e Paz, concedido pelo Fundo das
Nações Unidas para a Infância (Unicef). O sociólogo se afastou da campanha contra a fome em maio de 1997, quando já estava bastante debilitado pela doença. Morreu três meses depois.
Edição - Francisco Brandão
(Reprodução autorizada mediante citação da Agência)
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Cidadania é uma conquista
Na década de 1990, o sociólogo Herbert de Souza (1935-1997), conhecido como Betinho, concebeu e comandou a Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida. Aderiram à campanha empresas públicas e privadas; meios de comunicação; brasileiros e brasileiras de todas as classes sociais, idades, categorias profissionais, tendências políticas e religiosas; e, principalmente, jovens dispostos a recolher e distribuir alimentos. Betinho apostou na juventude como instrumento para abrir espaço para a solidariedade no país, acreditando que a mudança social passa pelo combate à fome:
Todos podem e devem comer, trabalhar e obter uma renda digna, ter escola, saúde, saneamento básico, educação, acesso à cultura. Ninguém deve viver na miséria. Todos têm direito a vida digna, à cidadania. A sociedade existe para isso. Ou, então, ela simplesmente não presta para nada. O Estado só tem sentido se é um instrumento dessas garantias. A política, os partidos, as instituições, as leis só servem para isso. Fora disso, só existe a presença do passado no presente, projetando no futuro o fracasso de mais uma geração. [...] Tenho fome de humanidade.
SOUZA, Herbert de. O pão nosso. Veja 25 anos: reflexões para o futuro. São Paulo: Abril, 1993, p. 20-21.
As ações desenvolvidas pelo sociólogo permitem demonstrar que a cidadania é fruto da conquista de direitos e um mecanismo para tornar as sociedades mais igualitárias. A cidadania se relaciona, portanto, com o princípio de igualdade e com a ampliação da democracia e o respeito a direitos na sociedade. Esses direitos são instituídos por lei e se baseiam em princípios morais e de convivência social, como o direito à saúde ou a uma educação de qualidade, o direito de praticar qualquer religião ou de exercer uma profissão.
LEGENDA: O sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, em campanha da Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida, em 1995.
FONTE: Patrícia Santos/Folha Imagem
A cidadania como exercício dos direitos e deveres de um indivíduo em uma sociedade politicamente organizada se consolidou com o advento da sociedade industrial e as lutas sociais dos séculos XIX e XX. No Brasil, a exclusão social tem razões históricas que remetem tanto ao período de colonização, especialmente no que se refere à discriminação e marginalização de indígenas e afrodescendentes, quanto às políticas públicas implementadas após a Proclamação da Independência. Nesse sentido, a questão da inclusão e exclusão sociais só pode ser superada mediante a demanda por direitos e pela ampliação da cidadania.
Os direitos, legitimados pelas leis, decorrem, na maioria das vezes, da pressão e da mobilização da sociedade civil. De um modo geral, só existe cidadania quando há possibilidade de os indivíduos, com seus direitos e deveres garantidos por um Estado democrático, se tornarem sujeitos atuantes nos rumos da história. Um exemplo de mobilização popular em países com regimes ditatoriais prolongados foi a Primavera Árabe, que ocorreu em 2011, no Oriente Médio e Norte da África. Manifestações, passeatas, comícios e protestos populares aconteceram no Egito, na Tunísia, na Líbia, na Síria e em outros países em razão do agravamento da crise econômica e da falta de democracia. As mídias sociais foram amplamente utilizadas para organizar, comunicar e sensibilizar a população e a comunidade internacional sobre a necessidade de liberdade e melhores condições de vida. A temática da cidadania vincula-se, assim, à dos movimentos sociais, que será abordada no Capítulo 9.
FONTE: Filipe Rocha/Arquivo da editora
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O reconhecimento dos direitos humanos, atribuídos aos indivíduos independentemente de sua etnia, gênero, cor, idade e religião, está previsto e garantido, em tese, nas atuais democracias. As reivindicações por liberdade e igualdade para todos apareceram pela primeira vez na Declaração de Independência dos Estados Unidos da América, de 1776, que inspirou a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, votada em pleno processo da Revolução Francesa, em 1789. Entre os direitos previstos nesse documento, consta o seguinte: "Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade".
Outro documento histórico que busca garantir a existência dos direitos humanos é a Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada em 1948 pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU). Esse documento atualizou o conteúdo das declarações anteriores, dando ênfase aos direitos individuais, dentre os quais a abolição da escravidão, a condenação da tortura, o direito à liberdade de expressão e de consciência, o direito de ir e vir e o direito à educação e à cidadania.
É importante ressaltar que, em todos esses casos, a reivindicação dos direitos humanos como princípios não tornou sua implementação e prática automaticamente perfeitas. Um exemplo disso é o fato de o sufrágio universal só ter se consolidado em muitos países mais de um século depois das primeiras declarações citadas, o que significa que nem todos os seres humanos eram de fato tratados como iguais. O mesmo acontece com os países signatários da declaração da ONU, que muitas vezes apoiam medidas e políticas internas e externas que violam esses direitos. Nesse sentido, a chamada Guerra do Golfo (1990-1991) é um exemplo de como a força militar e diplomática pode se sobrepor a essas garantias. Ao combater o Iraque por ter invadido o Kuwait, os Estados Unidos e o Reino Unido descumpriram diversas recomendações da ONU, inclusive quanto ao prazo das negociações. Outro exemplo de violação ocorrido na mesma região - rica em petróleo e, por isso, objeto de disputas econômicas - foi a invasão que os Estados Unidos e uma coalizão de países fizeram ao Iraque, em 2003, sem a autorização da ONU. São exemplos de ações que compõem um cenário de insegurança internacional.
LEGENDA: Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789.
FONTE: Gianni Dagli Orti/The Art Archive/The Picture Desk/AFP/Museu Carnavalet, Paris, França
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