O que e memória coletiva brainly

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conviver." Fonte: //unesdoc.unesco.org/images/0012/001271/127160por.pdf. Acesso em 21/08/2018. Diante do exposto, ao entrarmos em contato com povos diferentes e observarmos suas culturas, podemos dizer que: I. Os intercâmcios culturais podem agir favoravelmente no desenvolvimento de populações consideradas incultas, pois um povo incluto é aquele que não partilha dos valores culturais que caracterizam as civilizações em estágio superior de desenvolvimento; II. A diversidade das culturas existentes acompanha a pluralidade da existência humana. Assim, é importante termos em mente que existem diferenças culturais, mas essas não devem ser encaradas segundo a lógica da superioridade e inferioridade; III. A diversidade cultural pode ser vista como fonte de desenvolvimento, que proporciona intercâmbios que agem no sentido de diversificar as identidades, tornando-as plurais, variadas e dinâmicas. IV. Todas as sociedades humanas possuem cultura, sejam simples ou complexas. Essa premissa compõe a base da diversidade, considerada pela UNESCO como um patrimônio comum da humanidade. Assinale a alternativa correta: a.  Apenas a alternativa IV é verdadeira. b.  Apenas a alternativa II é verdadeira. c.  Apenas as alternativas I, III e IV são verdadeiras. d.  Apenas as alternativas I e IV são verdadeiras. e.  Apenas as alternativas II, III e IV são verdadeiras. Resposta: I é falsa, pois o preceito da diversidade afirma que todas as culturas são equivalentes, de modo que não devem ser hierarquizadas entre cultas e incultas, mas respeitadas em suas diferenças. II é verdadeira, pois as culturas são adaptações ao meio, de modo que com muitos meios diferentes há muitas culturas diferentes, que não devem ser consideradas melhores ou piores que as outras. III é verdadeira, pois a troca entre culturas pode ajudar na criatividade, de modo que soluções antes impensadas possam surgir. IV é verdadeira, pois a cultura é aquilo que o homem produz, e em todas as sociedades o homem produz coisas, valores, que são a sua cultura. É correta a alternativa E. Leia mais em Brainly.com.br - //brainly.com.br/tarefa/18021221#readmore Patrimônio cultural é um conjunto de manifestações de cultura material e imaterial de um povo. No Brasil, nós temos o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), órgão federal responsável por preservar, divulgar e fiscalizar os bens culturais brasileiros. Esse reconhecimento e atribuição de valor são feitos por meio do tombamento, instrumento que atribui valor cultural a um bem material e determina sua proteção e preservação. Isso é importante porque o patrimônio cultural não é apenas nossa herança, mas sua preservação também garante a permanência e a identidade cultural de um povo. Com base no que aprendemos ao longo do capítulo e a partir do trabalho realizado no IPHAN, analise as afirmativas a seguir e marque V para as verdadeiras e F para as falsas.  I. ( ) No acervo de mapas do Museu Imperial de Petrópolis está a carta corográfica do Império do Brasil do ano de 1857, com a planta da cidade do Rio de Janeiro e o quadro estatístico do Império do Brasil, conforme os relatórios oficiais. A descrição corográfica era a descrição geográfica de uma região ou país e incluía um estudo demográfico e antropológico das povoações descritas. Portanto, trata-se de uma peça de cultura imaterial. II. ( ) A festa do Círio de Nossa Senhora de Nazaré é uma das mais famosas de nossa cultura imaterial do Brasil. Trata-se de uma grande procissão em devoção a Nossa Senhora de Nazaré, que existe desde 1793, e reúne milhares de pessoas no Belém do Pará. A festa ocorre sempre no segundo domingo de outubro e é uma das maiores festas católicas do mundo.  