Desde o início da invasão russa na Ucrânia, no dia 24 de fevereiro, mais de 3,6 milhões de refugiados já deixaram o país na tentativa de fugir da guerra. De acordo com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os
Refugiados (Acnur), essa já é a crise de refugiados que mais cresce na Europa desde a Segunda Guerra Mundial. A grande maioria desses refugiados estão alocados em países europeus, principalmente aqueles que fazem fronteira com a Ucrânia. A recepção acolhedora dessa população contrasta com a forma como os países europeus lidaram com a última grande crise de refugiados, entre 2015 e 2016. Migrantes vindos, principalmente, da Síria e de outros países do Oriente Médio tentavam escapar da
guerra em seus territórios. No início de março, a União Europeia concedeu, por unanimidade, proteção temporária aos ucranianos. A decisão determina que refugiados da guerra na Ucrânia tenham direito a residência, acesso ao mercado de trabalho, assistência médica e educação infantil por pelo menos um ano. Os países também tomaram iniciativas
próprias para receber os migrantes ucranianos. O Reino Unido, que não faz mais parte da União Europeia, chegou a oferecer uma mesada para que sua população abrigasse refugiados. Entre 2015 e 2016, cerca de 1 milhão de refugiados do Oriente Médio se deslocaram para a Europa e foram recebidos de maneira muito menos acolhedora. A maior parte foi
para a Turquia, país que não faz parte da União Europeia, de lá, alguns tentavam entrar na Grécia para que pudessem ter acesso ao livre deslocamento entre os países do bloco. A situação na década passada levou a uma escalada de políticas anti-imigração no continente. Um acordo foi feito entre a Turquia e o bloco europeu em 2016, fazendo com que todos os imigrantes irregulares que tentassem entrar na Grécia pela fronteira fossem mandados de volta ao país. Na avaliação de Jeff Crisp,
ex-diretor no Acnur e na Organização Internacional para as Migrações, a diferença na resposta dos países europeus entre as duas crises migratórias é nítida. “Os ucranianos se deslocaram de forma mais rápida e em maior número, mas não há o mesmo senso de alarme e medo na Europa.” 1
de 10 Após o presidente Vladimir Putin fazer um pronunciamento autorizando uma "operação militar especial" na Ucrânia, primeiras explosões foram registradas na capital Kiev na quinta-feira, 24 de fevereiro 2 de 10 Um comboio de tropas russas com quilômetros de extensão se desloca na Ucrânia, em direção à Kiev. Na última semana, autoridades britânicas afirmaram que a longa fila de veículos militares estaria parada
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Desde o início da guerra, pelo menos 3,3 milhões de pessoas fugiram da Ucrânia, segundo dados da ONU. Cerca de 6,5 milhões se deslocaram dentro do território ucraniano
Crédito: Wolfgang Schwan/Anadolu Agency via Getty Images4 de 10
Milhares de pessoas foram presas em protestos antiguerra na Rússia ao longo dos dias de guerra na Ucrânia
Crédito: Anadolu Agency via Getty Images (27.fev.2022)5 de 10
Um fluxo de pessoas que passava por um posto de controle tentando deixar a cidade de Irpin, no dia 6 de março, foi atingido por um ataque de projéteis. Três pessoas foram mortas, disseram autoridades ucranianas, incluindo duas crianças.