III. ( ) O frevo é uma das principais danças tradicionais brasileiras e uma das manifestações culturais mais características do Recife. Tem origem no carnaval do século XIX, a partir da rivalidade entre as bandas militares e dos escravos que tinham se tornado livres. O frevo é uma marchinha acelerada que incorpora elementos de outras danças, como maxixe e polca. Essa dança popular é um grande exemplo de cultura material. IV. ( ) A partir de influências do jongo, do samba de roda baiano, do maxixe e da marcha carnavalesca, surgiram três novas formas de se fazer samba no Rio de Janeiro: o partido alto. Ele é feito no improviso de forma coletiva e cantando sobre o cotidiano. As matrizes do samba no Rio de Janeiro são cultura imaterial. V. ( ) Os adereços que o índios Cinta Larga usam na guerra são considerados cultura material. Eles se pintam de jenipapo, com motivos animais ou vegetais; usam seus cocares de penas de gavião; grossos colares de contas (bak´rĩ) no pescoço e cruzados no peito; e as cintas típicas (zalâpíáp), confeccionadas de entrecasca da árvore tauari. Agora, assinale a sequência correta de classificação. a. V, V, V, F, F.  b. F, F, V, V, F. c. V, V, F, F, F. d. F, V, F, V, V. e. F, F, F, V, V.  Resposta: A primeira afirmativa é falsa pois a carta corográfica faz parte do patrimônio material do acervo; A segunda alternativa está correta, verdadeira, portanto. Trata-se de um bem imaterial, pois faz parte da cultura do povo brasileiro; O frevo também faz parte de nossa cultura e, portanto, trata-se de patrimônio imaterial. A terceira alternativa é falsa; Correta a quarta, pois a matriz do samba se classifica como imaterial; Os adereços, citados na afirmativa V, fazem parte do acervo do Museu da Cultura de São Paulo. Correta, portanto. Temos portanto a sequência: F,V,F,V,V. Alternativa d. Leia mais em Brainly.com.br - //brainly.com.br/tarefa/18050467#readmore Leia as assertivas abaixo sobre Patrimônio Cultural: I. Agregar valores para a união da comunidade configura um exemplo de manifestação do Patrimônio Imaterial, representado por celebrações, festas, lugares, músicas, rezas e superstições, entre outros elementos. II. Monumentos, edifícios, trechos urbanos e até ambientes naturais de importância paisagística que tenham valor histórico, estético, arqueológico, científico, etnológico ou antropológico podem vir a constituir-se em patrimônios culturais da humanidade. III. Os Patrimônios Culturais materiais e imateriais refletem a memória coletiva dos povos envolvidos em sua criação.  IV. Entende-se por Patrimônio Material as práticas, os rituais e os saberes de uma comunidade. Estes dividem-se em celebrações culturais e formas de expressão.  V. O Patrimônio Cultural Imaterial (Intangível) é toda a herança cultural de uma coletividade que faz parte dos saberes intrínsecos do dia a dia de um povo. Resposta: Correta I, II, III, e V. Compreende se por patrimônio material tudo que é tangível, como os monumentos, as casas e edifícios que remetem a outros séculos e que compõem um estilo e forma de vivências de outros povos. Também são os lugares, que fazem parte da memoria de uma comunidade, como os templos religiosos, por exemplo. Já o patrimônio imaterial é o que se preserva na memoria e nos costumes de um povo e que não é tangível. Por exemplo, as festas do divino que foi reconhecida como patrimônio imaterial brasileiro. Leia mais em Brainly.com.br - //brainly.com.br/tarefa/18053443#readmore Podemos considerar o Centro Histórico de Olinda, em Pernambuco, um monumento da memória social brasileira. Isso porque é um conjunto arquitetônico, urbanístico e paisagístico tombado pelo IPHAN e reconhecido como Patrimônio Mundial Cultural pela UNESCO.Aliás, Olinda foi uma das cidades mais ricas do Brasil entre os séculos XVI e XVII. Seus prédios testemunharam histórias e registram as mudanças nos estilos arquitetônicos: edifícios coloniais, fachadas de azulejos e obras neoclássicas e ecléticas do início do século XX. Com isso, Olinda nos remete à história, ao carnaval e à brasilidade.Em relação à memória social, analise as afirmativas a seguir.I. A memória possui duas perspectivas: uma individual e

ARTIGOS ORIGINAIS

Halbwachs: memória coletiva e experiência

Halbwachs: colective memory and experience

Maria Luisa Sandoval Schmidt; Miguel Mahfoud

Instituto de Psicologia - USP

RESUMO

Este artigo tem como objetivo apresentar algumas das idéias fundamentais de Maurice Halbwachs sobre o trabalho da memória. Entre as concepções relevantes para a Psicologia Social destacamos a distinção e as relações entre imagem, lembrança e memória, e entre memória individual e memória coletiva; o conceito de confronto de testemunhos; as tensões e a complementaridade entre a história e a memória coletiva. A título de ilustração de ressonâncias destes conceitos no campo da pesquisa em Psicologia Social, comentamos alguns aspectos de pesquisa realizada junto a comunidades tradicionais da Estação Ecológica Juréia-Itatins no Litoral Sul de São Paulo.

Descritores: Memória. Halbwachs. Experiências de vida. Psicologia Social. Relatos verbais.

ABSTRACT

The parpose of the paper is to present some of the fundamental ideas of Maurice Halbwachs on the working of memory. Among the relevant conceptions for Social Psychology we stress: the distirection and the relations between individual memory and collective memory; the concept of the confrontation of witnesses; the tensious and complementariedade between history and collective memory. As an example of the ressonância of these concepts in the field of research in Social Psychology we comment ou some aspect of research carried out in tradutional communities of the Juréia-Itatins Echological Station on the southen coast of São Paulo.

Index Terms: Memory. Halbwachs Life experiences. Social psychology. Verbal reports.

Observamos, nos últimos anos, um crescente interesse pela obra de Maurice Halbwachs. Sociólogo francês, discípulo de Durkheim, escreveu seus principais trabalhos entre as décadas de 20 e 40.

Em seus textos, fulgura a originalidade de um pensamento construído na contracorrente de idéias hegemônicas no universo intelectual de sua época.

Insistindo na efervescência dos meios sociais, os estudos de Halbwachs se caracterizam pelo apego aos aspectos dinâmicos dos fenômenos sobre os quais se debruçam.

Valorizando a concepção durkheimiana sobre a existência de relações dinâmicas entre as classificações sociais e as mentais, Halbwachs faz o caminho inverso ao de muitos discípulos de Durkheim que interpretaram essas relações de maneira mecânica.

A contrapelo, recupera a visão durkheimiana de um social móvel, inventivo e enfatiza a complementaridade, a tensão, a correlação dialética entre classificações sociais e classificações mentais. Esta concepção e esta ênfase são uma espécie de viga mestra da arquitetura teórica halbwachiana. Esta arquitetura, por sua vez, é marcada por uma desconfiança com relação às idéias que leva o autor a posicionar-se de modo crítico frente ao idealismo filosófico fortemente dominante então. Embora não tivesse contato com a corrente fenomenológica emergente no campo da filosofia, é possível notar uma inspiração fenomenológica na sua atenção pelas situações concretas e no seu interesse em descrevê-las, bem como, no lugar privilegiado que o caso singular ocupa em sua construção teórica.

Como sociólogo, Halbwachs traduziu o trabalho de Durkheim em termos propriamente históricos, tomando a direção de uma historização da sociologia, num mundo onde as ciências humanas e a história eram campos separados e quase incomunicáveis.

Se, por um lado, o pensamento de Halbwachs se apresenta em contraposição a tendências filosóficas e sociológicas de cunho idealista e mecanicista que dominam a cena intelectual do início do século, por outro, sua originalidade floresce no contato com a Escola de Strasbourg.

A Escola de Strasbourg reuniu, entre as décadas de 20 e 30, um grupo de estudiosos de diferentes origens, posturas intelectuais e idades, com o objetivo de estudarem, pesquisarem e trabalharem juntos, visando uma aproximação entre franceses e alemães.