Crédito: Carlo Allegri/Reuters (07.mar.2022)6 de 10
Em 4 de março, um tiroteio entre forças russas e ucranianas causaram um incêndio no complexo onde fica localizada a usina nuclear de Zaporizhzhia, a maior desse tipo em toda a Europa. Os confrontos não chegaram a atingir os prédios de atividade nuclear
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No dia 9 de março, a Ucrânia acusou a Rússia de bombardear um hospital infantil e maternidade na cidade de Mariupol. Pelo menos uma gestante e seu bebê não resistiram aos ferimentos causados pelo ataque
Crédito: Reuters8 de 10
Marina Ovsyannikova, editora de TV russa, chamou a atenção de todo o mundo após um protesto antiguerra ao vivo em um canal estatal. Depois da manifestação, Marina foi levada pela polícia e teria sido submetida à 14 horas de interrogatório
Crédito: Russia Channel 1/Reprodução (14.mar.2022)9 de 10
Na quarta-feira, 16 de março, um teatro usado como abrigo em Mariupol foi atingido por um suposto ataque aéreo russo, segundo a Ucrânia. Imagens de satélite mostraram a palavra "crianças" escrita nos dois lados de edifício
Crédito: Maxar Technologies10 de 10
Ataque a shopping center no distrito de Podilsky, em Kiev, deixou ao menos oito mortos. Destroços e escombros foram capturados do lado de fora
Crédito: Ceng Shou Yi/NurPhoto via Getty Images (20.mar.2022)Crisp aponta alguns fatores que explicam a diferença, o primeiro deles é a discriminação de raça e etnia. “Os ucranianos são vistos como europeus brancos e cristãos”, ele explica. Os refugiados que vinham do Oriente Médio não eram percebidos como brancos, além de alguns serem muçulmanos. Para Crisp, essas características levaram os europeus a temerem possíveis ameaças terroristas.
A proximidade da Ucrânia e o fato da guerra no país estar sendo constantemente veiculada pela mídia do mundo todo também influenciam na resposta europeia. Crisp explica: “Há pouca dúvida se essas pessoas são refugiadas ou não. Em 2015 e 2016, havia a sensação de que talvez algumas pessoas fossem refugiados, mas outras poderiam ser apenas migrantes econômicos, buscando melhores oportunidades de vida.”
Além disso, a Rússia representa uma ameaça não só para a Ucrânia, mas para toda a Europa. Na década passada, muitas pessoas não sabiam direito o que estava acontecendo na Síria e, mesmo se soubessem, se sentiam pouco afetadas pelo conflito em si.
Entretanto, o porta-voz do Acnur no Brasil, Luiz Fernando Godinho, explica que, do ponto de vista global, é mais comum que países vizinhos acolham aos refugiados de uma determinada região. “Os países vizinhos da Síria, como Turquia, Líbano, Jordânia e Iraque, têm acolhido milhões de refugiados sírios na última década.”
Refugiados na Polônia
A Polônia, que faz fronteira com a Ucrânia e é membro da União Europeia, talvez seja o caso mais claro da diferença no tratamento com os refugiados. Mais de 2,1 milhões de ucranianos estão no país, de acordo com dados do Acnur. O presidente do país, Andrzej Duda, falou em declaração que muitos estavam sendo acolhidos pelas famílias polonesas, “porque as pessoas sabem que devem abrir seus corações e receber os refugiados”.
No entanto, Duda age para endurecer as leis contra refugiados no país. No início de 2021, quando cerca de 4 mil pessoas vindas do Iraque e de outros países do Oriente Médio tentavam entrar na Polônia através da fronteira com Belarus, que não faz parte da União Europeia, o governo polonês fechou a fronteira e as pessoas foram mandadas de volta ao Iraque.
O futuro dos refugiados na Europa
Jeff Crisp aponta dois cenários possíveis após a Europa ter acolhido os refugiados ucranianos. No cenário positivo, o acolhimento dos ucranianos faria com que os europeus criassem mais empatia com a condição de todos os refugiados, independente de seu país de origem.
Outra possibilidade, que Crisp acredita ser a mais provável, infelizmente, é que os países europeus limitem ainda mais a entrada de refugiados, com a justificativa de que já estariam sobrecarregados com as pessoas vindas da Ucrânia.
O governo da Dinamarca parece confirmar este palpite. Enquanto o país está acolhendo refugiados ucranianos de braços abertos, as autoridades dinamarquesas seguem tentando mandar refugiados sírios de volta ao seu país – que continua em guerra – desde 2019.
Godinho se mostra mais otimista e ressalta que o acolhimento e recepção das pessoas refugiadas da Ucrânia deve ser elogiado. “Esperamos que este exemplo seja inspirador para reverter uma série de narrativas e políticas tóxicas verificadas em outras crises de refugiados”, ele diz, “é crucial que a União Europeia e outros países continuem a admitir pessoas vindas de outros países em seus territórios”.