Neste grupo destaca-se a presença de estudiosos de origem judaico — alemã, entre eles Halbwachs, que portam a experiência de serem vistos sempre como "os outros": para os alemães, são franceses; para os franceses, são alemães; para os judeus, não são judeus; para os cristãos, são judeus. Esta experiência coloca-os na condição de desenvolverem uma postura ideal para um certo tipo de trabalho sociológico, histórico e psicológico: sabem o que significa ser "o outro".

Do ponto de vista intelectual e metodológico, esta postura contribui para a compreensão da especificidade e singularidade dos grupos sociais em diferentes épocas e, ao mesmo tempo, facilita trocas interdisciplinares, na medida em que cada especialista está aberto para apreender a contribuição da disciplina-outra para o seu próprio campo de estudo. E, de fato, da Escola de Strasbourg emergem tanto a sociologia historicizada de Halbwachs, quanto a história sociologizada de Lucien Febvre, Marc Bloch e da Nova História.

A perspectiva psicológica não ficou fora deste contexto de trocas interdisciplinares. A revolução psicológica e psicanalítica que aponta para o estudo dos processos psíquicos tal como são encarnados e vividos pelos indivíduos, e não como entidades abstratas ou mecanismos puramente fisiológicos, teve sua quota de influência no pensamento desse grupo. Não é por acaso, portanto, que o movimento da Nova História desemboca no estudo das mentalidades ou que Halbwachs leciona a disciplina de psicologia social no Collège de France.

Halbwachs dedicou-se a temas diversos como o suicídio ou a vida de trabalhadores numa vila operária alemã, buscando entender a formação da consciência social. Fiel a esta temática, aprofundou o estudo da memória, principalmente em três grandes obras: Os quadros sociais da memória de 1925, Topografia legendária dos Evangelhos na Terra Santa de 1941 e A memória coletiva (publicação póstuma) de 1950 que, são, sem dúvida, referências fundamentais para quem se interessa pelo assunto.

Sociólogos, psicólogos, historiadores, antropólogos, arquitetos, entre outros, têm, mais e mais, recorrido a estas obras que permanecem ricas e fecundas para as diferentes áreas das ciências humanas.

Na perspectiva da psicologia social, um exemplo próximo desta riqueza e fecundidade é a contribuição das idéias de Halbwachs para o importante trabalho de Ecléa Bosi (1979) sobre lembranças de velhos.

O livro A memória coletiva, onde a intersecção entre psicologia social e sociologia se configura de forma mais explícita, será tomado como principal referência.

Buscando indicar possíveis ressonâncias destes conceitos na esfera da pesquisa em psicologia social, traremos, após a apresentação teórica, alguns exemplos referentes a pesquisa de campo realizada junto a comunidades tradicionais do litoral sul de São Paulo1.

Imagem, lembrança, memória

Para Halbwachs o indivíduo que lembra é sempre um indivíduo inserido e habitado por grupos de referência; a memória é sempre construída em grupo, mas é também, sempre, um trabalho do sujeito.

Procuraremos explicitar o sentido desta afirmação na composição dos conceitos halbwachianos.

Inicialmente, é preciso explorar o significado dos grupos como condição para a construção da memória.

Segundo Halbwachs, uma semente de rememoração pode permanecer um dado abstrato, pode, ainda, formar-se em imagem e como tal permanecer ou, finalmente, pode tornar-se lembrança viva. Estes destinos dependem da ausência ou presença de outros que se constituem como grupos de referência.

O grupo de referência é um grupo do qual o indivíduo já fez parte e com o qual estabeleceu uma comunidade de pensamentos, identificou-se e confundiu seu passado. O grupo está presente para o indivíduo não necessariamente, ou mesmo fundamentalmente, pela sua presença física, mas pela possibilidade que o indivíduo tem de retomar os modos de pensamento e a experiência comum próprios do grupo. A vitalidade das relações sociais do grupo dá vitalidade às imagens, que constituem a lembrança. Portanto, a lembrança é sempre fruto de um processo coletivo e está sempre inserida num contexto social preciso.

Em termos dinâmicos, a lembrança é sempre fruto de um processo coletivo, na medida em que necessita de uma comunidade afetiva, forjada no "entreter-se internamente com pessoas" característico das relações nos grupos de referência. Esta comunidade afetiva é o que permite atualizar uma identificação com a mentalidade do grupo no passado e retomar o hábito e o poder de pensar e lembrar como membro do grupo.

A permanência do apego afetivo a uma comunidade dá consistência às lembranças. Em contrapartida, o desapego está ligado ao esquecimento. "Esquecer um período de sua vida" - diz Halbwachs (1990) - "é perder contato com aqueles que então nos rodearam" (p.32). Esta perda de contato não pode ser restituída pela descrição, mesmo que exata, dos acontecimentos deste período, pois, na descrição, as imagens se apresentam como dados abstratos. No desapego não há reconhecimento, não há lembrança.

A lembrança, para Halbwachs, é reconhecimento e reconstrução. É reconhecimento, na medida em que porta o "sentimento do já visto". É reconstrução, principalmente em dois sentidos: por um lado, porque não é uma repetição linear de acontecimentos e vivências do passado, mas sim um resgate destes acontecimentos e vivências no contexto de um quadro de preocupações e interesses atuais; por outro, porque é diferenciada, destacada da massa de acontecimentos e vivências evocáveis e localizada num tempo, num espaço e num conjunto de relações sociais.

Tanto o reconhecimento quanto a reconstrução dependem da existência de um grupo de referência, tendo em vista que as lembranças retomam relações sociais, e não simplesmente idéias ou sentimentos isolados, e que são construídas a partir de um fundamento comum de dados e noções compartilhadas.

Os grupos, no presente e no passado, permitem a localização da lembrança num quadro de referência espaço-temporal que, justamente, possibilita sua constituição como algo distinto do fluxo contínuo e evanescente das vivências.

A memória é este trabalho de reconhecimento e reconstrução que atualiza os "quadros sociais" nos quais as lembranças podem permanecer e, então, articular-se entre si.

Assim, compreende-se, em parte, a concepção halbwachiana sobre a natureza coletiva da memória.

Confronto de testemunhos

O outro, através de seu depoimento, apóia, complementa, torna mais exato o trabalho da memória.

Nas palavras de Halbwachs (1990):

se nossa impressão pode apoiar-se não somente sobre nossa lembrança, mas também sobre a de outros, nossa confiança na exatidão de nossa evocação será maior, como se uma mesma experiência fosse começada, não somente pela mesma pessoa, mas por várias (p.25).

O primeiro nível de testemunho ao qual o indivíduo tem acesso se dá na relação consigo mesmo, confrontando uma visão atual com as experiências vividas no passado ou com opiniões formadas anteriormente, com o apoio de depoimentos de outros.

Um segundo nível, abrange a esfera do diálogo entre o indivíduo e um outro presente fisicamente ou internalizado. Neste sentido, o trabalho da memória pode ser compreendido como confronto dos diferentes pontos de vista que cohabitam no indivíduo.

Estes pontos de vista ajudam a ver, observar e lembrar. Para ver e observar uma realidade presente, o indivíduo recorre ao testemunho de sua experiência anterior e ao testemunho de outros que indicam ou destacam aspectos a serem observados, bem como, universos onde localizar o observado.

Na medida em que o presente é vivido nesta interlocução de testemunhos, a sua evocação, no futuro, tenderá a retomar estes diálogos. O trabalho da memória é, portanto, também, a presentificação daquele conjunto de testemunhos no contexto de um diálogo mais amplo e atual.

O confronto de testemunhos tem por fundamento as dimensões do tempo e do espaço.

De acordo com Halbwachs (1990),

a memória não tem alcance sobre os estados passados e não no-los restitui em sua realidade de outrora, senão em razão de que ela não os confunde entre si, nem com outros mais antigos ou mais recentes, isto é, ela toma seu ponto de apoio nas diferenças (p.96).

A diferenciação das lembranças deriva, também, das divisões do tempo - que são singulares para cada grupo e para cada homem. A divisão do tempo permite a constituição de uma lembrança enquanto tal, e sua distinção dentre outras lembranças numa cadeia de recordações. E porque as lembranças não se confundem entre si que podem ser confrontadas, dando corpo ao trabalho da memória.

Em contraposição ao tempo que oferece continuamente a imagem da mudança, o espaço oferece a imagem da permanência e da estabilidade. Os lugares recebem a marca de um grupo e a presença de um grupo deixa marcas num lugar. Todas as ações do grupo podem ser traduzidas em termos espaciais e o lugar ocupado pelo grupo é uma reunião de todos os elementos da vida social. Cada detalhe tem um sentido inteligível aos membros do grupo. Ao mesmo tempo que o espaço faz lembrar uma maneira de ser comum a muitos homens, faz lembrar, também, costumes distintos, de outros tempos. Sobretudo, faz lembrar de pessoas e relações sociais ligadas a ele. Neste sentido é, sempre, fonte de testemunhos.

Memória individual e memória coletiva

Depreende-se do que foi exposto até aqui a impossibilidade de uma memória exclusivamente ou estritamente individual, uma vez que as lembranças dos indivíduos são, sempre, construídas a partir de sua relação de pertença a um grupo. A memória individual pode ser entendida, então, como um ponto de convergência de diferentes influências sociais e como uma forma particular de articulação das mesmas.

Analogamente, a memória coletiva, propriamente dita, é o trabalho que um determinado grupo social realiza, articulando e localizando as lembranças em quadros sociais comuns. O resultado deste trabalho é uma espécie de acervo de lembranças compartilhadas que são o conteúdo da memória coletiva.

Halbwachs ao distinguir e relacionar memória individual e memória coletiva põe ênfase num dinamismo que Duvignaud (1990) traduz nos seguintes termos:

é impossível conceber o problema da evocação e da localização das lembranças se não tomamos para ponto de aplicação os quadros sociais reais que servem de pontos de referência nesta reconstrução que chamamos memória (p.9-10).

Um aspecto a acrescentar neste dinamismo da memória é a importância da lembrança pessoal como testemunho frente e contra as interferências coletivas. Na feliz expressão de Franco Cardini (1993),

a lembrança não se constrói sem a memória coletiva, mas, ao mesmo tempo, a recordação pessoal é uma forma de testemunho que impõe limites à tirania ou à ditadura das imagens coletivas.

Este limite deve ser entendido no interior mesmo do trabalho da memória, significando que a experiência dos indivíduos é a ancoragem para a construção contínua e comum que chamamos memória coletiva, cujos conteúdos, por esta razão, não são arbitrários.

Por outro lado, a recordação pessoal enfrenta a ditadura das imagens coletivas enquanto torna possível que um elemento de caráter pessoal possa ser ouvido por cima da memória coletiva.

Para Halbwachs a consciência individual é um registrador de influências sociais, mas, ao mesmo tempo, a consciência individual é um limite, algo que pode nos salvar da ditadura (Cardini, 1993).

Tradição e história

A memória coletiva adapta as imagens de fatos antigos a crenças e a necessidades espirituais do presente. Indicando esta característica, Halbwachs supera a concepção do passado como um modelo imutável ao qual conformar-se (Dumond,1988).

Na memória coletiva o passado é permanentemente reconstruído e vivificado enquanto é resignificado. Neste sentido, a memória coletiva pode ser entendida como uma forma de história vivente. A memória coletiva vive, sobretudo, na tradição, que é o quadro mais amplo onde seus conteúdos se atualizam e se articulam entre si.

A memória coletiva encontra seu lugar na tradição e, ao mesmo tempo, dinamiza as tradições, num processo semelhante ao que foi descrito com relação às lembranças no contexto dos quadros sociais.

A memória coletiva tem uma forte tendência a transformar os fatos do passado em imagens e idéias sem rupturas. Ou seja, tende a estabelecer uma continuidade entre o que é passado e o que é presente, restabelecendo, portanto, a unidade primitiva de tudo aquilo que, no processo histórico do grupo, representou quebra ou ruptura. Desta forma, a memória coletiva apresenta-se como a solução do passado, no atual; apresenta-se como recomposição quase mágica ou terapêutica, como algo que cura as feridas do passado.

Também a memória histórica busca solucionar rupturas, busca produzir imagens unitárias do percurso da humanidade. Porém, seu processo possui uma direção diferente: soluciona a atual no passado. Isto quer dizer que a memória histórica oferece uma construção lógica e inventada do passado. Esta construção lógica e inventada pode ser entendida como o trabalho, que cada época realiza, de encontrar o que já existia anteriormente, mas que não se podia incluir num sistema de imagens.

Vê-se, portanto, que a memória coletiva e a memória histórica, apoiando-se em regras de reconstrução distintas, chegam, inevitavelmente, a conhecimentos distintos do passado.

A memória coletiva pode, por vezes, se enfrentar de modo contundente com a racionalidade da história feita pelos historiadores. Em outros momentos, pode ser complementar à memória histórica. E, em outros, ainda, servir como limite ao caráter lógico e ideológico da história. Nem a memória coletiva nem a memória histórica podem, contudo, legitimamente, reivindicar para si, a verdade sobre o passado.

A memória coletiva, para Halbwachs, desempenha um papel fundamental nos processos históricos. Por um lado, dando vitalidade aos objetos culturais, sublinhando momentos históricos significativos e, portanto, preservando o valor do passado para os grupos sociais. Por outro, sendo a guardiã dos objetos culturais que atravessam os tempos e que, então, podem vir a se constituir em fontes para a pesquisa histórica.

A concepção de Halbwachs sobre o lugar da memória coletiva nos processos históricos foi assim sintetizada por Cardini (1988):

(...) a grande protagonista da história é a memória coletiva, que tece e retece, continuamente, aquilo que o tempo cancela e que, com a sua incansável obra de mistificação, redefinição e reinvenção, refunda e requalifica continuamente um passado que, de outra forma, correria o risco de morrer definitivamente ou de permanecer irremediavelmente desconhecido (p.xii).

Halbwachs e a psicologia social

A psicologia social, entre outros objetivos, busca compreender os fenômenos sociais desde o ponto de vista da experiência do indivíduo em seu contexto sócio-cultural. Uma via de acesso, privilegiada, à experiência do indivíduo é o relato oral. Isto porque no relato oral os elementos diversos e heterogêneos que dão corpo à experiência encontram uma forma única, singular e integrada de expressão e comunicação.

Halbwachs delimita um campo metodológico e conceituai de extrema pertinência para a pesquisa que se baseia na coleta e análise de relatos orais.

A seguir, passamos ao comentário de algumas dimensões metodológicas da pesquisa com relatos orais que se destacaram no trabalho de campo com comunidades tradicionais da Estação Ecológica Juréia-Itatins, claramente em conseqüência de nosso diálogo com a obra de Halbwachs.

Confronto e relato oral

O trabalho de campo referido acima tem como objetivo principal o estudo dos fenômenos propícios à transmissão e à elaboração da experiência pessoal e coletiva em comunidades tradicionais. Naquele trabalho partimos de uma conceituação de experiência onde o conceito de memória ocupa um lugar central. De fato, experiência é memória, enquanto capacidade de recordar e de evocar, que constitui um enriquecimento de saberes; é ainda, presença ativa do passado em nós, como dinamismo e princípio de ação. A elaboração e a transmissão da experiência, então, remetem ao trabalho da memória (Ries, 1988).

Na coleta de histórias de vida de moradores das comunidades que estamos interessados em conhecer, observamos a presença da confrontação como característica intrínseca da narrativa. Freqüentemente, entramos em contato com o fato de que um indivíduo, ao testemunhar oralmente o seu passado, formula a própria narrativa como um processo de confrontação, adaptação e acomodação de vários elementos, tais como: " casos" pessoais ou antigos, opiniões próprias e alheias, distinções entre pontos de vista, descrições dos diferentes modos de vida em diferentes épocas, histórias tradicionais, referências a diferentes grupos; ou seja, elementos que se movem entre os eixos presente/passado e indivíduo/outros.

A observação do caráter plural da narrativa abre a possibilidade de escutar um depoimento pessoal como a orquestração de vozes coletivas, posta em cena pelo narrador. Isto é importante não tanto porque se apreendem as relações sociais através da fala do indivíduo, mas, principalmente, porque se apreende o modo como a experiência do indivíduo é modulada, matizada, dentro daquele quadro social.

Do ponto de vista do comentário e da análise do material colhido a partir desta apreensão, as contradições, as ambigüidades, as omissões não são tomadas, exclusivamente, como dissintonias do desejo do indivíduo, mas como expressões que atualizam os conflitos, as tensões, a pluralidade de perspectivas, do grupo social, dos quais o indivíduo se apropria para elaboração de sua experiência.

A elaboração da experiência pode ser entendida como um processo de diálogo entre diferentes pontos de vista atuais e passados que, de alguma forma, estão presentes para o indivíduo.

Neste campo de diálogo entre diferenças, inclui-se, também, a presença dos pesquisadores. Isto quer dizer que o narrador não é indiferente ao pesquisador como representante de um outro grupo e, portanto, sua narrativa é, inclusive, um diálogo com este grupo que o pesquisador representa2.

Ruptura e quotidiano

Halbwachs salienta que a percepção do tempo é uma percepção de diferenças.

Na vida das comunidades estudadas, uma dessas diferenças significativas é definida pela alternância dos tempos do quotidiano e da festa.

Como ruptura do fluxo do tempo quotidiano, a festa se constitui não só como momento de utopia social, mas como um momento privilegiado de percepção do quotidiano. É um momento de suspensão do quotidiano que coloca aquela diferenciação necessária para a delimitação da experiência no tempo. Portanto, é um momento em que o vivido quotidiano pode ser retomado como objeto de reflexão.

Analogamente, podemos entender a situação de entrevista como um outro momento de ruptura que propicia a percepção da realidade quotidiana e sua elaboração por parte do indivíduo.

Esta elaboração tem uma qualidade, uma especificidade e uma riqueza próprias da situação de entrevista. Isto permite rebater a crítica de que a entrevista é um instrumento limitado por promover uma situação artificial, uma vez que justamente a ruptura de uma situação corriqueira promove uma certa percepção e uma certa elaboração da experiência quotidiana, dificilmente captáveis apenas através de observações etnográficas.

Acresce-se a isso, o fato de que momentos de ruptura desta natureza não são alheios a experiência daquelas comunidades, como a existência de frequentes festas comprova.

Uma outra crítica à entrevista é a de que seria condicionada pelas necessidades e interesses do pesquisador e, portanto, poderia ser invasiva para o sujeito da pesquisa. A valorização da entrevista como momento de ruptura tem se demonstrado útil tanto para os objetivos de pesquisa em psicologia social, quanto para os sujeitos da pesquisa que têm acolhido a entrevista como uma oportunidade de refletir e de transmitir a sua experiência pessoal e comunitária.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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1 "Experiência, tradição oral e religiosidade em comunidades da Estação Ecológica Juréia-ltatins", projeto que vem sendo desenvolvido, desde 1993, pelos autores deste artigo, com apoio da FAPESP.
2 Vale como ilustração a seguinte passagem: o narrador estava falando sobre a diferença entre as coisas que Deus cria e aquelas que o homem faz, e traz como exemplo a possibilidade de se repor uma lâmpada que teria se queimado em contraposição à impossibilidade de reconstituição da natureza devastada. Ora, a lâmpada é um elemento que não faz parte do quotidiano das comunidades, como a do narrador, que não contam com energia elétrica, mas sim do mundo do pesquisador.

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